A morte de Paulo Henrique Amorim não é obra do acaso



morte Paulo Henrique Amorim


Paulo Henrique Amorim era o jornalista mais processado deste período digital. A ampla maioria das ações era movida por criminosos que não aceitavam ouvir o que ele falava. PHA estava sendo perseguido de maneira violenta.

Redação Pragmatismo

Três jornalistas que comentaram a morte de Paulo Henrique Amorim nesta quarta-feira (10) convergem em um ponto: a morte do editor do ‘Conversa Afiada’ não é obra do acaso.


“Combatendo com vigor na escuridão, seu coração não resistiu ao último golpe, o da Record”, escreveu a amiga e renomada jornalista Tereza Cruvinel, referindo-se ao afastamento de PHA de seu programa na TV Record após pressão do governo Bolsonaro.

“Paulo Henrique Amorim parte num momento péssimo. E provavelmente vítima dele e dos canalhas que o perseguiam. Ele foi o jornalista mais processado deste período digital. Na maioria das vezes por criminosos que não aceitavam que aquele baixinho carioca berrasse em alto e bom som o que lhes era merecido ouvir”, publicou Renato Rovai, editor da Revista Fórum e amigo pessoal de Paulo Henrique.


“Eu, aqui do meu canto, acho que Paulo foi ‘morrido’ por essa gente. Porque estava sendo perseguido de maneira violenta e recentemente, por pressão do governo, foi afastado da apresentação do Domingo Espetacular, da TV Record”, acrescentou Rovai.

Morte estudada

Para o jornalista gaúcho Moisés Mendes, a morte de Paulo Henrique Amorim precisa ser objeto de estudo. “Com suas circunstâncias, o contexto político e todos os seus significados, a morte de PHA deveria ser estudada já a partir de hoje à tarde nas escolas de jornalismo. Amorim foi morto pelo assassinato das grandes redações.”

“Hoje, as grandes redações são esvaziadas de qualquer possibilidade de resistência, porque são cada vez mais orientadas para serem cúmplices do poder. Amorim foi apenas um dos mais recentes expulsos do trabalho numa grande corporação […] Seu afastamento da TV Record ganhou manchetes porque ele era uma figura conhecida. Mas as redações passam por limpezas que a maioria não fica sabendo”, complementou Moisés.

O texto integral de Tereza Cruvinel sobre a morte de PHA pode ser lido abaixo. Os textos de Renato Rovai e Moisés Mendes podem ser lidos aqui e aqui.

por Tereza Cruvinel, em seu Facebook

“Obrigado, querida, disso entendemos nós dois: sobreviver”. Foi o que me disse Paulo Henrique Amorim no dia 24, em resposta à minha mensagem expressando solidariedade. Ele acabava de ser afastado do Domingo Espetacular pela TV Record, por pressão do governo intolerante, autocrático e autoritário de Bolsonaro.

Eu havia dito, na mensagem, que ele era um pilar da resistência e vítima do disfarçado e não comentado expurgo de jornalistas que vem acontecendo no país, afastando da mídia os combativos, os que não se vergam. “Eles passarão, nós passarinhos, ainda vamos gorjear”, eu disse ainda ele.

Paulo Henrique entendia mesmo de sobreviver. Eu, nem tanto. Combatendo com vigor na escuridão, seu coração não resistiu ao último golpe, o da Record. Não viveu para um dia gorjear , quando a luz finalmente voltar a iluminar o país com justiça, liberdade e democracia de verdade.

Falando e escrevendo, no estilo cortante que lhe era próprio e único, combateu o engodo, a mentira, a tempestade do ódio, o obscurantismo e o servilismo que tomou conta de boa parte da imprensa. Escandindo as palavras quando falava, ou construindo frases como quem amola a faca, PHA estava o tempo todo na trincheira.

Já fui tirada abruptamente por ato de força, quando o governo Temer interveio na EBC, logo depois do golpe do impeachment. Eu já não era presidente mas comentarista política e apresentadora na TV Brasil. O interventor Laerte Rímoli baniu imediatamente da rede pública uma penca de jornalistas.

Além de mim, Luiz Nassif, Paulo Moreira Leite, Emir Sader, Sidney Resende e outros mais. Havíamos feito uma cobertura intensa e pluralista da guerra contra Dilma, mostrando as duas faces do processo em curso. De repente, ficamos sem chão e sem voz. Imagine o que foi para PHA o golpe da Record, ele que há 14 anos apresentava o Domingo Espetacular.

Depois da covardia da Record, que cedeu à pressão dos que pediam a cabeça de PHA, ele continuou resistindo e combatendo no site Conversa Afiada e na TV Afiada. Ontem à noite ainda o li seu comentário sobre o áudio divulgado por The Intercept, em que o procurador Dallagnol festeja a liminar do ministro Fux impedindo Lula de dar entrevista antes do segundo turno da eleição.

“Hipócrita celebra a decisão de Fux que calou a imprensa “, escreveu ele, chamando agora Dallagnol de Dallainho. Já com data de hoje, outro texto falava da liberação de R$ 2,4 bi em emendas, pelo governo, para juntar votos a favor da reforma da Previdência. Paulo Henrique deve tê-lo escrito de madrugada, antes do infarto. Seu último dardo flamejante.

Caiu um pilar da resistência. Paulo Henrique não sobreviveu fisicamente, mas viverá no exemplo que deixou: como jornalista: não se calou nunca, não se vergou, não se vendeu, não se rendeu, não lambeu botas para preservar posições. Vai, PHA, você fez muito, travou o bom combate e se foi com dignidade.






Abaixo veja o último vídeo gravado por Paulo Henrique Amorim em 08/07/2019












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O (humaníssimo) Direito ao Reparo



Contra a alienação e a obsolescência programada surge uma reivindicação prosaica, mas cheia de sentido. É preciso recobrar o poder de consertar os aparatos que se danificam — ao invés de descartá-los e afundar no consumismo.

Por Valerie Vande Panne | Tradução: Gabriela Leite e Simone Paz


No final de 2018, conectei meu iPhone em meu MacBook usando um cabo genérico, comprado em um mercadinho. Comecei a fazer um backup. Tudo congelou. Meu iPhone não ligava, e ficou travado na tela inicial com o logo da Apple. Horas no chat de suporte da Apple e um dia depois (tirando os detalhes traumáticos), saí da loja mais próxima da empresa com meu celular “restaurado” para as configurações de fábrica.

Perdi todos os meus dados. Nada pode ser salvo.

O técnico da Apple repreendeu-me por usar um cabo não autorizado pela empresa. Tirou sarro de mim por não usar o Cloud, serviço de armazenamento online. Minha pergunta foi: “Por que a Apple não avisou que não se pode usar esses cabos para backups?” Ele riu, e disse que eu deveria saber.

Senti que a Apple estava me punindo por gastar 10 dólares em um cabo no mercado perto de casa, ao invés de pagar os 20 dólares no cabo proprietário.

Comprar um cabo de carregamento de celular é quase um gasto anual. Por que eu não deveria gastar o dobro? Por que a Apple não me avisaria para não fazer backup com ele?

Mais tarde, falei com Danny Varghese, dono de uma loja de reparos técnicos em Nova York. Ele disse que eu provavelmente não tinha perdido nenhum dado, e que ele provavelmente conseguiria recuperar tudo e consertar o problema por um preço razoável.

Por que a Apple me faz perder todos os meus dados quando isso não é necessário? Varghese explicou que eu não era a única. Ele recebe clientes como eu regularmente.

“Uma cliente veio aqui dois dias atrás”, contou. “Ela levou seu iPhone X para a autorizada da Apple. Ele estava reiniciando sozinho. Disseram para limpar o aparelho.” Ela o levou a Varghese. “Mesmo sem o programa de diagnóstico”, ele conta, “descobri que o problema estava na bateria, troquei a peça, e resolvi o problema. O celular funcionou bem — até melhor que antes.” A moça não perdeu seus dados, mas teria que mandar seu celular para fazer uma limpeza.

“Os clientes não têm que perder todos os seus dados só porque a Apple diz”, ponderou Varghese.

Não é só a Apple que nega ao consumidor o direito de consertar produtos que o consumidor compra. É a John Deere, que produz tratores. São os fabricantes de geladeiras. E mais ou menos tudo que é produzido hoje, que contenha partes eletrônicas, ou que se conecte à internet. Pode ser que você precise de uma peça de cinco centavos para consertar sua televisão de tela plana, mas sem os esquemas controlados pelo fabricante você jamais terá ideia de qual parte de cinco centavos você precisa, ou onde instalar. Então, você simplesmente compra outra TV.

Ao negar ao consumidor a estrutura, as ferramentas e a informação necessária para consertar os produtos que o consumidor possui, os fabricantes nos empurram para uma sociedade cada vez mais descartável, a um custo cada vez maior para nossos bolsos e para o planeta.

A consciência pública sobre essa questão cresceu, à medida que novos utensílios são programados para a obsolescência e as pessoas são pressionadas a comprar novas coisas — que talvez nem queiram, ou precisem. Um caso muito famoso é o da John Deere, que basicamente proíbe os agricultores — talvez algumas das pessoas mais hábeis a consertar seus equipamentos sozinhas — de fazer reparos em seus próprios tratores.

Os agricultores não são os únicos consumidores afetados. Quanto mais os eletrodomésticos incorporam tecnologias “inteligentes” de controle remoto, os fabricantes criam mais obstáculos para o reparo funcional. Colam as baterias dentro do produto, de maneira que não possam ser trocadas, e recusam-se a liberar os esquemas para fazer reparos, tanto aos técnicos quanto ao público geral.

Se um grupo de ativistas, pensadores e cidadãos engajados tiverem êxito, no entanto, Nova York vai ser o primeiro estado dos EUA a resolver esse problema crescente.

O movimento é chamado de Direito ao Reparo. A Associação pelo Reparo lidera os esforços para conseguir que a legislação do Direito ao Reparo passe [em mais de doze estados]. 2019 marca o quinto ano em que um projeto de lei com esses parâmetros foi introduzido na Assembleia Legislativa de Nova York. Com projetos semelhantes em duas instâncias, os apoiadores acreditam que o Direito ao Reparo possa passar em breve.

Se isso acontecer, como Nova York tem uma grande influência no país, será criado um precedente que os fabricantes não conseguirão ignorar. “É altamente improvável que empresas como a Apple ou a John Deere digam ‘não vou fazer negócios em Nova York’”, disse Gay Gordon-Byrne, diretor executivo da Associação do Reparo. “Uma vez que passe em Nova York… os fabricantes terão que estabelecer uma versão do direito ao reparo”. Ela frisa: “O primeiro projeto é o que cria o padrão”, disse. Com isso, a oposição dos lobistas da indústria deveráser “insanas”.

Se quebrou, não conserte!

Os argumentos que as corporações utilizam para impedir que o público mexa em seus produtos costumam ser a respeito a softwares proprietários, preocupações com a segurança e perigos da bateria de lítio.

Os fato de os programas serem licenciados e terem copyright não significa que sejam um segredo. Gordon-Byrne explica que os livros também estão protegidos por direitos autorais, mas o texto serve para compartilhar informações, assim como os softwares são feitos para passar por sinais elétricos que representam os dados. “É completa e especificamente legal fazer o reparo de hardwares e fazer cópias de backup legal, e mexer com os softwares, inclusive fazer modificações e customizações”, completa.

Preocupações com a segurança são outras táticas de amedrontamento que os lobistas gostam de empregar, segundo Gordon-Byrne. O único problema é que a vulnerabilidade da segurança cibernética não está ligada aos reparos do dispositivo “a não ser nos filmes”, brinca. “Equipamentos são feitos ou para serem seguros, ou não.”

Um exemplo de equipamento inseguro deve ser um dispositivo que usa um chip que já carrega com um spyware. Mas Gordon Byrne argumenta que “é alarmista e ridículo dizer aos consumidores que levar seus equipamentos ao conserto fará com que fiquem mais expostos a algum novo risco — quando os grandes riscos [tais quais os assistentes pessoais que gravam todas as conversas ou outros relacionados à Internet das Coisas] vêm sendo ignorados.”

Profissionais de segurança uniram-se para apoiar o Direito ao Reparo.

Para além de softwares e segurança, a maior parte das pessoas só quer que os produtos nos quais gastam centenas (quiçá milhares) de reais funcionem. No fim das contas, se a bateria do seu fone de ouvido sem fio está acabando rápido, você deve mesmo comprar novos fones? Não é mais fácil trocar a bateria? Principalmente se você não tem dinheiro pra ficar continuamente investindo em novas tecnologias. Mas infelizmente, a bateria em seus fones de ouvido provavelmente está colada. Quando ela morre, também morrem os fones.

Mas nós não jogamos fora os carros quando sua bateria está com defeito. Nós consertamos a peça que quebrou. Pelo menos foi o que fizemos por centenas de anos.

Outra tática de pânico é realçar o que é conhecido como o “escapamento térmico”: quando uma bateria de lítio-íon morre — a bateria que provavelmente está em seu celular, notebook e até nos carros elétricos — começa a pegar fogo. É assustador ver, ou imaginar crianças expostas a isso. Mas muito raramente acontece na assistência técnica — especialmente quando ferramentas de diagnóstico apropriadas existem, e seu funcionamento está disponível e referenciado.

Felizmente, os legisladores de Nova York ouviram o mesmo disco de lobistas pelos últimos quatro anos. Os mais experientes, segundo Gordon-Byrne, estão “muito bem inoculados” a táticas de pânico. Mas há sempre os novatos, que “ainda não foram vacinados”. Até agora.

“Quando você se senta pela primeira vez com um deputado, eles dizem que isso é muito óbvio”, diz Gordon-Byrne. “Então, ouvem a história dos lobistas e, de repente, ouvem que o jeito americano será destruído. Haverá acontecimentos catastróficos. Exige algum tempo até que eles sejam postos de volta nos eixos.”

Uma longa tradição de reparos

Os projetos de lei de Nova York estão baseadas no projeto de direito ao reparo estabelecido para automóveis e caminhões comerciais que passou em Massachusetts, em 2012. Essa lei diz que fabricantes de carros devem fornecer, a preços justos e razoáveis, diagnósticos, ferramentas, controle e manuais de serviço que sejam os mesmos da concessionária. A lei garante que se você vive em Massachusetts, você deve conseguir que seu carro seja consertado em uma mecânica que tenha o mesmo acesso à informação que a concessionária. A Auto Alliance e a Automotive Service Association — grupos de comércio para as grandes fabricantes de automóveis e de concessionárias de carros, respectivamente — chegaram a um acordo que diz que os fabricantes de carros cumprirão o que se exige em Massachusetts em todo o resto dos EUA.

Gordon-Byrne explica que a proposta de lei de Nova York opera de maneira semelhante. “Se algo tem eletrônicos em si, há variações dos mesmos componentes. Você consegue entender o que há de errado. Depois do diagnóstico, você consegue a nova peça, usa ferramenta, passa de novo pelo software de diagnóstico e… Está restaurado!”

Kyle Wiens é o novo presidente da iFixIt (um site de reparos) e um apoiador do Direito ao Reparo. A possível nova lei de Nova York “vai restaurar nosso direito de consertar nossas próprias coisas. Equipamentos de agricultura, eletrônicos — tudo, menos equipamento médico.” A concessão aos equipamentos médicos foi feita para conseguir com que o projeto consiga passar, mas a questão de hospitais é algo para se pensar adiante. Os hospitais podem querer ter o direito de consertar os equipamentos que possuem, mas os fabricantes de aparelhos médicos estão exigindo que sejam utilizados seus caros contratos de serviço.

Todo o resto, porém, está coberto pelo projeto de Nova York, diz Wiens. Considere, por exemplo, o novo Mac Pro básico de US$ 6 mil [preço nos EUA, cerca de R$ 22,8 mil reais. No Brasil, o modelo atual custa entre R$ 31 mil e R$ 55 mil], que foi anunciado recentemente pela Apple. “Você consegue consertá-lo?” pergunta-se Wiens. “Essa é uma questão aberta.”

Obviamente, a questão é mais séria do que as piadas inspiradas pelo recente anúncio da Apple, que soou como algo que apareceria em uma série de comédia, mais do que um produto real que os humanos realmente queiram.

“Antigamente, havia oficinas técnicas para aspirador de pó e TV, e agora há apenas caminhões de lixo levando embora nossas coisas”, diz Wiens. Mesmo o direito de manter os produtos que você tem está sendo, há muito tempo, retirado — simplesmente porque os fabricantes promovem a sociedade descartável, em busca de mais lucros para seus acionistas.

O que aconteceu com os consertos manuais?

Quando Henry Ford criou os automóveis que marcaram o século XX, ele o fez remexendo peças — e queria que outras pessoas tivessem o direito de fazer o mesmo. Na verdade, Ford valorizava tanto o espírito do “faça você mesmo” que sua empresa produziu múltiplos “kits de conversão” pós-venda para o Modelo T. Quem o possuísse poderia convertê-lo no que quer que precisasse, incluindo um trator, uma moto de neve e uma caminhonete. O modelo de negócio da Ford, naqueles dias, encorajava o consumidor a remexer e fazer reparos, com autossuficiência.

Benjamin Franklin era um remexedor de peças. Tomas Edison e Nikola Tesla também. Essa é a raiz da inovação — a liberdade de aprender como as coisas funcionam, e experimentar com a construção de coisas novas e melhores. O crescente controle corporativo parece estar esmagando o espírito inovador. 

Cultura do desperdício e a explosão do lixo eletrônico

Para além da inovação e do direito de simplesmente manter os produtos que funcionam (que empregam todos esses técnicos de bairro que ainda existem, e com quem você pode contar), Wiens vê o direito ao reparo como uma necessidade absoluta em contexto urbano.

“Remover uma geladeira antiga de um apartamento não é uma coisa fácil”, diz. Refrigeradores costumavam ter uma vida útil de 20 anos ou mais, e havia técnicos em sua comunidade que poderiam consertá-los rápida e facilmente. “Hoje em dia, se você compra uma geladeira, a vida útil esperada é de sete anos. É o menor tempo que se tem notícia. E as cidades acabam tendo que se responsabilizar por esse problema.”

Isso porque as cidades lidam com o fluxo de resíduos. Refrigeradores pesados e volumosos não entram em um caminhão de lixo comum. “Têm de ser manejados de maneira especial, pois há um motor refrigerador dentro”, lembra Wien. “Há instalações especializadas que lidam com o fim da vida útil dos refrigeradores.”

O mesmo acontece com televisões mais novas. “Não há nenhum bom motivo para trocar qualquer TV que você tenha comprado nos últimos cinco a dez anos”, declara Wien. Alguma peça barata e simples poderia ser trocada, mas ao invés disso, o aparelho inteiro vai para o lixo, e aí aparece mais um problema para a cidade.

Fabricantes que produzem geladeiras e TVs de vida útil curta, que não podem ser facilmente reparadas, criam um ônus para as cidades, que precisam lidar com um número crescente desses produtos que entram no fluxo de resíduos. Em grandes cidades, alguém pode fazer o atendimento do produto, mas as pessoas que moram em comunidades rurais e mais pobres não têm o mesmo acesso. Sem acesso fácil ao funcionamento e às partes, seu Direito ao Reparo — sua autossuficiência — é forçadamente diminuída.

Não são só as geladeiras e TVs que causam problemas para o fluxo de resíduos urbano. Ao fabricar produtos e treinar o consumidor a vê-los como descartáveis, como os telefones celulares, um perigo real pode acontecer. Baterias de lítio-íon são agora parte do fluxo de lixo, e quando esses componentes são esmagados em caminhões de lixo, podem criar o fogo de escapamento. Então, o próprio caminhão de lixo — ou a instalação de gerenciamento de resíduos — pega fogo.

O que está acontecendo agora, de acordo com Peter Mui, fundador da Fixit Clinic, na Baía de São Francisco, Califórnia, é que as seguradoras estão se recusando a cobrir centros de reciclagem por causa do risco de alguém ter jogado um equipamento eletrônico com uma bateria. “Nós projetamos esses dispositivos em um buraco negro”, segundo Mui.

De acordo com o site do iFixIt, para cada mil toneladas de eletrônicos, o aterro cria zero empregos, a reciclagem gera 15 e o conserto cria 200.

Empregos de reparo técnico são ótimos. O costureiro, o sapateiro, as oficinas de TV e celulares “são as lojas que queremos em nossos bairros”, diz Wiens. “Antigamente, havia lojas de câmeras em toda cidade, nos EUA. Agora não há nenhuma. Esse é um resultado direto da decisão da Nikon e da Canon de não vender peças de reposição para lojas independentes. Essas empresas simplesmente decidiram ‘não haverá mais peças para você’, e foi assim o fim das lojas de câmera, por volta de 2012. Como resultado dessas políticas de fabricantes, afirma Wiens, perdemos parte importante da resiliência econômica de nossas cidades.

Dentro da oficina de conserto

Mas isso não faz com que parem de surgir pequenas lojas de conserto nas cidades. Na oficina da Fixit, pessoas de todas as idades e todos os níveis de experiência se encontram em oficinas de reparo comunitário, que acontecem principalmente em bibliotecas públicas. Mui descreve as oficinas como uma “desmontagem guiada”, e diz que é “como uma reunião do AA para coisas quebradas.”

As pessoas chegam, e alguém diz “‘Olá, sou Paulo e esse é meu aparelho de DVD. Ele faz esse barulho quando eu insiro um disco’. Nós dizemos ‘OK, vamos abrir e ver o que pode estar errado’”, conta Mui, mostrando que eles ajudam as pessoas a consertar seus próprios aparelhos. “Não estamos consertando isso para o cliente. Estamos guiando-o para o conserto. Estamos espalhando o ethos de que consertar é possível.”

Mui ensina reparos técnicos desde 2009, quando começou a Fixit na Universidade da Califórnia. “Antes, tratava-se de uma oportunidade humilde de disponibilizar ferramentas, apenas para ver o que poderíamos fazer”, conta. “Mas ao longo do tempo, eu me aproximei mais da política e da defesa de direitos. Há algumas escolhas civilizatórias que enviam as coisas para o aterro prematuramente. Quanto mais eu trabalho com isso, fica mais politicamente claro que estamos operando o planeta em um nível de consumo. Nosso consumo está matando o planeta. É insustentável continuar dessa maneira. É nosso interesse, como civilização, manter as coisas a seu nível mais alto de utilidade pelo mais longo tempo possível.”

Mui acredita que as pessoas se cansam de seus produtos, ou pensam “isso está velho, preciso de um novo.” Outro problema, no entanto, é que o produto tem uma coisa muito simples que poderia ter sido consertada, e as pessoas não pensam que poderia ser reparável — a mentalidade hipercapitalista e descartável penetrando em nossos modos de vida.

Para Mui, ajudar a consertar dá poder às pessoas para que possam fazer que com que o aparelho fique “melhor do que quando era novo. Não apenas restaurado, mas agora você entende como ele quebrou e pode solucionar os problemas dele e consertá-lo muitas vezes.”

“A taxa de sucesso nos consertos é de 70%, sem acesso à assistência autorizada ou manual do fabricante. Na maior parte do tempo, simplesmente aplicamos as habilidades de pensamento crítico”, explica Mui.

Mui conta que sua inspiração veio de momentos em que viu equipamentos eletrônicos que eram facilmente reparáveis, mas cujos fabricantes “usavam uma cabeça triangular estranha ou uma chave de fenda com chave de boca, e as pessoas comuns não têm essas ferramentas.”

À medida em que o hardware e o software tornam-se mais e mais integrados, na eletrônica de hoje, a questão do direito ao reparo “fala sobre a natureza da propriedade em geral”, para Mui. “A Apple parou de fornecer atualizações para os iPhones 4 e 5. As informações pessoais contidas neles estão vulneráveis, e podem ser roubadas. Mas você tem direito à posse delas. Você gastou 500 ou 600 dólares naquilo. Ele faz tudo que você precisa. Mas a Apple decide que você não vai mais usá-lo. E se se uma terceira parte fornece a atualização, só a Apple pode dar o código para desencriptar o telefone. A Verizon decidiu por conta própria não permitir mais a ativação de telefones 3G. Então, se você quer vender o aparelho para outra pessoa, você vai ter um tijolo de 400 dólares. Não pode usar mais com a Verizon, já que a frequência está bloqueada para a rede da empresa.”

Mui aponta que a indústria de moda chamada de fast-fashion, de descarte rápido, também é parte crítica do movimento pelo reparo. “São roupas, malas, barracas e toldos” que poderiam ser facilmente arrumados, ele diz, e ainda assim essa é a segunda indústria mais poluidora da Terra, ao lado da de petróleo”.

“O conserto desapareceu. Não há mais reparos de terceiros em muitas cidades. Fica mais caro consertar que comprar algo novo”, explica Mui.

Uma das coisas que ele espera que aconteça com a FixIt é inspirar a “como projetar para a durabilidade, facilidade de manutenção e capacidade de manutenção e reparo… desde o início.”

Treinando para abandonar o descarte

Na Ethical Culture Fieldston School, uma escola particular de Nova York, alunos do ensino fundamental e médio aprendem a fazer reparos em seus próprios dispositivos.

“Existe um centro e voluntários, como um centro de reforço de matemática”, conta Jeannie Crowley, diretora de tecnologia da escola. “Nós dizemos: ‘Ok, seu celular quebrou. Vamos orientá-lo para que você mesmo possa consertar’. Falamos sobre os minerais e as ferramentas e a habilidade de fazer manutenção.”

Os estudantes, conta Crowley, passam muito tempo em seus celulares. Mas quando eles os abrem, conseguem ter um modelo mental de como os telefones funcionam, e sua relação com eles muda.

Não só a escola ajuda os alunos (e pais) a estender a vida útil de seus celulares, ela diz, “Queremos que as pessoas saiam da escola e façam projetos pensando em um ajuste para que possam prolongar a vida” dos produtos que desenharem. É assim que esperam levar as crianças para o movimento do reparo.

“As pessoas costumam pensar que crianças não devem se envolver com manutenção”, lembra Crowley. “Sentimos que o reparo é algo que as crianças precisam entender. Um de nossos objetivos é resolver os problemas para que as escolas que não têm recursos como nós possam pegar o que aprendemos e aplicar a seus estudantes.”.

Até os alunos do ensino fundamental têm a oportunidade de abrir seus computadores, fazer a limpeza, aumentar a memória RAM e deixá-los prontos para os estudantes do ano seguinte.

Crowley diz que o direito ao reparo diz respeito a muitas coisas fundamentais, incluindo a ideia de propriedade, e de economia de dinheiro. Para ela e os estudantes, também trata-se de prevenção às mudanças climáticas e sustentabilidade, contenção do lixo eletrônico, e prevenir que produtos vão para o aterro por causa de um software que tem data de validade, ou que a bateria esteja colada por dentro. “Nos tornamos uma sociedade descartável, e isso não é sustentável”, ela diz.

Reparo e sustentabilidade, ambos requerem que “os fabricantes nos deem as ferramentas, instruções e acesso a peças para completar o conserto.”

Crowley ri da ideia de que “‘é perigoso consertar seu próprio telefone, ou que crianças podem fazer algo errado.” Fazer a manutenção de seu próprio carro era uma tradição honrada — e podia ser perigoso também. As pessoas fazem reparos eletrônicos há muito tempo. Ao receber as instruções, podemos aumentar a segurança, mas os fabricantes não querem que isso aconteça, porque significa que vamos manter nossos aparelhos por mais tempo.”

Crowley diz que fabricantes querem “um ciclo de vida útil muito curta e muito lucro.” Reparos — e sustentabilidade — não se alinham a esses objetivos.

Pequenos consertos, enorme diferença

Varghese também é um grande defensor do Direito ao Reparo. “Digamos que o vidro da câmera traseira de seu iPhone quebre. A Apple dirá que você precisa de um telefone novo. É uma mentira. Você pode trocar aquele vidrinho”.

Está claro que Varghese sabe como os fabricantes operam. Ele explica por que não se tornaria um provedor de serviços autorizados pela Apple: “Eles exigem que você nunca conserte outros produtos — nem que faça isso com seus esforços, como no caso do vidro da câmera do telefone. Se você curte usar um produto, não deveria ser obrigado a trocá-lo por um melhor ou mais moderno só porque a Apple ou a Microsoft querem ganhar mais dinheiro”.

Varghese vem consertando telefones e computadores desde o colegial. “Se você lhes disser [à Apple] que caiu um pouco de água em seu computador, isso quer dizer… que sairá US$1.200 o conserto, mas que por US$1.300 você pode comprar um novo”, ele diz, evidentemente frustrado. Ele afirma que consegue fazer consertos de danos por líquido pelo preço de US$350 — mas mesmo assim, às vezes se vê envolvido em problemas. Por exemplo, recentemente, o aparelho de um cliente teve danos por líquido e ele conseguiu consertar tudo, menos a webcam. Se o Direito ao Reparo existisse, as instruções da máquina estariam disponíveis e Varghese poderia compreender como consertá-la.

Mais consumidores precisam saber do Direito ao Reparo, diz Varghese. A Apple pode ter falado que alguns problemas não podem ser consertados, mas com o Direito a Reparo, esses produtos podem se tornar plausíveis de conserto. “Um mercado aberto é bom para os negócios e para os consumidores”, diz Varghese. “É bom para todos”.

E quando o Direito ao Reparo for implementado, diz Wiens, “poderemos trazer de volta uma cultura de engenharia e de ajustes que fazia parte da experiência popular”.

É bom que isso seja feito logo. Eu adoro meu iPhone SE. É do tamanho ideal, e um dos menores iPhones que já inventaram. Sou uma mulher miúda, não quero um celular maior do que um CD Walkman dos anos 80. Se eu conseguir manter este telefone funcionando até que a Apple perceba que não todos seus clientes são homens de um metro e oitenta com mãos gigantes, ficarei muito feliz”.






A situação tragicômica brasileira . . . É para rir ou para chorar ?


Céu
No princípio era o caos.E eu criei o universo.Parece que, com Bolsonaro, o caos voltou.


O eclipse total da razão
(perdido no espaço no 4 de julho)


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O fim de Moro . . .



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Brasil, um país grotesco. Por Luís Costa Pinto





Por Fernando Brito

Do jornalista Luís Costa Pinto, sobre o último episódio do circo do pão minguante:
O mundo começa a perceber, mais rapidamente do que eu previa, a profundidade do abismo em que nos meteram os eleitores de Bolsonaro.
 Até no futebol, e num torneio organizado regionalmente por uma entidade carcomida pela corrupção como a Conmebol, sobressai a proatividade do fanfarrão tosco que ocupa a Presidência brasileira.
Os argentinos estão repletos de razão: o jogo do Mineirão era uma disputa em campo alheio à política e há ritos e solenidades próprias às disputas esportivas.
Não cabia, ali, uma hiperexposição ególatra do asno-presidente. Ele foi vaiado pela maior parte dos presentes, mas como sempre faz, dobrou a aposta e decidiu descer ao gramado no intervalo.
Voltou a ser vaiado, contudo maquiou a derrota pessoal com a imagem de destemido. Na verdade, quando girou sobre a cabeça uma canga que imitava a bandeira brasileira parecia uma velha louca e em transe imolando-se no xale da pomba-gira.
Bolsonaro age de forma estudada e destinada a conservar o terço da população que o apoia com fanatismo. Outro terço o odeia com a força de todos os órgãos, neurônios e líquidos do corpo.
Integro esta parcela. Jair Bolsonaro, seus filhos, seus asseclas e seus puxa-sacos compõe que há de mais desprezível e obtuso nos seres humanos. Os restantes 40% dos eleitores brasileiros aptos a votar, que por atos e omissões nas eleições de 2018 deram a vitória a esse ser energúmeno, decidiram nos lançar no abismo em que ora nos encontramos e serão relevantes demais para nos resgatar dele.
Nem todos os eleitores desse personagem desqualificado são cretinos patológicos ou transitórios. Mas todos os cretinos patológicos e transitórios que conheço votaram nele.
Cabe-nos agora expor diariamente os constrangimentos, as contradições, a escalada rumo ao autoritarismo autocrático que ele está trilhando para evitarmos o prolongamento do desastre na vida brasileira.
Camaradas, sob o bolsonarismo viramos um país grotesco.





Papa lança vídeo mundial por juízes "sem favoritismos" e com integridade





O Papa Francisco emitiu uma dura mensagem contra violações do Judiciário no momento em que vem sendo revelado um conluio de Sérgio Moro com procuradores. Num vídeo lançado mundialmente nesta quinta-feira, o Papa diz que juízes devem ser "isentos de favoritismos e de pressões que possam contaminar as decisões que devem tomar". "Os juízes devem seguir o exemplo de Jesus, que nunca negocia a verdade".


247 - O Papa Francisco emitiu uma dura mensagem contra violações do Judiciário no momento em que vem sendo revelado um conluio de Sérgio Moro com procuradores. Num vídeo lançado mundialmente nesta quinta-feira, o Papa diz que juízes devem ser "isentos de favoritismos e de pressões que possam contaminar as decisões que devem tomar"; "Os juízes devem seguir o exemplo de Jesus, que nunca negocia a verdade". 

No Brasil, a primeira divulgação do vídeo foi feita na página do Instituto Lula, no final da manhã. Assista ao vídeo logo abaixo. 

O "Vídeo do Papa" é uma iniciativa global da Rede Mundial de Oração do Papa para divulgar a intenções mensais de oração de Francisco relacionadas com os desafios da humanidade e a missão da Igreja. Mensalmente, o Papa Francisco lança um vídeo mundialmente.

Este vídeo, com o título "Integridade da Justiça" é 44º já lançado pelo Papa desde fevereiro de 2016, quando a iniciativa começou. Já houve vídeos dedicados aos refugiados, aos trabalhadores, aos desempregados e aos jornalistas. 

"Dos juízes dependem decisões que influenciem os direitos e os bens das pessoas. Sua independência deve ajudá-los a serem isentos de favoritismos e de pressões que possam contaminar as decisões que devem tomar", afirma o Pontífice.

"Os juízes devem seguir o exemplo de Jesus, que nunca negocia a verdade. Rezemos para que todos aqueles que administram a justiça operem com integridade e para que a injustiça que atravessa o mundo não tenha a última palavra", acrescentou o Papa.

Assista ao vídeo: