O Ato teve um encerramento emocionante, com uma integrante da Comissão que leu em voz alta do nome de desaparecidos na ditadura que possuíam vínculos com a USP. À leitura de cada nome, todos gritavam “presente”
Carolina Rovai, Spresso SP
O ato pela criação da Comissão da Verdade na USP, realizado na semana passada no auditório da Faculdade de Economia e Administração (FEA), contou com a presença de mais de 500 pessoas e teve como um dos destaques o depoimento da filósofa e professora Marilena Chaui.
Chauí iniciou sua fala relatando o caso de dois grandes amigos, Heleny Guariba, uma das desaparecidas na ditadura militar, e de Luiz Roberto Salinas Fortes, morto por conta dos reflexos deixados pela tortura que sofreu também na época da ditadura.
Ela também relembrou como era entrar na USP em 1969, após a proclamação do Ato Institucional número 5, o AI 5, que foi assinado em dezembro de 1968. “A sensação que a gente tinha era de não saber se voltaria para casa, você não tinha nenhuma garantia de que não seria preso e torturado, portanto você não sabia se seus alunos estariam na classe, e quando você se dava conta de que alguns não estavam você não ousava a perguntar onde eles estavam, se eles tinham faltando na aula, se eles tinham partido para um exílio, se eles já estavam presos ou se já estavam mortos. E a mesma coisa com relação aos colegas.”
Ela disse que acha de “essencial importância que a Comissão da verdade resgate todos os decretos da USP, com as datas de implantação e por quem eles foram implementados”. E adiantou que se coloca desde já à disposição para depoimentos e para ajudar na Comissão. A filósofa também criticou o atual reitor João Grandino Rodas: “Este reitor foi formado e teve seu aprendizado como dirigente nesse caldo de cultura da ditadura. Essa forma de gestão explica essa coisa inacreditável. Isso nem a ditadura fez: pôr a polícia dentro do campus para espancar os alunos”.
Também participaram do ato o professor Paul Singer (FEA/USP), Edson Teles, doutor em filosofia pela USP, professor da UNIFESP, ex-preso político e membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, Vera Paiva, professora do Instituto de Psicologia da USP e filha do ex-deputado Rubens Paiva, desaparecido durante a ditadura militar, e Eduardo Gonzales Cueva, diretor do programa Verdade e Memória do Centro Internacional para a Justiça de Transição. Roberto Schwarz, professor da USP/Unicamp, também convidado não pôde estar presente, mas enviou sua solidariedade ao movimento. O encontro também contou com a participação de representantes do DCE, do Sintusp, da Adusp e de alguns Centros Acadêmicos da universidade.
A professora Vera Paiva ressaltou que o movimento de democratização da USP tem perdido tempo em discussões por divergências partidárias ao invés de ficar mais atento ao verdadeiro inimigo. Em resposta à pergunta sobre qual verdade queremos, a professora respondeu: “Verdade que permita dizer que isso nunca mais pode acontecer no Brasil.”.
Sua fala também foi marcada por uma preocupação em relação aos órgãos de imprensa que, segundo ela, continuam não apurando os fatos de maneira limpa e clara. Na sua opinião, precisa-se resgatar o que significa “o terrorismo de Estado com a cumplicidade dos órgãos de imprensa”. E acrescentou ao final que é inaceitável o fato de ter de viajar passando por um viaduto com o nome Costa e Silva e por uma estrada chamada Castelo Branco.
Edson Telles disse que não se deve aceitar mais do Estado respostas que tratam a violação dos direitos humanos como uma “reconciliação nacional”, pois não estamos nesse conflito. Eduardo Gonzales acrescentou que a Comissão da Verdade é importante para que se acabe com a história de que as violações aos direitos humanos no Brasil na ditadura foram inferiores a outras ditaduras onde houve mais mortos e desaparecidos: “Direitos humanos não são uma questão de aritmética, mas sim de princípios”. Além disso, destacou que a Comissão da Verdade vai ser importante também para apurar esses números.
Paul Singer destacou que se deve investigar o passado, “pois só assim podemos entender o presente”.
Assista trechos:
O Ato teve um encerramento emocionante, com uma integrante da Comissão que leu em voz alta do nome de desapararecidos na ditadura que possuíam vínculos com a USP. À leitura de cada nome, todos gritavam “presente”. E uma pessoa se levantava com a foto do citado e levava-a até a frente, deixando-a num painel com rosas ao redor.
Postado no blog Pragmatismo Político em 18/06/2012