Thomas Piketty no Roda Viva conheceu a arrogância de André Lara Resende



No Roda Viva com Thomas Piketty, entrevistadores perderam oportunidade única de aprofundar questões relevantes e preferiram insistir em polêmicas rasteiras. 

As grosserias de André Lara Resende foram rebatidas com elegância pelo economista francês.











Revista Fórum

O economista francês Thomas Piketty, autor de “O Capital do Século XXI”, foi o entrevistado do programa Roda Viva, desta semana [íntegra acima]. Na ocasião, Piketty falou de suas teses, entre elas a defesa da taxação de grandes fortunas. Para ele, as classes mais baixas devem pagar menos impostos e quantias recebidas por meio de heranças, por exemplo, devem ser muito mais taxadas.

Nas redes, porém, a atuação do também economista André Lara Resende, que estava na bancada do programa, foi bastante comentada.

“Eu nunca tinha visto o André Lara Resende – só conhecia o respeito que se tinha por ele em certos círculos de economistas neoclássicos.
Na entrevista com o Piketty, no entanto, ele se mostrou um liberal arrogante, dogmático e muito pouco razoável. Não é por ser liberal – ele foi grosseiro e muito pouco sofisticado para alguém com a sua reputação”, disse Pablo Ortellado, professor doutor de Gestão de Políticas Públicas e orientador no programa de pós-graduação em Estudos Culturais da Universidade de São Paulo.
O também professor da USP Wagner Iglecias concordou: “Portou-se como se fosse ele o entrevistado, de tanto que falou. Perguntas longuíssimas, o que configura um desrespeito ao entrevistado”.
Já o internauta Sidney Martucci observou que “talvez a nota dissonante da entrevista tenha sido os apartes do economista André Lara Resende, principalmente em cima da fala do Piketty e sempre em contraponto à tese de que a ínfima parte dos milionários que concentra essa riqueza, não tem nenhuma obrigação social em ser obrigado a pagar uma taxação maior para que a divisão de renda seja mais equitativa. Porém esqueceu-se o André de que são exatamente esses ricos que mais se aproveitam das benesses do Estado, em subsídios, empréstimos via BNDES”.
“Os argumentos do André Lara são muito frágeis e pra falar a verdade ele estava lá muito mais para cutucar o Piketty com sua arrogância liberal”, disse outro internauta, Alexandre Marques.

Resende participou da elaboração do Plano Real, foi ex-presidente do BNDES no governo FHC, e foi demitido na ocasião do escândalo dos grampos da telefonia. 

Foi também sócio de Mendonça de Barros no banco Matrix, onde teria se tornado multimilionário.

Entre seus hobbies está correr de Porsche. No ano passado, participou da campanha de Marina Silva à Presidência da República.


Postado no site Pragmatismo Político em 12/02/2015


Depois do consumismo, o quê?


Uma das linhas de montagem do IPhone. Nelas, 14 trabalhadores suicidaram-se, só em 2010, por não suportarem condições de trabalho física e psiquicamente demolidoras

Uma das linhas de montagem do IPhone. Nelas, 14 trabalhadores suicidaram-se, só em 2010, por não suportarem condições de trabalho física e psiquicamente demolidoras.



George Monbiot | Tradução: Inês Castilho

Uma mulher entra numa grande loja de varejo. Sufocada pelas prateleiras abarrotadas, música melosa, cartazes de ofertas, consumidores indiferentes que perambulam pelos corredores, ela e é levada a gritar – repentinamente e para seu próprio espanto. “Isso é tudo o que existe?” Um funcionário sai de seu posto e vem até ela: “Não, minha senhora. Tem mais coisas em nosso catálogo.” 

Essa é a resposta que recebemos para tudo – a única resposta. Podemos ter perdido nossos vínculos, nossas comunidades e nossa noção de sentido e valor, mas sempre haverá mais dinheiro e objetos com que substituí-los. Agora que a promessa evaporou, o tamanho do vazio torna-se compreensível.

Não que a velha ordem moderna fosse necessariamente melhor: era ruim de modo diferente. Hierarquias de classe e gênero esmagam o espírito humano tão completamente quanto a fragmentação. 

A questão é que o vazio preenchido com lixo poderia ter sido ocupado por uma sociedade melhor, construída sobre apoio mútuo e conectividade, sem a estratificação asfixiante da velha ordem. Mas os movimentos que ajudaram a quebrar o velho mundo foram favorecidos e cooptados pelo consumismo. 

A individuação, resposta necessária à conformidade opressiva, é capturável. Novas hierarquias sociais, construídas em torno de bens que dão status, e consumo compulsivo tomaram o lugar da velha. 

O conflito entre individualismo e igualitarismo, ignorado por aqueles que ajudaram a quebrar as velhas normas e restrições opressivas, não se resolve por si mesmo. 

De modo que nos encontramos perdidos no século 21, vivendo num estado de desagregação social que dificilmente alguém desejou, mas emerge de um mundo que depende do aumento do consumo para evitar o colapso econômico, saturado de publicidade e enquadrado pelo fundamentalismo de mercado. 

Habitamos um planeta que nossos ancestrais achariam impossível imaginar: 7 bilhões de pessoas padecendo de solidão epidêmica. É um mundo feito por nós, mas que não escolhemos. 

Agora, tudo indica que a festa para a qual fomos convidados é restrita aos poucos. Há duas semanas, a Oxfam revelou que o 1% mais rico do planeta possui agora 48% da riqueza mundial; e ano que vem, eles terão mais que o resto do mundo inteiro junto. 

No mesmo dia, uma empresa austríaca divulgou o modelo de seu novo super iate. Construído sobre o casco de um navio petroleiro, medirá 280 metros (918 pés) de comprimento. Terá 11 decks, três helipontos, teatros, salas de concerto e restaurantes, carros elétricos para levar proprietário e hóspedes de um lado para o outro do navio, e uma pista de esqui com quatro andares. 

Em 1949, Aldous Huxley escreveu a George Orwell argumentando que sua própria visão distópica era a mais convincente. “O desejo de poder pode ser tão plenamente satisfeito quando se leva as pessoas a amarem sua servidão quanto se você as flagela e chuta para que obedeçam…” Não creio que estivesse errado. 

O consumismo é contrário ao bem comum. Ele reprime a sensibilidade, embotando nosso interesse por outras pessoas. A liberdade de gastar desloca outras liberdades, assim como comer em posição de lótus possibilita esquecer nossas carências. A maioria das formas pacíficas de protesto são agora proibidas, mas ninguém nos impede de devorar os recursos dos quais dependem as futuras gerações. 

Tudo isso ajuda os oligarcas globais a esgarçar a rede de segurança social, encontrar um jeito de aliviar-se das restrições impostas tanto pela democracia quanto pela tributação e neutralizar ou privatizar o bem comum. 

Assim como a sociedade humana foi despedaçada pelo consumismo e pelo materialismo, empurrando-nos para uma Era da Solidão sem precedentes, os ecossistemas foram destroçados pelas mesmas forças. 

É a mentalidade consumista, elevada à escala global, que agora nos ameaça com um colapso climático, catalisa uma sexta grande extinção de espécies, põe em risco o abastecimento global de água e violenta o solo do qual toda a vida humana depende

Mas eu não acredito que o consentimento à servidão, vislumbrado por Huxley, seja um estado permanente. A estagnação dos salários, a brutalidade das novas condições de emprego, o rompimento do vínculo entre progressão educacional e avanço social, a impossibilidade para muitos jovens de encontrar boa moradia: tudo nos confronta com a pergunta que só poderia ser adiada em condições de crescimento geral da prosperidade – “isso é tudo o que existe”? 

Como sugere o crescimento do Syriza e do Podemos, não é possível construir movimentos políticos que desafiem essas questões se não construirmos também relações sociais. 

Não é suficiente convocar as pessoas a mudar suas políticas: precisamos criar não só identidade com projetos políticos, mas também experiências de apoio mútuo que ofereçam a segurança, a sobrevivência e o respeito que o Estado não mais proverá. 

Em uma série notável de iniciativas que se desdobram além de seus temas usuais, a rede Amigos da Terra começou a explorar as formas como podemos nos reconectar uns com os outros e com o mundo natural. Está, por exemplo, procurando novos modelos para a vida urbana com base na partilha, ao invés do consumo competitivo.

Partilha não apenas de carros, eletrodomésticos e ferramentas, mas também de dinheiro (por meio de cooperativas de crédito e microfinanças) e poder. Isso significa um processo de decisões, liderado pela comunidade, em relação a temas como transporte, planejamento e talvez os níveis de renda, salários mínimos e máximos, os orçamentos municipais e a tributação. 

Tais iniciativas não substituem a ação governamental: sem a articulação do Estado, elas perdem sentido. Mas podem unir pessoas com uma noção comum de propósito, pertencimento e apoio mútuo que os processos centralizados nunca poderão proporcionar. 

Os Amigos da Terra também apoiam a revolução da empatia liderada pelo autor Roman Krznaric, e a educação permanente, que poderia contrapor-se à escolaridade sempre mais restrita, hoje imposta a nossos filhos – uma educação cujo objetivo é preparar as pessoas para empregos que nunca terão, a serviço de uma economia organizada em benefício de outros. 

Nessas ideias e movimentos encontramos os sinais de uma resposta à pergunta inicial. Não, isso não e tudo que existe. Há conexão. Apesar dos melhores esforços daqueles que acreditam não haver algo chamado sociedade, não perdemos nossa capacidade de nos vincular. 


Postado no site Outras Palavras em 09/02/2015






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A modinha do impeachment



Carlos Motta

No país das modinhas, a mais nova é falar em impeachment.

É nas páginas dos jornalões, no parecer do jurista da Opus Dei, na boca do parlamentar oposicionista, nas conversas das madames.

A presidenta da República é Dilma Rousseff, mas podem chamá-la de Geni.

Anos e anos de propaganda mentirosa e criminosa na imprensa deram, finalmente, resultado.

O PT, Dilma e Lula, se tornaram, para milhões de brasileiros, sinônimo de coisa ruim, malfeitor, corrupto, bandido, estuprador, marginal - pensem em tudo o que pior existe na face da Terra e isso será associado a eles.

A lavagem cerebral que se faz nas pessoas é tão intensa que elas perderam completamente a capacidade de raciocinar.

Não conseguem mais estabelecer uma simples relação causa - efeito.

Tal idiotas, repetem, como se fosse uma argumentação, sentenças sem pé nem cabeça, desprovidas da mais elementar verdade factual, povoadas do preconceito mais tenebroso contra minorias, pobres, nordestinos, negros, ateus, "petralhas" - esses seres imundos que substituíram os comunistas como detentores da maldade plena.

Nesse contexto, o impeachment da presidenta virou a panaceia.

Defenestrem Dilma do Palácio do Planalto, coloquem seu partido fora da lei, desmoralizem seu presidente de honra - e o Brasil estará salvo e todos viverão felizes para sempre.

Que filme velho, que roteiro batido, que enormidade de clichês...

E que tristeza que dá ver esse monte de gente ser inteiramente conduzida, como um rebanho de gado, por meia dúzia de espertalhões que não estão nem aí para as desgraças que as suas ações possam acarretar para o futuro da nação.

Vamos ao impeachment, bradam esses entreguistas quinta-colunas, quando, entre si, à sorrelfa, fazem as contas de quanto vão lucrar com a imbecilidade das massas. 

Pobre Brasil, tão novo, tão ingênuo...


Postado no blog Crônicas do Motta em 10/02/2015


Em algum lugar por aí, tem alguém pensando em você com ternura


André J. Gomes

Repare. Em algum lugar, de alguma sorte, alguém está fazendo uma coisa boa por nós. Talvez você nem note. Mas tem alguém compensando nossa truculência, atenuando a dureza do mundo, nivelando a vida por cima. Tem alguém levando à frente a compaixão divina num gesto de bondade simples, à toa. Alguém de coração disposto e mãos ativas. Tem, sim. Em algum lugar por aí, tem alguém pensando em você com ternura.

De repente, vem um sentimento breve de calma. Um silêncio bom entre tanto grito, um remanso imprevisto no corre-corre, estio na tempestade, trégua na guerra. Sensação inesperada e inexplicável de que tudo vai dar certo. Não é nada, não. É só alguém, em algum canto, fazendo algo bonito por nós.

A avó que recorda com grande saudade quando éramos pequenos. Os pais que falam de nós com carinho até aos desconhecidos. Os velhos professores que nos comparam em silêncio a seus alunos de hoje, quase dizendo “ahh… como fulano era bom” ou “no tempo do sicrano era outra coisa”.

O amigo distante que assiste a um filme antigo e nos relembra em dolorida mudez, machucado de lembranças do tempo em que éramos novos e próximos, um sorriso imenso nos olhos de choro. As almas boas que nos bendizem pelas costas. As criaturas justas que nos dão sua palavra e cumprem o que prometem, os cães e os gatos que nos oferecem a barriga em festa. Aquela gente que nos ama sem mais o quê.

Quando alguém nos faz uma coisa bela, o mundo entra nos eixos. Temos todos o direito a receber afagos e o dever de redistribuí-los. De atravessar o mundo partilhando beleza e ofertando decência até chegar enfim aos braços que nos cabem e ao abraço em que cabemos.

A beleza é a matéria-prima de todo ofício honesto. É o que nos resta e o que nos sobra. Às cantoras e aos cantores, às atrizes e aos atores e artistas de todo gênero, alguém no escuro da plateia dispara seu aplauso comovido de fé e alegria sem ser visto, e comprova o quanto é bonito retribuir a quem nos dá seja lá o quê.

Aos operários e aos médicos, guardas noturnos e secretárias, pintores e cozinheiras, juízes e manobristas, marceneiros e esportistas e a toda gente sob o céu há de existir gratidão e conforto antes, durante e depois da lida.

Há de haver beleza em cada “obrigado”, “por favor”, “pois não” e outras gentilezas essenciais esperando quem os diga.

E quem os diz é alguém fazendo algo bonito pela mera volúpia bondosa de nos abrir os braços. Nos pontos de ônibus, no trânsito parado, nas salas de espera ou na solidão do quarto escuro, aguardamos todos quem nos faça uma coisa bela. E assim, na espera, compreendemos enfim nossa responsabilidade de fazer e espalhar beleza, nosso mais poderoso e sublime ofício nessa vida.


Postado no site Bula

Carta aberta ao investidor Mark Mobius


Mark Mobius


Caro Senhor Mobius

Embora o senhor não saiba quem sou, conheço-o há muitos anos, desde que era editor da revista Exame.

O senhor não é exatamente o modelo de homem que admiro, mas sempre respeitei sua capacidade de enxergar oportunidades de investimentos e aproveitá-las para si mesmo e, também, para os investidores que lhe confiam seu dinheiro.

Não foi à toa que mereceu o título de Guru dos Mercados Emergentes e, se lembro, uma ou duas capas da Exame de meus tempos.

A razão desta carta que endereço ao senhor não é pedir conselhos financeiros. É algo mais prosaico.

Gostaria que o senhor trocasse umas palavras com os jornalistas que cobrem economia no Brasil.

Eles estão histéricos, e o senhor com certeza poderia acalmá-los com sua visão fundamentada sobre o Brasil – não a visão de quem mexe apenas com palavras, como os jornalistas, mas de quem arrisca bilhões de dólares em decisões de investimento.

Vi que o senhor falou hoje com jornalistas do Brasil numa passagem pelo país, mas não encontrei na entrevista o nome daqueles a quem me refiro: Míriam Leitão e Carlos Sardenberg, da Globo.

Percebi que o senhor está otimista com o Brasil. Acha que o PIB crescerá pouco em 2015, mas que não se surpreenderá se em 2016 a economia avançar 3% ou 4%.

Vi também que o senhor enxergou um lado positivo no caso Petrobras. Nunca as estatais brasileiras brilharam exatamente por sua governança, o senhor lembrou.

Nem agora e, ao contrário do que alguns tentam fazer os outros acreditarem, nem no passado de FHC.

O senhor também ponderou que corrupção em grandes empresas não é exatamente uma coisa nova na história da humanidade.

Aqui mesmo no Brasil temos o exemplo da Siemens dos retíssimos alemães com suas propinas no metrô de São Paulo. E hoje mesmo um escândalo planetário sacode um banco dos finíssimos britânicos, o HSBC.

Um dos delatores da Petrobras disse que fazia negociatas desde 1996, quando o presidente era FHC.

A diferença é que agora a corrupção na Petrobras está sendo investigada.

Caro senhor Mobius: citei, especificamente, dois jornalistas da área econômica. Mas, se o senhor não se importar, gostaria de acrescentar, para a conversa, alguns outros que cobrem política.

Eles parecem alucinados. Onde o senhor vê oportunidades, eles enxergam o apocalipse. E tentam fazer que os demais brasileiros também enxerguem.

Vou citar alguns aleatoriamente.

Merval. Jabor. Sheherazade. Kamel. Bonner.

Se não for demais, incluiria um músico no grupo. Lobão. E um candidato a comediante: Danilo Gentili.

Ia sugerir que falasse também com alguns políticos. Aécio Neves, por exemplo. FHC, também. Serra não porque é capaz de querer dar lições ao senhor.

Tinha pensado em agregar um ou outro jornalista da Veja, mas pensei melhor e entendi que este é um caso perdido.

Torço para que o senhor, que já ganhou tanto dinheiro com o Brasil e continuará ganhando, atenda este meu pedido.

O que está em jogo é a sanidade nacional. Ou, pelo menos, a sanidade das pessoas – vítimas — alcançadas por um pequeno grupo que parece achar que o Brasil é o pior país do mundo.

Grato pela atenção e boa viagem de volta aos Estados Unidos.

Paulo Nogueira, editor do DCM



Postado no site Diário do Centro do Mundo em 09/02/2015