Marcel Camargo
“Lucifer” é um seriado televisivo criado por Tom Kapinos, em 2016, quando estreou no canal Fox. Seu argumento baseia-se na personagem de HQ criada por Neil Gaiman e que acabou se tornando spin-off da série em quadrinhos homônima, escrita por Mike Carey. A Fox anunciou o término da série após a 3ª temporada, mas o canal Netflix, devido ao seu grande sucesso junto ao público, comprou os direitos autorais da saga, para produzir a 4ª temporada.
Muito desse sucesso se deve ao ator Tom Ellis, que nos presenteia com um Lucifer charmoso, inteligente, carismático e humano. É perfeito o entrosamento entre ele e a personagem Chloe, detetive com quem acaba trabalhando, após renunciar ao trono no reino das trevas, para ajudar a polícia a desvendar assassinatos. A policial, inclusive, torna Lucifer vulnerável, pois, perto dela, seus poderes somem. Ambos se apaixonam, mas, até o momento, não consumaram a paixão, o que aumenta a torcida pelo final feliz entre os dois.
Além da atuação primorosa do protagonista, o sucesso da série se deve ao fato de que consegue nos fazer refletir sobre várias questões relacionadas ao bem e ao mal e sua inegável relativização. É interessante assistir ao rei das trevas se apaixonando e passando pelas dúvidas e dores que os humanos carregam vida afora. É interessante pensar nos perigos que o amor traz, tornando-nos suscetíveis ao sofrimento, bem como ver uma divindade em crise existencial, no divã de sua psicoterapeuta, Linda.
Para apreciar as histórias, no entanto, é preciso entrar no clima humorístico a que a série se propõe, sem comparar os conceitos televisivos com as crenças pessoais, pois trata-se uma visão peculiar e fictícia do diabo. Não é preciso interpretar nada ali, à luz da teologia, pois nem é essa a intenção dos episódios. As histórias apenas utilizam a figura de Lucifer para, no fundo, colocar os próprios homens como responsáveis pelos seus atos.
Lucifer, inclusive, deixa claro, na série, que os homens o culpam por aquilo que cada um faz porque quer. O inferno é simplesmente resultado da culpa que os humanos carregam dentro de si após a morte, diz a personagem, e eles inclusive podem sair de lá, caso tentem, mas os remorsos os impedem de evitar o castigo eterno de suas almas. E essa não deixa de ser uma interpretação interessante, enquanto se responsabilizam as pessoas pelo que fazem, sem isentá-las de arcar com as consequências do que fazem de suas vidas.
Por isso é que pode ser extremamente divertido assistir despretensiosamente à série. Rende boas risadas e reflexões interessantes sobre o bem e o mal, que está dentro de cada um de nós, e sobre as punições que carregamos também dentro de nós, afinal, ninguém poderá ser mais implacável conosco do que nossa própria consciência – nem mesmo Lucifer.
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