EQUIPES DE SAÚDE EM WUHAN COMEMORAM O DIA INTERNACIONAL DA MULHER. FOTO : CHENG MIN/CHINHUA
Em suas próprias redes sociais, eles cantaram, dançaram
zoaram – exatamente como o resto do mundo
Por Belinda Kong, no The Conversation
Tradução Maurício Búrigo
Medo e culpa parecem estar rapidamente se tornando as emoções determinantes dos norte-americanos em relação ao COVID-19. As manchetes parecem oferecer ou as piores estimativas possíveis ou troca de acusações entre governantes. Estes comportamentos, similares em outros países que se tornaram epicentros do COVID-19, demonstram a ideia de resiliência pandêmica –a possibilidade de que se consiga passar por surtos de doença com empatia, engenhosidade e absoluta normalidade humana
Em meio a cifras confusas e narrativas políticas contraditórias, é importante lembrar que números e governos são abstrações, enquanto as pessoas convivem com a doença e passam por ela de verdade. Ao nos fixarmos nos primeiros, nos arriscamos a perder de vista as dimensões humanas da vida durante a epidemia.
Como estudiosa que pesquisava os aspectos culturais da epidemia de SARS em 2003, também eu de início me foquei em geopolítica e biossegurança. Mas o que descobri além disso foram as formas vibrantes da vida em comum no dia-a-dia geradas pelo SARS nos seus próprios epicentros, raramente discutidas, mas crucialmente humanizadoras.
Sob condições de isolamento e distanciamento social obrigatórios, as pessoas comuns inventavam novos tipos de sociabilidade e novos gêneros de expressões epidêmicas. Com o COVID-19 agora, ainda mais que com o SARS, a internet e as mídias sociais chinesas oferecem uma gama variada de exemplos de comunidades afetadas pela epidemia e reunidas pela emoção, humor e criatividade.
Um primeiro conjunto de vídeos viralizados veio à tona em Wuhan apenas cinco dias após o confinamento da cidade. Na noite de 27 de janeiro, os residentes gritaram “jiayou” – literalmente “ponham óleo”, o que quer dizer “aguentem firmes” ou “não deem pra trás”– das janelas de seus apartamentos, numa explosão de solidariedade espontânea. Foi uma demonstração de força e desafio coletivos, de recusa das pessoas de serem sufocadas pelo vírus e pela quarentena, e de seu desejo de torcer umas pelas outras.
Um desses clipes, publicado no youtube pelo jornal South China Morning Post, teve mais de um milhão de acessos, com internautas de inúmeros países asiáticos ecoando “Wuhan jiayou!” como encorajamento. De fato, o refrão se espalhou até virar um grito de guerra internacional nas redes sociais, a despeito das tentativas do governo chinês de se apropriar dele como um slogan de patriotismo étnico-nacional.
Este espírito de apoio recíproco se estende ao cuidado com os animais. O confinamento de Wuhan fez com que dezenas de milhares de residentes ficassem ilhados do lado de fora da cidade, deixando aproximadamente 50 mil animais de estimação presos em casas abandonadas. Através das mídias sociais, alguns donos de animais domésticos se conectaram com Lao Mao (“Velho Gato”), que dirige uma equipe de resgatadores de animais voluntários em Wuhan. Estes resgatadores percorrem a cidade e às vezes arrombam casas desertas para alimentar cães e gatos abandonados.