O papel(ão) do Supremo e o amanhã do golpe
Fernando Brito
Pode-se ser golpista agindo contra a ordem constitucional.
O Congresso Nacional está mostrando como, com um processo de julgamento onde pouco ou nada importa a veracidade ou a legalidade das acusações, mas o gostar ou não do “acusado”. Ou, a esta altura, quase vítima.
Pode-se ser golpista agindo sem mínimos princípios éticos e morais, como faz o vice-presidente Michel Temer, chamando líderes de partido ao Palácio do Jaburu e prometendo nacos do seu natimoribundo Governo.
Existe, porém, outra forma de ser golpista: deixar, por omissão ou retardamento nos seus deveres, que a ordem constitucional seja rompida para só depois disso debater e até proibir – que o martelo quebre o cristal.
A mais forte reação política do Governo Dilma em defesa de sua sobrevivência foi a nomeação de Lula como seu ministro da Casa Civil.
E esta reação – ao contrário dos atropelos e da correria da Câmara – foi impedida pelo Supremo Tribunal Federal. A corte agiu como quem amarra uma das mão de um lutador e espera que, enquanto decide se é justo fazê-lo, pela possibilidade que aquela mão possa desferir um golpe baixo e, enquanto o faz, permite que seu adversário bata, bata e bata.
Sábado, véspera da sessão do Coliseu onde a legalidade democrática será jogada aos leões, enquanto Michel Temer e Eduardo Cunha viram para baixo seus polegares, a nomeação de Lula completa um mês.
E segue impedida. Só no preguiçoso dia 20 vai se analisar se ela é ou não legal, embora tudo o que tenha levado à suspensão da posse já se tenha julgado injurídico e que a alegada fuga à Justiça em que se funda a acusação seja, justamente, colocá-lo sob o julgamento daquela Corte, que se confessaria, assim, leniente e parcial a favor do ex-presidente.
Ou seja, o Supremo julgará se Dilma pode nomear seu ministro só quando, talvez, já nem haja um Governo, quanto mais ministros.
Pode-se argumentar que é assim, pela recente jurisprudência do STF, que proibiu o Habeas Corpus contra decisão, mesmo singular, de qualquer de seus ministros. Numa frase: aquilo que os juristas chamam de “remédio heroico” contra o abuso de autoridade vale para qualquer delas, menos para os ministros do Supremo. Se um deles tornar-se atrabiliário ou, simplesmente, aloprar, ainda assim as consequências continuarão, até que se cumpra o lento rito de pareceres, vistas e, finalmente, o seu exame pelo plenário, que, em tese, restaure a sabedoria e o equilíbrio colegiados.
Não há trocadilho: o “paciente” – termo jurídico daquele que busca o habeas corpus – será examinado apenas quando estiver morto.
No homem comum a procrastinação pode vir de um perfeccionismo tolo, do desejo de perfeição se sobrepondo à de consciência realista de seu dever.
No exercício da autoridade, é pior. Denota a fraqueza, a auto-escusa de suas responsabilidade e, em última análise, a capa de invisibilidade do matreiro traidor.
O silêncio dos bons, expressão histórica de Martin Luther King, os converte em maus.
Mas, no Brasil dos canalhas, onde se celebra o traidor e a traição, o golpe e os golpistas, o abuso e o abusador, tudo pode ser pior.
O Supremo julga hoje um Mandado de Segurança contra decisão da Câmara de emendar a Constituição para estabelecer o parlamentarismo como forma de governo. Ou seja, a abolição das eleições diretas para a eleição de um Presidente que governe, restando apenas para um cargo decorativo.
Aquilo que por duas vezes – e mil, se necessário, faria – o povo brasileiro recusou em plebiscito.
Não é preciso muito para avaliar as consequências disso, basta abrir os olhos e ver o que se passa no parlamento.
É tão absurda e abjeta esta ideia que não se pode dizer que vá passar pelo julgamento de hoje.
Mas quando o absurdo e a abjeção já se tornaram cena comum e o Supremo se apequena ao ponto de deixar que os crimes se consumem e lave as mãos como Pilatos, o que dizer?
Mas, embora aqueles senhores e senhoras - quase todos conduzidos aos postos que ocupam pelo governo que agora deixam morrer sob o argumento que este escolhe Lula, como os escolheu, com “desvio de finalidade” (seriam também eles oito “desvios”?) – possam acovardar-se (dói, não é, Ministros?), os brasileiros não são covardes.
Seremos leões, não ratos como os que se atiram ao queijo.
As ruas vão rugir em advertência.
Não queremos a tragédia, mas não viveremos na indignidade.
_________________________________
PITACO DO ContrapontoPIG
Com maestria e firmeza Fernando Brito exprimiu a indignação imensa que pesa no peito de todos os brasileiros dignos no momento atual.
- Indignação de ver a Câmara dos Deputados presidida por um indivíduo com uma carga de crimes incomum - mesmo entre os políticos mais corruptos de toda a historia do país - julgando o impeachment de uma presidenta honrada que notoriamente não cometeu nenhum crime de responsabilidade;
- Indignação de ver - até agora - a apatia covarde da corte suprema do país diante do espetáculo bizarro do pisoteamento da Constituição sendo vilipendiada na cara de todos os brasileiros sérios e conscientes;
- indignação de ver o poder descomunal de uma mídia corrupta, golpista, entreguista, manipuladora e terrorista, fazendo impunemente a cabeça de milhões de incautos em todos os recantos do território nacional;
- indignação de ver no horizonte a possibilidade uma convulsão social de consequências inimagináveis para todo o povo brasileiro sem que nada venha a ser feito por quem poderia fazê-lo na hora oportuna.
Como escreveu Fernando Brito: "As ruas vão rugir em advertência".
As mesmas ruas das quais os covardes de hoje poderão, num futuro próximo, ter medo de percorrer.
Postado no Tijolaço e no Contraponto em 13/04/2016
Gonzaguinha e a nação que a gente quer viver
A atualíssima É, com o nosso querer pela liberdade, contra o golpe, a explodir em nossos corações, com o grito de alerta para não começar tudo outra vez – “não Vai ter golpe” – ecoando por esta imensa avenida Brasil e pelo mundo.
A nossa homenagem ao grande Gonzaguinha, que de onde estiver está cantando pela liberdade que sempre cantou.
Postado no Luis Nassif Online em 12/04/2016
Lula vence a Globo e o fascismo
Manifestação contra o impeachment/golpe - Arcos da Lapa - Rio de Janeiro - Noite de 11/04/2016
Lula e Chico Buarque participaram de ato contra o impeachment/golpe na Fundição Progresso - Lapa - Rio de Janeiro
O ex-presidente Lula participou de manifestação contra o impeachment/golpe. Ele e artistas foram à Fundição Progresso e depois aos Arcos da Lapa
A força do Lula vem do povo, da enorme capacidade do povo brasileiro resistir. Lula é o povo, é parte inseparável da história da nação brasileira.
Jeferson Miola
Já tentaram de tudo para destruir o Lula, e não vão abandonar a obsessão de aniquilá-lo. O justiceiro Sérgio Moto idealizou um show deplorável com a prisão dele no dia 4 de março mas, temendo as conseqüências, foi obrigado a recuar. Depois, num ato de desespero persecutório, cometeu haraquiri funcional e divulgou criminosamente grampos telefônicos ilegais da Presidente Dilma para impedir a posse dele na Casa Civil.
O haraquiri do Moro não foi em vão. Gilmar Mendes e Rodrigo Janot anularam a posse do Lula, numa decisão que equivale à cassação dos seus direitos políticos. Assim, impediram Lula de fazer o que faz com maestria, que é governar e bem o país para recuperar a condução do projeto de desenvolvimento com igualdade que ele inaugurou em 2003.
Como não tinham motivos para acusá-lo e, menos ainda, para incriminá-lo, então decidiram fabricar uma investigação contra ele – sabe-se agora que Lula passou a ser investigado na Lava-Jato. Lula é investigado mesmo que contra ele não existam provas; mesmo que ele não tenha contas secretas na Suíça, em Leichenstein e no Panamá; mesmo que ele não tenha participado de falcatruas em FURNAS, no BNDES, na Petrobrás, no CARF; mesmo que ele não possua apartamentos suntuosos comprados de maneira suspeita em Paris, Miami e outras praças; mesmo que ele não tenha mansão paga por offshoreem Paraty; mesmo que contra ele não pesem acusações de mesadas a amantes pagas por empresas; mesmo que contra ele não existam acusações de pagamentos milionários de propinas; mesmo que, enfim, não exista um único fundamento legal para investigá-lo.
Em qualquer país do mundo, qualquer partido político submetido durante 10 anos a um processo de aviltamento como o padecido pelo PT, há muito tempo teria sucumbido, há muito tempo teria sumido do mapa.
A mídia brasileira – com o papel central da Rede Globo – parece ter descoberto que todos os males do Brasil e do povo brasileiro são causados pelo PT. E inferiu, com isso, que é imperioso acabar com o PT. Um dos líderes do governo FHC, Jorge Bornhausen, em 2005 sintetizou o plano: “se ver livre dessa raça petista pelos próximos 30 anos”.
Em qualquer parte do planeta, qualquer líder caçado, vilipendiado e desrespeitado em 100% do tempo do noticiário como fazem com Lula, não sobreviveria e estaria completamente arruinado; teria sua imagem irremediavelmente destruída.
Lula e o PT sobrevivem e resistem, apesar da persistente campanha fascista de ódio e intolerância semeados na sociedade brasileira.
Lula não só sobrevive e resiste a esses ataques terríveis, como também preserva enormes chances eleitorais: nas pesquisas divulgadas pelo Datafolha, ele derrota o PSDB, o PMDB, a Globo, a Folha, o Estadão, a RBS, a Veja, a IstoÉ e todo o conglomerado golpista.
A força do Lula vem da obra generosa que ele realizou no Brasil assegurando direitos e dignidade aos pobres, aos negros, às mulheres, aos camponeses, aos trabalhadores, às juventudes, enfim, àquela maioria do povo brasileiro que durante séculos foi condenada à humilhação e à subjugação.
A força do Lula vem do povo, da enorme capacidade do povo brasileiro resistir e lutar pela democracia e pela igualdade. Lula é o povo, é parte inseparável da história da nação brasileira moderna, porque ele foi o condutor da transformação do Brasil num país para 200 milhões de brasileiras e brasileiros, e não apenas para o 3% branco, rico e sulista, como fez a classe dominante durante 500 anos.
A vitalidade e a têmpera do Lula vêm da impressionante capacidade de resistência do povo brasileiro; vêm da avalanche democrática e popular que comove o país com as aulas públicas de legalidade, de consciência política, de democracia, de pluralidade e diversidade; das aulas que encharcam as ruas do país com tolerância, amor, alegria, esperança.
Sem esta formidável resistência popular e sem esta impressionante avalanche de sustentação política e moral, a Globo e os fascistas há muito tempo teriam conseguido esmagar Lula. Não conseguiram e, com toda certeza, não conseguirão.
Postado no Carta Maior em 12/04/2016
Labels:
golpe de estado,
golpe midiático,
impeachment,
judiciário,
juízes,
Lula,
manipulação,
mídia,
protesto,
tv X
Que culpa a gente tem de ser feliz?
Há quem ache a vida uma grande tragédia, quem prefira ver o lado negativo das coisas sempre, quem acredite que tudo está cada vez pior.
Há gente que perde horas do seu dia correndo atrás de notícia ruim e esperando o próximo desastre acontecer para derramar lágrimas apressadas e toda aquela enxurrada desesperançosa.
Existe uma grande tendência no mundo de tornar tragédia em espetáculo.
Estamos cercados por todos os lados. Com isso, muitas pessoas, principalmente, aquelas mais sensíveis ao medo, mergulham de cabeça no pessimismo e transformam o viver num eterno desespero.
Mas, muitas vezes, quando resolvemos ser felizes é que notamos essa realidade. Digo resolver ser feliz porque é isso mesmo. É uma questão de escolha.
Não é que você ignore todos o problemas do planeta e não enxergue a realidade como ela é.
Talvez você se importe até mais que muita gente que vive reclamando. Até por que a energia que elas despendem nas lamúrias impede qualquer outra ação.
Diferente disso, você ainda tem olhos para o que acontece de bom ao seu redor.
As pessoas que foram capazes de mudar a história da humanidade, como Mahatma Gandhi, eram extremamente conscientes de todas as injustiças e mazelas sociais, lutaram contra isso e realizaram grandes feitos. Mas, curiosamente, essas mesmas pessoas pregavam a felicidade e o amor como caminho.
Como o título já diz, numa alusão à famosa música do Skank. “Que culpa a gente tem de ser feliz?”.
Já me adianto a responder: nenhuma. Toda vez que você se sentir culpado por ser uma pessoa positiva, por acreditar nas pessoas e nas verdadeiras mudanças, lembre-se de que os maiores exemplos da humanidade não perdiam tempo se queixando, eles viviam com plenitude e isso só engrandecia suas ações.
Se você gosta da vida, das pessoas e sente gratidão pelo que tem, não deixe a amargura dos que sofrem e dos querem fazer sofrer transformar essa dádiva em culpa. Até por que ninguém viverá por você, ninguém ficará doente no seu lugar, ninguém curará suas feridas, resumindo, ninguém poderá carregar sua cruz.
Portanto, sua vida, suas escolhas.
Seja feliz, sim. Ame, sim. O amor inspira e é contagioso.
Seja ele e traga pessoas para o seu lado. Não vá para o lado de lá.
Postado no O Segredo
Agora não será Como Nossos Pais !
Extraindo significados : Como Nossos Pais - Belchior / Elis Regina
Por Djane Assunção do Obstracionando Pensamentos em 02/03/2015
Como nossos pais é uma composição de 1976, escrita pelo grande artista Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, ou simplesmente Belchior. Foi lançado no álbum Alucinação, do mesmo ano de sua composição. Ficou bem conhecida pela interpretação da grande cantora de voz marcante Elis Regina Carvalho Costa, ou simplesmente Elis Regina. Que no mesmo ano de 1976 regravou a música em seu álbum Falso Brilhante.
A canção é de extrema sapiência, com uma riqueza de informações muito grande. Em poucas palavras, eu diria que a letra fala das desilusões que um indivíduo tem acerca do sistema social e político de sua época. Descreve traços da ditadura militar brasileira, a indignação diante a opressão exercida pelas forças do Estado. E junto a todo esse contexto histórico, a canção retrata a paixão pelo direito de viver, pelo amor e pelas amizades, características do convívio familiar e a expectativa de um futuro melhor.
Obs. 01: Existem diversas interpretações na internet sobre essa música, no entanto, através de um pedido de uma pessoa muito especial, eu fiz a minha versão. Na verdade a grande diferença da minha análise em relação às várias que existem na web, é o fato de aqui eu analisar verso por verso, ao invés de apenas uma visão geral. Outra coisa que destaco é que a análise foi baseada no tempo histórico do eu lírico.
Não quero lhe falar, meu grande amor, das coisas que aprendi nos discos. Quero lhe contar como eu vivi, e tudo o que aconteceu comigo
Bom, em primeiro lugar vemos que o eu lírico está em um diálogo com outro alguém, uma pessoa que ele deve ter grande apreço, pois a chama de meu grande amor. Em relação ao contexto completo dos versos, eu diria mais precisamente que seria um diálogo entre pai e filha. O pai pretende relatar sua experiência de vida, falar da realidade do Brasil que ele viveu e da dura realidade da sociedade atual que eles vivem. Dessa vez ele não contará dos amores descritos nas canções ou de alguma história bela relatada em um bom álbum musical.
Viver é melhor que sonhar. Eu sei que o amor é uma coisa boa, mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa
Sonhar é uma coisa ótima! Mantêm o desejo por algo aceso e o indivíduo motivado a seguir sua vida em busca da realização dos seus sonhos. No entanto, viver é ainda mais importante do que sonhar. De nada adianta ter sonhos se você não lutar por eles, não viver intensamente cada dia de sua vida em busca da sua conquista.
O eu lírico (vamos tratar ele apenas como “o Pai” daqui pra frente) diz que falar de amor é algo sadio, porém, é preciso falar do ódio, da dor, dos mais diversos sentimentos da alma humana. Qualquer canção de amor, qualquer letra de música se torna menor quando se trata de falar da vida real de alguém. Em outras palavras, qualquer ficção é menor que a realidade de uma pessoa, seja quem ela for, ou como ela vive.
Por isso cuidado meu bem, há perigo na esquina
Obs. 02: Podemos definir a Ditadura Militar como sendo o período da política brasileira em que os militares governaram o Brasil. Esta época vai de 1964 a 1985. Caracterizou-se pela falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram contra o regime militar.
Nessa parte da canção o pai aspira uma preocupação, uma inquietação paternal, logo, algumas das ruas brasileiras eram campos de guerrilha urbana, cada esquina podia ser um lugar de luta por liberdade de expressão, direitos e reafirmação de valores, lutas que eram encabeçadas principalmente por jovens.
Obs. 03: Curiosidade - No ano de 1969 durante o governo da junta militar que substituiu o presidente Costa e Silva, em Contagem (MG) e Osasco (SP), greves de operários paralisam fábricas em protesto ao regime militar. A guerrilha urbana começa a se organizar. Formada por jovens idealistas de esquerda, assaltam bancos e sequestram embaixadores para obterem fundos para o movimento de oposição armada.
Obs. 04: Dentre os grupos de guerrilha urbana se destacou a ALN - Aliança Libertadora Nacional - liderada por um cara que eu não poderia deixar de falar, cuja para mim é o maior símbolo de luta no Brasil. Como diz os Racionais Mc’s em sua canção Mil Faces de Um Homem Leal: “revolução no Brasil tem um nome”: Carlos Marighella (Clique no Link e assista ao documentário/filme sobre ele, é de arrepiar).
Eles venceram e o sinal está fechado pra nós que somos jovens
Nessa parte, o pai quer deixar claro o sentimento de desilusão para com o sistema de governo. Repressão aos jovens, promessas de um país do futuro não cumpridas, censura, aflição e medo.
Obs. 05: Podemos representar esse verso da canção o comparando com o ato histórico do regime militar denominado de Ato Institucional Número 5 (AI-5). Baixado em 13 de dezembro de 1968, foi a expressão mais acabada da ditadura militar. Vigorou até dezembro de 1978 e produziu um elenco de ações arbitrárias de efeitos duradouros. Definiu o momento mais duro do regime, dando poder de exceção aos governantes para punir arbitrariamente os que fossem inimigos do regime ou como tal considerados.
Para abraçar meu irmão e beijar minha menina na rua, é que se fez o meu braço, o meu lábio e a minha voz
Aqui o pai se refere à ausência de liberdade imposta pelo regime. O braço foi feito para abraçar, a voz feita pra ser falada, a boca para ser beijada. Em síntese ele quer dizer que não se podem realizar ações básicas de expressão em público sem que o indivíduo seja observado, reprimido ou em casos mais severos, perseguido e torturado.
Você me pergunta, pela minha paixão, digo que estou encantado como uma nova invenção. Eu vou ficar nesta cidade, não vou voltar pro sertão. Pois vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação. Eu sei de tudo na ferida viva do meu coração
A música fala também das perspectivas dos cidadãos que saiam do interior (sertão) para os grandes centros urbanos em busca de uma melhor qualidade de vida. A letra também traz um tom positivista em meio ao caos, isso é explícito na frase “Pois vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação”. O pai deixa claro que ele sempre terá esperança que tudo mude, que dias melhores um dia irão vir. Depois de ter sofrido, e ainda sofrer com tempos difíceis, ele sabe muito bem como é ter que lutar, a ferida em seu coração faz alusão às lembranças de sua juventude, da época de luta, de sua história de vida e de tudo aquilo que ele já passou.
Obs. 06: em uma análise aí da web que li, vi algo sobre essa parte e como compartilho da mesma opinião, citarei a respeito. A partir do governo do general e presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) houve uma intensificação do êxodo rural, isto é, a saída do homem do campo para as grandes cidades. Esse fenômeno pode ser explicado pela miséria em que o campo se encontrava devido aos meios de produção antiquados ou pelo desemprego no campo devido à automação da produção rural.
Obs. 07: “estou encantado como uma nova invenção”.
Acredito que a frase se refere à popularização da televisão (uma nova invenção) no Brasil, no final dos anos 70. Já nesta década, o mundo pode ver o Brasil ser Tri-campeão da copa do Mundo, o fim da guerra do Vietnã, o fim dos Beatles, os desenhos speed racer e pica-pau e se sentir como nunca interligado com o mundo por meio do mais poderoso veículo de comunicação até o momento.
Já faz tempo, eu vi você na rua. Cabelo ao vento, gente jovem reunida. Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais
Nessa parte o pai está fazendo uma comparação da juventude atual que ele está presenciando com os jovens dos primeiros anos de ditadura. Não se vê mais os jovens reunidos, rebelados lutando por seus ideais (como em 1969, por exemplo). A juventude atual (atual na época dele, no momento da canção) está estagnada, pois, apesar de inúmeras lutas pra tornar o país democrático e inovador, eles estão cada vez mais acovardados, presos a atitudes conservadoras. O pai é um homem repleto de lembranças muito dolorosas de um tempo em que muito se lutou por transformações, mas que da maneira que a sociedade está, pouco se conseguiu alcançar.
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais
Mesmo depois de tanto sofrimento e de tanta luta para tornar o Brasil um país diferente, a juventude da época passou a viver conformada com a mesma sociedade autoritária que seus pais foram obrigados a suportar (não só em tempos de ditadura, mas na história geral do país). Tudo continua sendo semelhante à mesma época de imposições e proibições.
Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não. Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém
Perante o medo do enfrentamento, os ídolos não mudaram, aquelas pessoas que deram suas vidas pelos seus ideais de mudança e se eternizaram como símbolo de luta (como o exemplo de Carlos Marighella). O conformismo da atual sociedade trouxe consigo a escassez de novos “heróis”.
Você pode até dizer que eu tô por fora ou então que eu tô inventando. Mas é você que ama o passado e que não vê. É você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem
Aqui é como se o pai falasse pra filha (representada na figura de toda uma juventude da época), que tudo que ele viveu foi real, ele não tá dizendo nada da boca pra fora. Nessa parte ele também retoma o mesmo sentimento de esperança para com a mudança citado anteriormente, a fé em tempos melhores. É como se o pai quisesse demonstrar pra filha o quão é importante que cada indivíduo faça a sua parte. É importante lutar e não desistir, é importante acreditar e não se calar. Se existem coisas para serem feitas, Façamos! Reclamar de tudo sem agir de nada vai adiantar. Não adianta sonhar sem viver!
Hoje eu sei que quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude, tá em casa guardado por Deus contando vil metal
Aqui o pai quer dizer que tudo pelo que ele e sua geração lutaram, ou seja, a família, um futuro melhor para seus filhos, de quase nada realmente adiantou, pois o comportamento de conformismo que era tão criticado nos pais é agora exercido pelos filhos. Tal postura de acomodamento, e imobilidade é representada por "está em casa guardado por Deus".
Os novos ideais da juventude estão cada vez mais alicerçados na tentativa de acúmulo de ganhos materiais. Não se vê mais jovens com a gana de luta, com o idealismo e rebeldia que ficou sendo característico da juventude. Tal premissa é exposta no trecho “contando o vil metal" (expressão estereotipada para dinheiro e riquezas).
Labels:
Como Nossos Pais,
comportamento,
ditadura,
ditadura civil militar,
Elis Regina,
golpe de estado,
golpe midiático,
impeachment,
música,
vídeo
Assinar:
Postagens (Atom)