5 dicas para uma educação feminista e antirracista




Pequenas atitudes no dia a dia da educação podem ajudar a formar pessoas com muito mais respeito à diversidade


Luísa Toller

No início de janeiro, a campanha da revista AzMina para o dia das mães de 2020 virou base para uma questão da prova do vestibular da Unicamp. E inspirada pela menção, peço licença ao espaço artístico da coluna para trazer minha versão educadora. Afinal, começo de ano geralmente traz os ventos de planejamento e renovação. Venho, então, oferecer a professores e professoras algumas dicas que os ajudem a elaborar um conteúdo educativo feminista, antirracista e respeitoso à diversidade. E não estou falando sobre dar aulas sobre feminismo e racismo, não. Mas sim como isso pode estar presente no dia a dia da educação, trazendo para os alunos uma visão de mundo mais inclusiva.

1 – DIVERSIDADE EM TUDO

Certifique-se de que sua lista de fontes (sejam elas livros, filmes, músicas ou outros tipos de obras) contenha autores e autoras com o máximo de diversidade possível. Ainda executamos bastante os cânones do homem branco hétero como única via de consulta para o aprendizado. Para mudar isso é necessário que nós educadores saiamos de nossa zona de conforto e busquemos outros pontos de vista para o que já ensinamos há anos.

2 – REPRESENTATIVIDADE NAS IMAGENS

Como as aulas online são realidade de parcela expressiva da população, um dos recursos mais usados tem sido a apresentação de imagens. Caso for usar fotos ou ilustrações de pessoas, cuidado para não cair na armadilha do algoritmo racista e repetir padrões opressores que são considerados erroneamente como senso comum – padrões racistas, heteronormativos, gordofóbicos e capacitistas. Representatividade importa.

3 – NADA DE CANCELAMENTO

Estamos vivendo a era dos cancelamentos e julgamentos na internet, mas isso não deve chegar na sala de aula. Caso queira trazer alguma polêmica para as aulas, procure gerar questionamentos. Em vez de sairmos por aí definindo nossas opiniões, acredito que podemos aproveitar um momento em que as perguntas são mais potentes em desconstruir o sistema do que as respostas.

4 – CONEXÃO COM OS ALUNOS

E viva Paulo Freire! Quanto mais nos aproximarmos da realidade de nossos aprendizes maior a chance de conexão e transformação do conhecimento. Aparelhos eletrônicos, aplicativos e redes sociais nem sempre são adversários da capacidade de concentração. Às vezes podem ser instrumentos para pesquisa e observação.

5 – OLHAR MÚLTIPLO

Por último, justamente o ponto principal: elabore o conteúdo das aulas a partir dessas lentes de olhar múltiplo. A disciplina pode ser matemática, biologia, português, música, educação física, economia, línguas estrangeiras, ou qualquer outra não mencionada (me perdoem por isso), sempre há a possibilidade de criar situações ou escolher textos que retratem a sociedade de forma múltipla, inclusiva e respeitosa.


Natural do Rio de Janeiro, Luisa é musicista, professora e pesquisadora. Formada pela Unicamp, já participou de diversas bandas tocando em Festivais, Viradas Culturais, circuitos e prêmios como ProAC e BNDES. Foi curadora da Caixa Cultural e professora no Ensino à Distância da UFSCAR. Venceu três categorias no 8o Concurso de Marchinhas Nóis Trupica Mais Não Cai com a composição Marcha das Mulheres. Hoje cursa mestrado na USP, tendo participado do 13o. Encontro Mundos de Mulheres, e sua pesquisa (assim como tudo na vida) busca desconstruir padronizações e hierarquias de gênero. Além disso adora cozinhar e descobrir receitas e formas de vida mais orgânicas e menos industriais.




5 dicas para uma educação feminista e antirracista




Pequenas atitudes no dia a dia da educação podem ajudar a formar pessoas com muito mais respeito à diversidade


Luísa Toller

No início de janeiro, a campanha da revista AzMina para o dia das mães de 2020 virou base para uma questão da prova do vestibular da Unicamp. E inspirada pela menção, peço licença ao espaço artístico da coluna para trazer minha versão educadora. Afinal, começo de ano geralmente traz os ventos de planejamento e renovação. Venho, então, oferecer a professores e professoras algumas dicas que os ajudem a elaborar um conteúdo educativo feminista, antirracista e respeitoso à diversidade. E não estou falando sobre dar aulas sobre feminismo e racismo, não. Mas sim como isso pode estar presente no dia a dia da educação, trazendo para os alunos uma visão de mundo mais inclusiva.

1 – DIVERSIDADE EM TUDO

Certifique-se de que sua lista de fontes (sejam elas livros, filmes, músicas ou outros tipos de obras) contenha autores e autoras com o máximo de diversidade possível. Ainda executamos bastante os cânones do homem branco hétero como única via de consulta para o aprendizado. Para mudar isso é necessário que nós educadores saiamos de nossa zona de conforto e busquemos outros pontos de vista para o que já ensinamos há anos.

2 – REPRESENTATIVIDADE NAS IMAGENS

Como as aulas online são realidade de parcela expressiva da população, um dos recursos mais usados tem sido a apresentação de imagens. Caso for usar fotos ou ilustrações de pessoas, cuidado para não cair na armadilha do algoritmo racista e repetir padrões opressores que são considerados erroneamente como senso comum – padrões racistas, heteronormativos, gordofóbicos e capacitistas. Representatividade importa.

É possível ser feliz ?

 





É possível ser feliz ?

 





O Jair que há em nós




Ivann Lago

(Professor e Doutor em Sociologia Política)


O Brasil levará décadas para compreender o que aconteceu naquele nebuloso ano de 2018, quando seus eleitores escolheram, para presidir o país, Jair Bolsonaro.

Capitão do Exército expulso da corporação por organização de ato terrorista; deputado de sete mandatos conhecido não pelos dois projetos de lei que conseguiu aprovar em 28 anos, mas pelas maquinações do submundo que incluem denúncias de “rachadinha”, contratação de parentes e envolvimento com milícias; ganhador do troféu de campeão nacional da escatologia, da falta de educação e das ofensas de todos os matizes de preconceito que se pode listar.

Embora seu discurso seja de negação da “velha política”, Bolsonaro, na verdade, representa não sua negação, mas o que há de pior nela. Ele é a materialização do lado mais nefasto, mais autoritário e mais inescrupuloso do sistema político brasileiro.

Mas – e esse é o ponto que quero discutir hoje – ele está longe de ser algo surgido do nada ou brotado do chão pisoteado pela negação da política, alimentada nos anos que antecederam as eleições.

Pelo contrário, como pesquisador das relações entre cultura e comportamento político, estou cada vez mais convencido de que Bolsonaro é uma expressão bastante fiel do brasileiro médio, um retrato do modo de pensar o mundo, a sociedade e a política que caracteriza o típico cidadão do nosso país.

Quando me refiro ao “brasileiro médio”, obviamente não estou tratando da imagem romantizada pela mídia e pelo imaginário popular, do brasileiro receptivo, criativo, solidário, divertido e “malandro”. Refiro-me à sua versão mais obscura e, infelizmente, mais realista segundo o que minhas pesquisas e minha experiência têm demonstrado.

No “mundo real” o brasileiro é preconceituoso, violento, analfabeto (nas letras, na política, na ciência... em quase tudo). É racista, machista, autoritário, interesseiro, moralista, cínico, fofoqueiro, desonesto.

Os avanços civilizatórios que o mundo viveu, especialmente a partir da segunda metade do século XX, inevitavelmente chegaram ao país. Se materializaram em legislações, em políticas públicas (de inclusão, de combate ao racismo e ao machismo, de criminalização do preconceito), em diretrizes educacionais para escolas e universidades. Mas, quando se trata de valores arraigados, é preciso muito mais para mudar padrões culturais de comportamento.

O machismo foi tornado crime, o que lhe reduz as manifestações públicas e abertas. Mas ele sobrevive no imaginário da população, no cotidiano da vida privada, nas relações afetivas e nos ambientes de trabalho, nas redes sociais, nos grupos de whatsapp, nas piadas diárias, nos comentários entre os amigos “de confiança”, nos pequenos grupos onde há certa garantia de que ninguém irá denunciá-lo.

O mesmo ocorre com o racismo, com o preconceito em relação aos pobres, aos nordestinos, aos homossexuais. Proibido de se manifestar, ele sobrevive internalizado, reprimido não por convicção decorrente de mudança cultural, mas por medo do flagrante que pode levar a punição. É por isso que o politicamente correto, por aqui, nunca foi expressão de conscientização, mas algo mal visto por “tolher a naturalidade do cotidiano”.

Se houve avanços – e eles são, sim, reais – nas relações de gênero, na inclusão de negros e homossexuais, foi menos por superação cultural do preconceito do que pela pressão exercida pelos instrumentos jurídicos e policiais.

Mas, como sempre ocorre quando um sentimento humano é reprimido, ele é armazenado de algum modo. Ele se acumula, infla e, um dia, encontrará um modo de extravasar. (...)

Foi algo parecido que aconteceu com o “brasileiro médio”, com todos os seus preconceitos reprimidos e, a duras penas, escondidos, que viu em um candidato a Presidência da República essa possibilidade de extravasamento. Eis que ele tinha a possibilidade de escolher, como seu representante e líder máximo do país, alguém que podia ser e dizer tudo o que ele também pensa, mas que não pode expressar por ser um “cidadão comum”.

Agora esse “cidadão comum” tem voz. Ele de fato se sente representado pelo Presidente que ofende as mulheres, os homossexuais, os índios, os nordestinos. Ele tem a sensação de estar pessoalmente no poder quando vê o líder máximo da nação usar palavreado vulgar, frases mal formuladas, palavrões e ofensas para atacar quem pensa diferente.

Ele se sente importante quando seu “mito” enaltece a ignorância, a falta de conhecimento, o senso comum e a violência verbal para difamar os cientistas, os professores, os artistas, os intelectuais, pois eles representam uma forma de ver o mundo que sua própria ignorância não permite compreender.

Esse cidadão se vê empoderado quando as lideranças políticas que ele elegeu negam os problemas ambientais, pois eles são anunciados por cientistas que ele próprio vê como inúteis e contrários às suas crenças religiosas.

Sente um prazer profundo quando seu governante maior faz acusações moralistas contra desafetos, e quando prega a morte de “bandidos” e a destruição de todos os opositores.

Ao assistir o show de horrores diário produzido pelo “mito”, esse cidadão não é tocado pela aversão, pela vergonha alheia ou pela rejeição do que vê. Ao contrário, ele sente aflorar em si mesmo o Jair que vive dentro de cada um, que fala exatamente aquilo que ele próprio gostaria de dizer, que extravasa sua versão reprimida e escondida no submundo do seu eu mais profundo e mais verdadeiro.

O “brasileiro médio” não entende patavinas do sistema democrático e de como ele funciona, da independência e autonomia entre os poderes, da necessidade de isonomia do judiciário, da importância dos partidos políticos e do debate de ideias e projetos que é responsabilidade do Congresso Nacional.

É essa ignorância política que lhe faz ter orgasmos quando o Presidente incentiva ataques ao Parlamento e ao STF, instâncias vistas pelo “cidadão comum” como lentas, burocráticas, corrompidas e desnecessárias.

Destruí-las, portanto, em sua visão, não é ameaçar todo o sistema democrático, mas condição necessária para fazê-lo funcionar.

Esse brasileiro não vai pra rua para defender um governante lunático e medíocre; ele vai gritar para que sua própria mediocridade seja reconhecida e valorizada, e para sentir-se acolhido por outros lunáticos e medíocres que formam um exército de fantoches cuja força dá sustentação ao governo que o representa.

O “brasileiro médio” gosta de hierarquia, ama a autoridade e a família patriarcal, condena a homossexualidade, vê mulheres, negros e índios como inferiores e menos capazes, tem nojo de pobre, embora seja incapaz de perceber que é tão pobre quanto os que condena.

Vê a pobreza e o desemprego dos outros como falta de fibra moral, mas percebe a própria miséria e falta de dinheiro como culpa dos outros e falta de oportunidade. Exige do governo benefícios de toda ordem que a lei lhe assegura, mas acha absurdo quando outros, principalmente mais pobres, têm o mesmo benefício.

Poucas vezes na nossa história o povo brasileiro esteve tão bem representado por seus governantes. Por isso não basta perguntar como é possível que um Presidente da República consiga ser tão indigno do cargo e ainda assim manter o apoio incondicional de um terço da população.

A questão a ser respondida é como milhões de brasileiros mantêm vivos padrões tão altos de mediocridade, intolerância, preconceito e falta de senso crítico ao ponto de sentirem-se representados por tal governo?


Leia, também, entrevista com o professor Ivann, realizada em Maio/2020 para o site Carta Capital. Clique no link abaixo. 

Bolsonaro é o “ lado mais nefasto da política brasileira ”, diz sociólogo...


Para Ivann Carlos Lago, ditadores sempre projetam inimigos e estão em guerra permanente contra eles, tal qual a política de Bolsonaro.



O Jair que há em nós




Ivann Lago

(Professor e Doutor em Sociologia Política)


O Brasil levará décadas para compreender o que aconteceu naquele nebuloso ano de 2018, quando seus eleitores escolheram, para presidir o país, Jair Bolsonaro.

Capitão do Exército expulso da corporação por organização de ato terrorista; deputado de sete mandatos conhecido não pelos dois projetos de lei que conseguiu aprovar em 28 anos, mas pelas maquinações do submundo que incluem denúncias de “rachadinha”, contratação de parentes e envolvimento com milícias; ganhador do troféu de campeão nacional da escatologia, da falta de educação e das ofensas de todos os matizes de preconceito que se pode listar.

Embora seu discurso seja de negação da “velha política”, Bolsonaro, na verdade, representa não sua negação, mas o que há de pior nela. Ele é a materialização do lado mais nefasto, mais autoritário e mais inescrupuloso do sistema político brasileiro.