Os inimigos de Lula e os milhões de Silvas
Jaime Amparo Alves
"Não parece razoável o que estão fazendo com o Lula". A frase do tucano Luís Carlos Bresser-Pereira poderia ser o sinal da tão esperada distensão politica, mas não é por um único motivo: Lula não é adversário, é inimigo.
Ao adversário se estende a mão, reconhece-se a sua dignidade humana e se respeita as regras do jogo. Lula nunca foi aceito. Desde o primeiro dia do primeiro mandato, Lula tem sido submetido a um ataque sistemático.
A Folha de S. Paulo investigou uma tal propensão genética da família Silva ao álcool, a Revista Veja já celebrou o 'câncer do presidente' e o Globo já apresentou Lula como presidiário em suas charges.
Tudo isso sem falar na violência sanitarizada dos telejornais da Globo com seus apresentadores cinicamente consternados com a corrupção no país, enquanto o nome da emissora (agora a RBS) aparece em mais um escândalo fiscal.
Na ausência absoluta de padrões éticos jornalísticos, nos resta perguntar se a raiva irracional de William Waack contra Lula, Hugo Chaves e Cristina Kirchner, por exemplo, não seria o caso de tratamento psiquiátrico.
No fundo no fundo, até os incendiários Aécio Neves e Carlos Sampaio sabem que "não é razoável" como a imprensa trata o ex-presidente Lula.
Mas Lula da Silva foi longe demais em sua loucura política de desafiar o establishment; e olhe que para aqueles de nós frustrados com o PT, Lula fez muitas concessões e perdeu a oportunidade de fazer as mudanças radicais que o Brasil tanto precisa; entre elas a urgente e cara ley dos médios, a reforma agrária, e a justiça tributária.
Inútil chorar o leite derramado aqui porque ele segue derramando. O governo Dilma Rousseff continua implacável no mesmo script, com o agravante de que em sua tecnicidade Dilma nega a politica, se afasta do povo e afasta de vez a esperança na tão sonhada virada de mesa do primeiro governo, do segundo, do terceiro, do quarto.
Ainda que Lula tenha alimentado os seus próprios predadores na esperança inútil de que fazendo concessões estratégicas a elite permitiria um governo popular, ir 'as ruas defendê-lo é um dever de todos aqueles com um mínimo de educação politica e de perspectiva histórica.
A perseguição implacável que sofre é um indicativo das suas virtudes não dos seus defeitos. Lula não é atacado porque fez menos do que o Brasil precisa, mas sim porque ousou arranhar a centenária estrutura hierárquica do país trazendo os pobres para o debate nacional.
A não ser que as forças políticas de esquerda corroborem com o moralismo dirigido do conglomerado policial-midiático segundo o qual o PT é o partido mais corrupto da historia, a perseguição implacável a Lula deveria despertar uma solidariedade política estratégica. A mensagem é clara aqui: se Lula, com suas concessões pragmáticas, se converteu em inimigo mortal, imagine a maquina de guerra que seria montada contra um hipotético governo muito mais 'a esquerda?
Talvez o tratamento editorial da Globo ao presidente venezuelano Hugo Chaves – o sorriso mal disfarçado dos apresentadores da Globo News com a sua morte - nos dê uma milésima dimensão de como seria o terror midiático a um projeto político radical que as forças mais a' esquerda do PT defendem e que o Brasil urgentemente precisa.
Que a imprensa trate Lula como inimigo é explicável e deveria até fazer bem ao ego do ex-presidente. Ter a mídia como inimiga é um termômetro importante.
O que não é razoável é o silencio das esquerdas com a violência politica da qual o ex-presidente é vitima, como se os movimentos sociais e os partidos neste espectro políticos não fossem os próximos da fila. Eles virão por nós!
Não é uma incongruência defender o legado de Lula da Silva e criticar o pragmatismo político que nos trouxe ao momento atual. Tampouco se trata de relativização moral porque o que está em questão aqui não é provar sua inocência. Tarefa inútil.
Há neste momento toda uma estrutura estatal, incrivelmente sob o comando do ministro da Justiça do PT, para encontrar um 'crime' praticado pelo ex-presidente.
Perguntar não ofende: quem de nós sobreviveria a tamanha cruzada policial-midiática? Não me refiro a uma checagem de antecedentes criminais ou a uma varredura em contas no exterior, mas a todo um aparelho policial estatal orientado a encontrar um crime, um arranhão na biografia, um desvio na conduta dos filhos, dos vizinhos, dos amigos.
Não há tempo a perder. Se há alguma lição a se aprender do julgamento do 'mensalão' é que a defesa de Lula da Silva deve acontecer nas ruas e nas mídias sociais porque é perda de tempo lamentar a inimputabilidade tucana sob a plutocracia judiciária.
Juízes, promotores e delegados têm alma, classe social e partido político. Senão, como explicar as aberrações jurídicas com assento na suprema corte e com suas retóricas anti-petistas nos e fora dos autos?
Leigos nos assuntos legais, eu e meu sobrinho de sete anos sabemos que "não é razoável" que um juiz falastrão utilize suas prerrogativas (e o nosso dinheiro!) para militância político-partidária e que seja endossado pelo silencio ensurdecedor dos seus pares.
Mania de perseguição? Nas mãos petistas um cartão corporativo, uma tapioca, uma canoa de lata ou o empréstimo de um sitio em Atibaia têm mais peso policial-midiático do que um apartamento na Avenida Foch, no centro de Paris, um helicóptero com meia tonelada de cocaína, as fraudes do metro paulistano, ou cinco milhões de dólares em bancos suíços.
A tentativa de assassinato da biografia da figura mais marcante da vida política nacional contemporânea tem um outro significado importante. Com o assassinato politico de Lula abre-se caminho para o desmonte da política soberana do pré-sal e para o retrocesso nas conquistas sociais como o Bolsa Família e as cotas raciais nas universidades publicas. É o que está por trás da violência contra Lula da Silva e é o que deveria nos unir em sua defesa.
A história haverá de colocar em seus devidos lugares dois presidentes, em dois brasis e com duas trajetórias distintas.
Um, (o presidente-sociólogo, poliglota, membro da Academia Brasileira de Letras, descendente de imigrantes portugueses, frequentador dos círculos acadêmicos norte-americanos) levou a cabo um criminoso programa de privatizações do patrimônio público e alienação da soberania nacional.
O outro, (o presidente nordestino, metalúrgico, sem formação superior, e sem etiquetas no falar) resgatou a esperança de milhões de brasileiros submetidos à humilhação da fome e da seca.
Nossos netos lerão nos livros de história sobre um presidente semi-analfabeto, que abriu as portas do ensino superior para milhões de jovens condenados por um presidente-sociólogo a repetir os passos dos seus pais envelhecendo fora das universidades.
A história não poderá apagar o nome do presidente nordestino que, não sendo poliglota como o presidente-sociólogo, inseriu o Brasil como país soberano na cena politica mundial.
Talvez quem hoje tenha 20 anos de idade ou nasceu sob o governo do PT não tenha um parâmetro para comparar o que era a vida dos mais pobres a uma década. Eu tenho. Como jovem e membro da Pastoral da Criança, durante os últimos resquícios da teologia da libertação no interior da Bahia, eu conheci de perto a fome, a desnutrição e a morte.
Pesávamos crianças raquíticas, de pais raquíticos, com salários raquíticos. Era morte produzida pelas politicas sociais do presidente sociólogo e sua turma.
Agora eles perseguem a capa do jornal matutino com Lula da Silva algemado. Talvez ganhem a foto, mas perderão o sono.
Somos Lula! #LulaEuConfio
Jaime Amparo Alves é Doutor em Antropologia Social pela Universidade do Texas em Austin e professor de sociologia e antropologia da City University of New York (CUNY/CSI)
Postado no Brasil 247 em 09/02/2016
Felicidade e a arte do bem-viver
Dalai Lama dá 20 dicas para alcançar a felicidade e a arte do bem-viver
Confira a lista das 20 reflexões relacionadas à conquista da felicidade que foram oferecidas ao mundo pelo Dalai Lama.
Vale tomar conhecimento delas, e meditar a respeito.
Redação Pragmatismo
Embora seja possível atingir a felicidade, ela não é uma coisa simples. Existem muitos níveis de felicidade. O budismo, por exemplo, refere-se a quatro fatores de contentamento ou felicidade: os bens materiais, a satisfação mundana, a espiritualidade e a iluminação. O conjunto desses fatores abarca a totalidade da busca pessoal de felicidade.
Deixemos de lado, por ora, as aspirações últimas a nível religioso ou espiritual, como a perfeição e a iluminação, e concentremo-nos unicamente sobre a alegria e a felicidade, tal como as concebemos a nível mundano. A este nível, existem certos elementos-chave que nós reconhecemos convencionalmente como contribuindo para o bem-estar e a felicidade.
A saúde, por exemplo, é considerada como um fator necessário para o bem-estar. Um outro fator são as condições materiais ou os bens que possuímos. Ter amigos e companheiros, é outro. Todos nós concordamos que para termos uma vida feliz precisamos de um círculo de amigos com quem nos possamos relacionar emocionalmente e em quem possamos confiar.
Portanto, todos estes fatores são causas de felicidade. Mas para que um indivíduo possa utilizá-los plenamente e gozar de uma vida feliz e preenchida, a chave é o estado de espírito. É crucial. Se utilizarmos as condições favoráveis que possuímos, tais como a saúde ou a riqueza, com fins positivos, para ajudar os outros, esses fatores contribuem para uma vida mais feliz.
Claro que, pessoalmente, também tiramos partido dessas coisas – facilidades materiais, sucesso, etc -, mas se não tivermos a atitude mental correta, se não cuidarmos do fator mental, essas coisas acabam por ter pouca incidência sobre o sentimento geral de felicidade.
Por exemplo, se guardarmos ódio ou rancor no fundo de nós mesmos, isso acabará por destruir a nossa saúde, destruindo assim um dos fatores. Por outro lado, se nos sentirmos infelizes ou frustrados, o conforto material não chegará para nos compensar. Mas se mantivermos um estado de espírito calmo e sereno, poderemos sentir-nos felizes mesmo se a nossa saúde não for das melhores. Em contrapartida, mesmo se possuirmos objetos raros ou preciosos, podemos querer jogá-los fora ou destruí-los num momento de grande cólera ou ódio. Nesse momento, os bens não significam nada para nós.
Existem atualmente sociedades com um grande grau de desenvolvimento material e no seio das quais muitos indivíduos não se sentem felizes. A nível superficial, essa abundância é muito atraente, mas por trás existe um desassossego mental que leva à frustração, a discórdias desnecessárias, à dependência das drogas ou do álcool e, no pior dos casos, ao suicídio.
Não existe portanto nenhuma garantia de que a riqueza por si só possa trazer-nos a alegria ou a satisfação que procuramos. O mesmo se pode dizer dos amigos. Quando estamos muito zangados, mesmo um amigo muito próximo pode parecer-nos glacial, frio, distante e muito irritante.
Tudo isto indica a enorme influência que o estado de espírito, o fator mental, pode ter na nossa vivência de todos os dias. Portanto, temos de ter esse fator seriamente em linha de conta. Independentemente de uma prática espiritual, mesmo em termos mundanos, a nossa capacidade de desfrutar de uma vida agradável e feliz depende da nossa serenidade mental.
Talvez devesse acrescentar que quando falamos de um estado de espírito calmo ou de paz de espírito não devemos confundir isso com um estado de insensibilidade ou de apatia.
Possuir um estado de espírito calmo não significa estar completamente alheado ou amorfo. A paz de espírito, esse estado de serenidade, tem de estar enraizado na afeição e na compaixão, o que implica um grande nível de sensibilidade e de sentimento.
Enquanto nos faltar a disciplina interior que conduz à serenidade, sejam quais forem as facilidades ou as condições exteriores que nos rodeiam, elas nunca nos trarão esse sentimento de alegria e de felicidade que procuramos.
Por outro lado, se possuirmos as qualidades interiores de serenidade e de estabilidade, mesmo que os fatores exteriores de conforto normalmente considerados como indispensáveis à felicidade não estejam em nossa posse, podemos ter uma vida alegre e feliz.
20 dicas do Dalai Lama para o bem viver
Tenzin Gyatso, o atual Dalai Lama, é o 14º de uma linhagem de líderes religiosos da escola Gelugpa do budismo tibetano.
Ele é, ao mesmo tempo, um monge reconhecido por todas as escolas do budismo tibetano, e o líder político oficial no exílio desde que seu país, o Tibete, foi invadido pela China no ano de 1959.
Dalai significa “oceano” em mongol e “lama” é a palavra tibetana para mestre de sabedoria, ou guru. Por essa razão os tibetanos referem-se a ele como “Oceano de Sabedoria”.
Como todos os seus antecessores, desde o século 14 os dalai lamas são mostrados como sendo a manifestação de Avalokiteshvara (em sânscrito), o Bodhisattva da Compaixão, cujo nome é Chenrezig em tibetano.
Na virada do milênio, o Dalai Lama ofereceu ao mundo uma lista de 20 reflexões, todas elas relacionadas à conquista da felicidade.
Vale a pena tomar conhecimento delas, e meditar a respeito. Aqui estão:
1 – Leve em consideração que grandes amores e grandes realizações envolvem grandes riscos.
2 – Quando você perder, não deixe de tirar uma lição da experiência.
3 – Siga os três Rs : respeito por si próprio, respeito pelos outros, responsabilidade por todas as suas ações.
4 – Lembre-se que não conseguir o que você quer é algumas vezes um lance de sorte.
5 – Aprenda as regras para que você saiba como infringi-las corretamente.
6 – Não deixe uma pequena disputa ferir uma grande amizade.
7 – Quando você perceber que cometeu um erro, tome providências imediatas para corrigi-lo.
8 – Passe algum tempo sozinho todos os dias.
9 – Abra seus braços para mudanças, mas não abra mão de seus valores.
10 – Lembre-se que o silêncio às vezes é a melhor resposta.
11 – Viva uma vida honrada. Então, quando você ficar mais velho e pensar no passado, você vai ser capaz de apreciá-lo uma segunda vez.
12 – Uma atmosfera de amor em sua casa é o fundamento para sua vida.
13 – Em discordâncias com entes queridos, trate apenas da situação atual. Não fale do passado.
14 – Compartilhe o seu conhecimento. É uma maneira de alcançar a imortalidade.
15 – Seja gentil com a Terra.
16 – Uma vez por ano, vá a algum lugar onde nunca esteve antes.
17 – Lembre-se que o melhor relacionamento é aquele em que o amor um pelo outro excede a sua necessidade pelo outro.
18 – Julgue seu sucesso pelo que você teve que renunciar para consegui-lo.
19 – Aproxime-se do amor e cultive-o despreocupadamente.
20 – Se você quer ver a si mesmo e o outro feliz, pratique a compaixão.
Postado no Pragmatismo Político em 07/02/2016
Já escolheu o estilo para este Verão 2016 ? Birken, Rasteira, Espadrille, ou Sapatilha
A Birken se encaixa no estilo Normcore. Este estilo prioriza o conforto, por isto pode ser combinada com tudo que te deixe confortável: short, saias, vestidos e calça jeans.
Rasteira, um calçado confortável e prático. Elas combinam com todas as peças do guarda roupa.
Usando uma Espadrille, você não estará esportiva demais e nem despojada demais. São feitas com rafia, palha ou cordas tranças no salto. Podem ser sem salto, com salto estilo anabela, abertas, trançadas na perna ou com fivela.
Cada dia mais as Sapatilhas vêm inovando com novos modelos.
O desafio de conversar com um fascista
Rubens Casara
Em Adorno, a ignorância, a ausência de reflexão, a identificação de inimigos imaginários, a transformação dos acusadores em julgadores (e vice-versa) e a manipulação do discurso religioso são, dentre outros sintomas, apontados como típicos do pensamento autoritário.
Pensem, agora, na naturalização com que direitos fundamentais são afastados e violados no Brasil, na crença no uso da força (e do sistema penal) para resolver os mais variados problemas sociais, na demonização de um partido político (que, apesar de vários erros, e ao contrário de outros partidos apontados como “democráticos”, não aderiu aos projetos a seguir descritos), no prestígio novamente atribuído aos “juízes-inquisidores”, nos recentes linchamentos (inclusive virtuais), no número tanto de pessoas mortas por ação da polícia quanto de policiais mortos e nos projetos legislativos que:
a) relativizam a presunção de inocência;
b) ampliam as hipóteses de “prisão em flagrante” em evidente violação aos limites semânticos da palavra “flagrante” inscrita no texto Constitucional como limite ao exercício do poder;
c) criminalizam os movimentos sociais com a desculpa de prevenir “atos de terrorismo”;
d) impedem o fornecimento de “pílulas do dia seguinte” para profilaxia de gravidez decorrente de violência sexual e criminalizam médicos que dão informações para mulheres vítimas de violência sexual;
e) eliminam o princípio constitucional da gratuidade na educação pública, dentre outras aberrações jurídicas.
Conclusão? Avança-se na escala do fascismo.
O fascismo recebeu seu nome na Itália, mas Mussolini nunca esteve sozinho. Diversos movimentos semelhantes surgiram no pós-guerra com a mesma receita que unia voluntarismo, pouca reflexão e violência contra seus inimigos.
Hoje, parece que há consenso de que existe(m) fascismo(s) para além do fenômeno italiano ou, ainda, que o fascismo é um amálgama de significantes, um “patrimônio” de teorias, valores, princípios, estratégias e práticas à disposição dos governantes ou de lideranças de ocasião (que podem, por exemplo, ser fabricadas pelos detentores do poder político ou econômico, em especial através dos meios de comunicação de massa), que disseminam o ódio contra o que existe para conquistar o poder e/ou impor suas concepções de mundo.
O fascismo possui inegavelmente uma ideologia: uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classes, etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência de saber.
Os fascistas, como já foi dito, talvez não saibam o que querem, mas sabem bem o que não suportam. Não suportam a democracia, entendida como concretização dos direitos fundamentais de todos, como processo de educação para a liberdade e de limites ao exercício do poder.
Essa mistura de pouca reflexão (o fascismo, nesse particular, aproxima-se dos fundamentalismos, ambos marcados pela ode à ignorância) e recurso à força (como resposta preferencial para os mais variados problemas sociais) produz reflexos em toda a sociedade.
As práticas fascistas revelam uma desconfiança. O fascista desconfia do conhecimento, tem ódio de quem demonstra saber algo que afronte ou se revele capaz de abalar suas crenças.
Ignorância e confusão pautam sua postura na sociedade. O recurso a crenças irracionais ou anti-racionais, a criação de inimigos imaginários (a transformação do “diferente” em inimigo), a confusão entre acusação e julgamento (o acusador – aquele indivíduo que aponta o dedo e atribui responsabilidade – que se transforma em juiz e o juiz que se torna acusador – o inquisidor pós-moderno) são sintomas do fascismo que poderiam ser superados se o sujeito estivesse aberto ao saber, ao diálogo que revela diversos saberes.
Diante dos riscos do fascismo, o desafio é confrontar o fascista com aquilo que para ele é insuportável: o outro. O instrumento? O diálogo, na melhor tradição filosófica atribuída a Sócrates.
Talvez esse seja o objetivo do diálogo proposto pela filósofa Marcia Tiburi em seu novo livro, que tive o prazer de apresentar (o prefácio é do sempre excelente Jean Wyllys).
Em “Como conversar com um fascista: reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro” (Rio de janeiro: Record, 2015), a autora resgata a política como experiência de linguagem, sempre presente na vida em comum, e investe nessa operação, que exige o encontro entre o “eu” e o “tu”, apresentada como fundamental à construção democrática.
De fato, a qualidade e a própria existência da forma democrática dependem da abertura ao diálogo, da construção de diálogos genuínos – que não se confundem com monólogos travestidos de diálogos – em que a individualidade e os interesses de cada pessoa não inviabilizam a construção de um projeto comum, de uma comunidade fundada na reciprocidade e no respeito à alteridade.
Ao tratar da personalidade autoritária, dos micro-fascismos do dia-a-dia, do consumismo da linguagem, da transformação de pessoas em objetos, da plastificação das relações, da idiotização de parcela da população, dentre outros fenômenos perceptíveis na sociedade brasileira, Marcia Tiburi sugere uma mudança de atitude do um-para-com-o-outro.
Nos diversos ensaios deste livro, a autora conduz o leitor para um processo de reflexão e descoberta dos valores democráticos, bem como desvela as contradições, os preconceitos e as práticas que caracterizam os movimentos autoritários em plena democracia formal.
Mas, não é só.
Ao propor que a experiência dialógica alcance também os fascistas, aqueles que se recusam a perceber e aceitar o outro em sua totalidade, Marcia Tiburi exerce a arte de resistir.
Dialogar com um fascista, e sobre o fascismo, forçar uma relação com um sujeito incapaz de suportar a diferença inerente ao diálogo, é um ato de resistência. Confrontar o fascista, desvelar sua ignorância, fornecer informação/conhecimento, levar esse interlocutor à contradição, desconstruindo suas certezas, forçando-o a admitir que seu conhecimento é limitado, fazem parte do empreendimento ético-político da autora, que faz neste livro uma aposta na potência do diálogo e na difusão do conhecimento como antídoto à tradição autoritária que condiciona o pensamento e a ação em terra brasilis.
O leitor, ao final, perceberá que não só o objetivo foi alcançado como também que a autora nos brindou com um texto delicioso, original, profundo sem ser pretensioso. Mais do que recomendada a leitura.
Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano.
O fascismo possui inegavelmente uma ideologia: uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classes, etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência de saber.
Os fascistas, como já foi dito, talvez não saibam o que querem, mas sabem bem o que não suportam. Não suportam a democracia, entendida como concretização dos direitos fundamentais de todos, como processo de educação para a liberdade e de limites ao exercício do poder.
Essa mistura de pouca reflexão (o fascismo, nesse particular, aproxima-se dos fundamentalismos, ambos marcados pela ode à ignorância) e recurso à força (como resposta preferencial para os mais variados problemas sociais) produz reflexos em toda a sociedade.
As práticas fascistas revelam uma desconfiança. O fascista desconfia do conhecimento, tem ódio de quem demonstra saber algo que afronte ou se revele capaz de abalar suas crenças.
Ignorância e confusão pautam sua postura na sociedade. O recurso a crenças irracionais ou anti-racionais, a criação de inimigos imaginários (a transformação do “diferente” em inimigo), a confusão entre acusação e julgamento (o acusador – aquele indivíduo que aponta o dedo e atribui responsabilidade – que se transforma em juiz e o juiz que se torna acusador – o inquisidor pós-moderno) são sintomas do fascismo que poderiam ser superados se o sujeito estivesse aberto ao saber, ao diálogo que revela diversos saberes.
Diante dos riscos do fascismo, o desafio é confrontar o fascista com aquilo que para ele é insuportável: o outro. O instrumento? O diálogo, na melhor tradição filosófica atribuída a Sócrates.
Talvez esse seja o objetivo do diálogo proposto pela filósofa Marcia Tiburi em seu novo livro, que tive o prazer de apresentar (o prefácio é do sempre excelente Jean Wyllys).
Em “Como conversar com um fascista: reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro” (Rio de janeiro: Record, 2015), a autora resgata a política como experiência de linguagem, sempre presente na vida em comum, e investe nessa operação, que exige o encontro entre o “eu” e o “tu”, apresentada como fundamental à construção democrática.
De fato, a qualidade e a própria existência da forma democrática dependem da abertura ao diálogo, da construção de diálogos genuínos – que não se confundem com monólogos travestidos de diálogos – em que a individualidade e os interesses de cada pessoa não inviabilizam a construção de um projeto comum, de uma comunidade fundada na reciprocidade e no respeito à alteridade.
Ao tratar da personalidade autoritária, dos micro-fascismos do dia-a-dia, do consumismo da linguagem, da transformação de pessoas em objetos, da plastificação das relações, da idiotização de parcela da população, dentre outros fenômenos perceptíveis na sociedade brasileira, Marcia Tiburi sugere uma mudança de atitude do um-para-com-o-outro.
Nos diversos ensaios deste livro, a autora conduz o leitor para um processo de reflexão e descoberta dos valores democráticos, bem como desvela as contradições, os preconceitos e as práticas que caracterizam os movimentos autoritários em plena democracia formal.
Mas, não é só.
Ao propor que a experiência dialógica alcance também os fascistas, aqueles que se recusam a perceber e aceitar o outro em sua totalidade, Marcia Tiburi exerce a arte de resistir.
Dialogar com um fascista, e sobre o fascismo, forçar uma relação com um sujeito incapaz de suportar a diferença inerente ao diálogo, é um ato de resistência. Confrontar o fascista, desvelar sua ignorância, fornecer informação/conhecimento, levar esse interlocutor à contradição, desconstruindo suas certezas, forçando-o a admitir que seu conhecimento é limitado, fazem parte do empreendimento ético-político da autora, que faz neste livro uma aposta na potência do diálogo e na difusão do conhecimento como antídoto à tradição autoritária que condiciona o pensamento e a ação em terra brasilis.
O leitor, ao final, perceberá que não só o objetivo foi alcançado como também que a autora nos brindou com um texto delicioso, original, profundo sem ser pretensioso. Mais do que recomendada a leitura.
Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes, aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano.
Postado no Pragmatismo Político em 05/02/2016
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