Emilio Santiago foi enCantar o Céu !


  






















O papa e os filhos de si mesmo




Mauro Santayana

É significativo que o novo papa tenha falado tanto em perdão. 

Essa insistência coloca em dúvida a defesa que dele fazem diante das acusações de que teria colaborado com o regime militar argentino e com o sequestro de filhos dos militantes de esquerda, feitos prisioneiros uns e assassinados outros. 

Essas crianças, das quais roubaram a identidade, foram entregues a casais ligados ao sistema. Esse mesmo crime, com a hipócrita justificativa da caridade, foi também praticado pelos bispos espanhóis da Opus dei, durante o franquismo. Ao não conhecerem sua verdadeira origem, as vítimas dos sequestros se tornam filhos de si mesmos. 

Renegam, e com razão, os que os adotaram, e não têm onde ancorar o seu afeto. 

Qualquer seja a verdade, o papa foi eleito conforme as regras tradicionais, e não há poder na Terra que o destitua. 

As leis canônicas não preveem o impeachment do bispo de Roma. 

Resta esperar que o novo pontífice – título vindo do sincretismo do catolicismo com o paganismo romano – erga realmente uma ponte entre o cristianismo primitivo, que era dos pobres, e o mundo moderno. 

Se isso ocorrer, os seus pecados, se os houve, esmaecerão, e ele cumprirá o seu dever de católico e de cristão. O perdão, ele só poderá obter de sua própria consciência, onde Deus costuma habitar, se nela houver lugar para essa presença.

O mais importante não é o passado do Papa. Depois de Pio XII, Wojtyla e Ratzinger, de nítidos laços com os poderosos deste mundo, o que os verdadeiros cristãos esperam do Papa é que ele seja fiel ao Evangelho e conduza a Igreja ao reencontro com o homem de Nazaré que, em sua vida, martírio e morte, encarnou toda a fragilidade da espécie humana. 

A grande lição de Cristo, que a Igreja nunca assumiu, é a de que a vida só é alegria e paz na solidariedade para com os nossos semelhantes.

Quando dividimos as dores do sofrimento alheio, as nossas próprias dores se aliviam, e o trânsito por este “vale de lágrimas” se faz mais suportável. 

 A Igreja se associou aos poderosos de cada tempo e, como lhe era conveniente, manteve instituições de caridade. 

Como alguns ricos, ela consolou sua consciência com a esmola. Os primeiros a receber o título de santos foram homens poderosos, que compraram a santidade com as sobras de suas riquezas.

Ao escolher o nome de Francisco, e de confirmar que buscava no poverello de Assis a inspiração de seu pontificado, Bergoglio dá um sinal importante de seu propósito, ou de sua astúcia.

Não sabemos se, sendo sincero, ele será capaz de escapar ao acosso conservador e oportunista da Cúria Romana. 

Cabe-lhe, na hipótese da sinceridade – como chefe de uma instituição política – por mais herege pareça o conselho, seguir a orientação de Maquiavel, e agir com maior energia logo no início, a fim de preservar o principado conquistado. 

Isso significa reformar, de alto abaixo, a administração do Vaticano, com a convocação de prelados do mundo inteiro, de forma a conter o apetite de poder do clero italiano, identificado com a história peninsular, construída nas conhecidas intrigas políticas europeias. 

Os grandes líderes se legitimam na ação. Forma-se, até mesmo alimentado de esperança, o consenso de que a Igreja terá que demolir seus alicerces milaneses e retornar às catacumbas romanas, para que possa sobreviver.

Seus pecados repetidos, da simonia à luxúria, não a levaram ao Inferno, ainda que muitos de seus dirigentes tenham lá chegado, na visão profética de Dante. 

É da teologia prática que a contrição absolve os pecadores. 

Se Francisco conduzi-la ao caminho de Damasco, é possível que, como Paulo, ela se desfaça da cegueira voluntária e atenda ao chamado de Cristo. 

É possível, mas pouco provável.


Postado no blog Conversa Afiada em 20/03/2013



Desapegue





Promover uma limpeza em casa, descartando inclusive aqueles com algum valor sentimental, é uma excelente estratégia para renovar energias. Desapegar-se do passado é um caminho para viver o presente com muito mais intensidade

Por Rita Trevisan e Caroline Bastos

No livro Jogue Fora 50 Coisas (editora Ediouro), o autor Gail Blanke dá um recado direto a seus leitores, defendendo a prática do desapego como um caminho para o sucesso nos negócios e no amor. 

Em sua obra, Blanke nos convida a nos desfazermos de pelo menos 50 objetos que temos em casa, no prazo de duas semanas. Com o exercício, ele afirma que é possível tocar a vida com mais eficiência. 

Parece fácil? Pois tente fazer agora uma listinha imaginária de coisas das quais poderia se desligar imediatamente e verá que o desafio não é tão simples assim. 

Pode ter certeza de que, nessa breve viagem para dentro de si, você vai acabar dando de cara com um sentimento que insiste em se esconder dentro da gente: o apego. “Em verdade, não nos apegamos aos objetos em si, mas às emoções ou histórias de vida que eles representam”, explica a psicóloga Rosana Zanella, professora do Instituto Sedes Sapientiae. Uma simples camiseta, por exemplo, pode nos remeter a uma lembrança, a um momento ou a uma pessoa que foi importante em alguma fase da nossa vida. Daí a dificuldade de simplesmente descartá-la. 

“Desde a infância, vamos construindo a nossa personalidade a partir da identificação que temos com outras pessoas, mas também com os objetos. Esses, por sua vez, ajudam na compreensão de quem somos e, por isso mesmo, podemos dizer que todos nós, em maior ou menor grau, somos apegados aos objetos que temos”, garante o psicólogo Felipe Souza. 

O X da questão, no entanto, é que nós mudamos muito ao longo da vida e acumular objetos, em geral, pode significar juntar lembranças que jamais serão revisitadas, tanto quanto roupas e acessórios que nunca mais serão usados. E, nesse sentido, estaremos simplesmente desperdiçando espaço físico e energia. 

Assim sendo, guardar um ou outro objeto que não tem utilidade, mas tem um significado especial em nossa vida, até passa. Mas daí a acumular uma série deles, sem nem se perguntar o porquê, há uma grande distância. 

“O problema maior do apego diz respeito à transitoriedade da vida. Se a pessoa se habitua a ser apegada, terá muitas dificuldades à medida que envelhecer, pois todos os seus objetos pessoais vão envelhecer com ela, tornando-se muitas vezes inúteis, inapropriados, ou até mesmo lixo”, alerta Souza. 

Sob essa perspectiva, fica mais do que justificada a necessidade de botar a casa abaixo de tempos em tempos, avaliando o que precisa ser tirado de circulação e abrindo espaço para o novo.

Da teoria à prática 

Sim, o exercício do desapego deve partir mesmo de uma reflexão, uma espécie de exercício de autoconhecimento.

É preciso olhar tudo aquilo o que viemos acumulando com o tempo, mas também olharmos a nós mesmas, nos perguntando se aquilo ainda nos acrescenta algo ou, se ao contrário, não faz mais a menor diferença na vida que vivemos hoje. 

“Comece aos poucos: vá pegando os seus objetos pessoais, olhe para eles e faça a si mesma alguns questionamentos, como: “Eu preciso disso? Vou usar? Me sinto bem usando ou olhando para isso?” Se as respostas forem sim, guarde. Caso contrário, livre-se deles o mais rápido possível”, ensina Cristiane Cappa, psicoterapeuta transpessoal.

Assim, você pode descobrir que o vaso pintado pela sua avó foi um presente lindo, numa ocasião muito especial, mas que agora ele já não combina com a decoração da sua casa e pode muito bem ser doado, para que outro objeto deixe a sua sala ainda mais interessante.

Além desse exercício, você pode tentar seguir outra dica prática do autor Gail Blanke para praticar o desapego, começando já.

A ideia é usar três sacos plásticos com as etiquetas “guardar”, “doar” e “vender”.

Em cada um desses sacos, você deve colocar pelo menos 10 itens que considera preciosos. Então, para evitar de acumular coisas desnecessárias, bastará repetir esse exercício rotineiramente. 

“Quando tomamos esse tipo de iniciativa, além de nos livrarmos de objetos que não servem mais, abrindo espaço para o novo, estamos nos desapegando de sensações e sentimentos que já não são mais tão agradáveis, que ficaram no passado. Isso nos permite viver o presente com mais intensidade”, afirma Cristiane. 

“É preciso ter em mente que mesmo os objetos que nos trazem boas lembranças podem e devem ser descartados ao longo da vida. Isso porque as nossas histórias têm que ficar gravadas na memória e não nos objetos que possuímos. Apegar-se a objetos do passado pode nos impedir de crescer em direção ao futuro. E a vida acontece no aqui e agora”, complementa Rosana.

Regras de ouro 

Para você doar objetos pessoais é sempre um drama? Os especialistas ouvidos nesta matéria dão dicas de como tirar de letra esse desafio. 

• Se vai começar a limpeza pelo seu guarda-roupas, por exemplo, o primeiro passo é deixar tudo o que há dentro dele à vista.

• Objetos que não têm mais utilidade, como meias e brincos sem os pares, devem ir diretamente para o lixo.

• Separe tudo o que você já nem se lembrava que tinha. É sinal de que são peças totalmente desnecessárias. Essas podem ser doadas ou vendidas.

• Olhe os demais objetos e pergunte a si mesma: eu preciso disso? 

• Pare para pensar sobre os objetos que lhe trazem recordações especiais e que são, de longe, os mais difíceis de tirar da gaveta. Use outra regrinha: se ao olhar para a peça, você remete para acontecimentos que não foram tão bons na sua vida, melhor retirá-la imediatamente do seu armário. Fique com as que lhe causam boas sensações. E, mesmo assim, por tempo determinado! Lembre-se sempre: quanto menos coisas velhas juntar, mais espaço e disponibilidade para as novas aquisições e experiências você terá.

Vender ou doar?

Além de decidir sobre o que quer ou não quer mais guardar, nesse exercício você será convidada a decidir entre doar ou vender os bens que têm.

Em linhas gerais, vale a pena vender o que pode lhe trazer algum lucro, como joias, roupas caras, objetos de arte, eletrodomésticos ou móveis muito antigos. Brinquedos, objetos de infância ou de família, porém, podem ser doados. 

“Doar é um exercício de desapego ainda maior do que vender, à medida que não receberemos nada em troca. De qualquer forma, vender já é mudar, trocando-se uma coisa a que éramos apegadas por uma soma com a qual poderemos adquirir objetos totalmente novos”, pondera Rosana.

Depois de colocar seus objetos nos três sacos sugeridos, ainda restará organizar o que ficou, o que permitirá abrir espaço para as novidades.

“O apego aprisiona, limita e, principalmente, nos impede de enxergarmos novos caminhos, novas possibilidades e oportunidades. 

O desapego é justamente o contrário, ele nos traz uma sensação incrível de liberdade e bem-estar, uma motivação extra para mudar e nos melhorarmos”, garante Cristiane. 

Viu só? Então, embarque já nessa operação-limpeza! Hoje, agora, pra ontem!

Postado no blog Uma Mulher em 14/12/2012


Pessoas que tomam o partido do bem e da generosidade !




Não é por ser gremista, pois não sou idiota e sei que amanhã ou depois o Barcos pode estar usando outra camisa.

Tudo bem, faz parte do futebol e da profissão, mas a atitude que ele teve em ir visitar a "Piratinha" Gabrieli, foi de uma generosidade que eu costumo dizer que, só os que possuem um grande espírito, são capazes de fazer.

Sem chamar a imprensa e nem contratar fotógrafos para se autopromover em cima da doença de uma criança, Barcos apenas decidiu ir conhecê-la e foi. Pegou sua mulher, os dois filhos e o sogro, e viajou 290 km até Santa Maria, para realizar o sonho de um anjo.

Atitude de um grande ser humano, em meio a tanta falsidade que existe hoje em dia.

Outro caso que também chamou a atenção e comoveu o país, foi o do ciclista atropelado em São Paulo, onde teve o braço arrancado e jogado em um córrego. 

Neste caso, um empresário do interior paulista doou uma prótese para o rapaz. Em meio a tanto egoísmo, existem pessoas que se diferenciam na multidão.

Acho que precisamos de mais um pouco disto no mundo. Pessoas que queiram ajudar os outros por vontade própria e não por querer algo em troca. Pessoas motivadas apenas por querer o bem daqueles que necessitam de ajuda ou mesmo de um gesto de carinho. 

Que estas atitudes sirvam de exemplo para outros profissionais do esporte, da saúde, empresários, religiosos, políticos entre outros.

Parabéns Hernán Barcos. Parabéns aos anônimos. Parabéns aos de bom coração.

(Oberdan Farias)

Fotos: Arquivo pessoal da família Medeiros


Postado no Facebook em Março/2013



Árvores tombadas e clichês em queda livre




Juremir Machado da Silva

– Os ecochatos tentam frear o progresso.

Ainda é comum se ouvir esse clichê na boca de quem imagina combater todos os lugares-comuns deste mundo.

– Por causa de um coruja não se pode tocar uma obra.

Os “progremalas”, xiitas do lucro a qualquer custo, odeiam ser atrapalhados por considerações ecológicas. Continuam a achar que a natureza é um repositório infinito de bens a serem devastados sem qualquer limite.

– A vanguarda do atraso impede o país de crescer.

Essa afirmação é feita em tom solene e, ao mesmo tempo, jocoso por homens que jamais se questionam diante do espelho.

É um pessoal que parou no tempo. Uma turma que ainda pratica o capitalismo do século XIX. Se for para crescer economicamente, pode poluir à vontade. Se for para ganhar muito dinheiro, pode desmatar sem constrangimento. Se for para os carros andarem mais rápido, pode derrubar quanto árvores se fizer necessário. 

A vida desses amantes da motosserra está cada vez mais difícil. O cerco em torno deles não para de se fechar.

Hoje tem audiência pública na Câmara de Vereadores sobre a derrubada das árvores da avenida Edvaldo Pereira Paiva, em Porto Alegre. 

Por mais algum centímetros de pista para os bólidos dos nossos apressados motoristas, de acordo com o plano de mobilidade para a Copa do Mundo de 2014, mais de cem árvores devem cair. Elas estão marcadas para morrer. Todas assinaladas com um “c”. 

Os comedores de concreto estão dispostos a tudo pelo “progresso”. O que são cem árvores para eles? Árvores, segundo o prefeito, “que ninguém usa”. O importante é ter asfalto novinho para mostrar na próxima visita da Fifa.

– Florestas, bosques, matas, árvores abatidas – diz um personagem, intérprete de “O pato selvagem”, de Ibsen, no clássico “Árvores abatidas” do genial Thomas Bernhard.

Quando os atuais comedores de concreto eram crianças, implicar com os outros, especialmente com os mais fracos, era normal; molestar meninos e meninas era comum e morria no silêncio dos lares com seus segredos letais; não deixar negros entrarem em clubes social fazia parte dos costumes na maioria das nossas cidades; fumar na cara dos outros era charmoso; destruir a natureza era uma obrigação de homens empreendedores, sérios e comprometidos com o futuro. 

Agora, isso tudo é chamado por seus nomes: bullying, pedofilia, racismo, tabagismo, burrice antiecológica, etc. 

Há quem sofra terrivelmente com essa nova realidade limitadora dos seus movimentos.

– O politicamente correto nos deixa de mãos amarradas.

Precisamos de mais asfalto ou de mais árvores? Entre mais asfalto e preservação das árvores, o que deve ser prioridade? 

Um comedor de concreto supostamente com senso de humor, deixando escapar seu racismo, saiu-se com esta:

– Para que tantas árvores se temos poucos macacos.


Postado no blog Juremir Machado da Silva em 18/03/2013
Imagem inserida por mim








Dom Bergoglio e Dom Paulo



Cardeal Dom Paulo


Paulo Moreira Leite - Isto É


Um número grande de leitores do blogue tem escrito para reclamar de meus textos sobre o novo Papa.

A queixa mais recente envolve uma citação. Em nota recente, defini o jornalista Horácio Verbitsky como uma das grandes autoridades sobre direitos humanos na Argentina. 

Os leitores escrevem para lembrar que Verbitsky participou do grupo armado Montoneros, que cometeu sequestros e até execuções de inimigos durante o regime militar.

Lembro a nossos amigos que a vida de todo mundo é feita de contradições. Mesmo aqueles homens que os católicos descrevem como Santos não tiveram uma existência em linha reta, certo?

Verbitsky participou de uma organização armada e não acho que, nas circunstâncias daquele tempo, isso seja necessariamente vergonhoso. Pode ser honroso, conforme o ponto de vista de tantos argentinos. O debate não é este, porém.

Mais tarde, dedicou-se a pesquisar e investigar o que se passou naquele período. E foi nessa atividade que demonstrou um rigor fora do comum. Seus livros sobre o período militar são obras únicas pela disposição de investigar e analisar rigor uma situação bastante complexa. 


É impossível entender a Argentina dos anos 80 sem ler o que escreveu sobre a guerra suja, os conflitos internos do peronismo e o regime dos generais.

Isso aconteceu em outros países. No Brasil, antigos militantes da luta armada participaram das pesquisas e da redação do livro Brasil Nunca Mais.


Isso não impediu que o livro fosse referência mundial em pesquisas sobre violações de direitos humanos.

A reação diante de meus elogios ao trabalho de Verbitsky, ajuda a lembrar que todos temos um passado e é preciso lidar com ele.


E é aí que o debate sobre a atuação de José Mario Bergoglio faz sentido.

Depois da denuncia de Verbitsky, o Premio Nobel Adolfo Perez Esquivel tentou encontrar um conceito para definir a atuação do então bispo Bergoglio naquele período. Disse que ele não fora cúmplice dos militares e que apenas não havia demonstrado “coragem” na luta por direitos humanos, naquele momento.

Foi o que bastou para que as denúncias de Verbitsky, que citou o caso de dois jesuítas que Bergoglio teria se recusado a proteger em hora de perigoso, fossem tratadas como “difamação” por seus aliados. Vamos com calma.

Ainda que o conceito de Esquivel seja o mais adequado, a constatação de que um bispo não demonstrou “coragem” diante de um governo capaz de produzir 30.000 mortos, sequestrar mulheres grávidas e crianças me parece grave o suficiente para discutir sua liderança para defender os fracos e indefesos em horas difíceis. 


Este ponto é importante. A atuação da Igreja argentina no período militar foi tão vergonhosa que mais tarde ela chegou a pedir desculpas a população pelo apoio ao regime, o que dá uma ideia do sentimento de repulsa de boa parte dos argentinos pelo comportamento de tantos padres e bispos naquela época. 


Falta de coragem pode ser eufemismo para muitas atitudes, nós sabemos.

Mas não é um conceito que cabe a Igreja brasileira no mesmo período.

Embora o regime de 64 tenha sido abençoado pela cúpula da Igreja, nos anos seguintes ela se tornou abrigo de boa parte das ações de oposição e resistência. Procure nas oposições sindicais e nas lideranças populares daquela época. Vai ser muito comum encontrar pessoas que, de uma forma ou de outra, tinham ligações com a luta social da Igreja.

Entre várias lideranças, poucas se destacaram como o Arcebispo de São Paulo, Paulo Evaristo Arns. Quinze anos mais velho do que Bergoglio, dom Paulo viveu um mesmo período mas atuou de forma oposta. 


Seu comportamento foi exemplar em momentos decisivos.

Realizou uma missa pela morte do estudante Alexandre Vannuchi Leme, em 1973 e, dois anos depois, fez o culto ecumênico em função do assassinato do jornalista Vladimir Herzog. Criou uma comissão para investigar crimes contra direitos humanos e desafiou a ditadura ao denunciar a situação brasileira durante visita de Jimmy Carter ao país. 


Dom Paulo também estimulou a defesa de direitos humanos em países vizinhos, denunciando a cooperação entre as ditaduras para perseguir adversários.

No fim da ditadura argentina, o mal-estar em torno de Bergoglio era tão grande que um dos jesuítas mencionados por Verbitsky, a quem não teria prestado ajuda na hora devida, reconciliou-se com ele. Ou seja, deu-lhe perdão.


Embora não lhe tivesse faltado coragem, Dom Paulo não foi perdoado pela valentia.

Na mudança política promovida a partir da posse de João Paulo II, sua diocese foi dividida, seus poderes foram diminuídos e os aliados foram encostados. 


Sob aplauso das fatias mais conservadores, vozes ligadas a resistência foram silenciadas, num processo dirigido pessoalmente por Joseph Ratzinger.

Se alguém quisesse contar a história como ela foi, e não como gostaríamos que tivesse ocorrido, é possível dizer que, com sua “falta de coragem” o bispo Bergoglio adivinhou o rumo que o Vaticano iria seguir nos anos seguintes.

Já a valentia de Dom Paulo trouxe a admiração de tantos brasileiros, católicos ou não. Não lhe trouxe, contudo, as honrarias do sistema que transformou Bergoglio em Papa.


Curioso, não?


Postado, também, no blog O Esquerdopata em 17/03/2013
Trechos grifados por mim
Imagem inserida por mim