Vote para que um pai ou uma mãe, como eu, como você, possa continuar a ter o direito sagrado de abraçar e beijar seu filho ou sua filha, no meio da rua, em um shopping, na saída da faculdade, sem correr o risco de ser linchado por alguém que tenha um ataque violento de homofobia.
Vote para que as pessoas tenham o direito de serem diferentes, de serem o que bem entenderem. Vote para que elas possam andar por todos os cantos livremente, sendo o que são, sem serem hostilizadas, intimidadas, violentadas. Vote para que cada qual possa ter sua integridade garantida sem ter que fingir ser o que não é.
Vote para que as crianças sejam protegidas e não seja revogada ou menosprezada a lei que proíbe que elas sejam submetidas a castigos físicos violentos.
Vote para que as crianças sejam ensinadas a repelir abusos e informadas a como agir para se defenderem, inclusive quando estão em seu espaço mais vulnerável: o lar.
Vote para que o racismo, o uso da suástica, o feminicídio, a homofobia, a pedofilia, a cultura do estupro sejam coibidos, severamente punidos e, mais que isso, prevenidos.
Vote para que professores tenham liberdade de exercitar o que aprenderam e que ensinem com base em livros de especialistas de suas áreas. Vote para garantir que eles não sejam patrulhados por grupos ideológicos que intimidam, ameaçam, e agridem professores cada vez mais.
Vote para que livros sejam lidos e não rasgados.
Vote para impedir que a política se torne o esporte de xingar, ameaçar e agredir. Vote para estimular que as pessoas lutem mais e briguem menos.
Vote para que as pessoas não se comportem como gado, como manada, como matilha, como horda.
Vote para que as pessoas direcionem sua raiva contra problemas, e não contra pessoas. Vote para que as pessoas sejam radicais por entenderem a raiz dos problemas, e não por serem extremistas e extremadas.
Vote para que a verdade prevaleça sobre a mentira. Para que as pessoas sejam mais racionais e desconfiem de mensagens espalhafatosas, asquerosas e que induzem à raiva e a agressões. Vote para que as pessoas não confundam indignação com ódio.
Vote para que todos se lembrem que religião é amor ao próximo, e não ódio, pena de morte, tortura e discriminação.
Vote para que as pessoas aprendam que coragem não é ter uma arma na mão.
Vote para que o Brasil possa um dia se mirar mais no exemplo de países que combateram o crime com igualdade e equidade.
Vote para que o Estado cumpra sua função social de ajudar prioritariamente a quem mais precisa, a quem não tem o que comer, onde morar, onde dormir, onde estudar, onde tratar sua saúde física e mental.
Vote para que os governos gastem mais em educação, saúde, assistência social, meio ambiente e segurança pública do que com o pagamento de juros da dívida. Vote para que ricos paguem mais impostos, e a classe média e os pobres, menos.
Vote para que o combate à corrupção seja conduzido por organizações autônomas, e não por autômatos teleguiados por preferências partidárias.
Vote com espírito de justiça social, e não de vingança coletiva.
Eu preparo meu voto como o poeta preparava aquela canção. Aquela em que pedia: "que faça acordar os homens e adormecer as crianças".
Mas eu preparo um voto que faça acordar todas as pessoas, não só os homens. E que faça adormecer, em paz, todas as crianças, não importando suas diferenças. As brancas, negras e indígenas. As do condomínio e as da favela. As que correm e as que andam em cadeira de rodas. As que escrevem com a mão direita e as que usam a mão esquerda. As que gostam de bola e as que preferem bonecas.
A bandeira brasileira traz a insígnia "ordem e progresso". Apesar de inspirada no clássico lema positivista, a frase original e completa do filósofo Auguste Comte era a seguinte:
"O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim".
O lema de nossa bandeira, incompleto, mutilado de seu próprio coração, nos assombra ao longo de nossa história. Sempre quando nos esquecemos de que o amor é o princípio, meios e fins já não fazem o menor sentido.
É nossa sina, mais uma vez, lutar para escrever o que foi esquecido em nossa bandeira.
Sem amor, não existe ordem nem progresso.
Essa é minha bandeira. Qual é a sua?
*Antonio Lassance é cientista político