A manipulação da felicidade
por Cristiano Tavares
Estava caminhando por uma avenida arborizada perto de casa e não pude deixar de reparar em um fato interessante, apesar de muito corriqueiro. Era início de noite e percebi um sujeito visivelmente acima do peso assistindo ao Jornal Nacional dentro de seu carro zero quilômetro, que estava parado em um trânsito infernal. Parecia aborrecido e ansioso, talvez porque desejasse chegar rapidamente em casa para assistir à novela.
Para os senhores do mundo, os banqueiros, donos das grandes corporações e de praticamente toda a mídia, é fundamental incutir na sociedade um comportamento consumista, doentio, beirando quase a demência cognitiva. O consumo excessivo serve apenas para encher os cofres destes senhores, que enriquecem cada vez mais às custas de um povo absolutamente alienado.
Esta manipulação da mídia atua no chamado cérebro primitivo (http://repositoriofilosofico.com/2011/12/cerebro-primitivo-a-maquina-dos-sentimentos/), conhecido como a fonte das emoções. É exatamente o mesmo tipo de mecanismo que as religiões usam para mascarar o cérebro racional e lógico, situado no neocórtex cerebral. O maior dispositivo tecnológico de hipnose existente é a televisão, capaz de enviar sugestões inconscientes e suprimir o intelecto humano através da sugestibilidade. Não se iludam, porque o poder da sugestão é forte o bastante para atingir qualquer pessoa, ainda mais aquela que se julga imune à influência.
A coisa não para por aí. As religiões usam do mesmo princípio quando invocam demônios e causam medo (http://repositoriofilosofico.com/2011/10/a-hipnose-na-religiao/). Se você não contribuir com o dízimo da igreja, sua alma vai para o inferno. Quem não teria medo de ir para o inferno? Vocês já repararam na quantidade absurda de telejornais sensasionalistas no estilo policial? Por que será que um programa sem conteúdo produtivo e que emburrece pessoas tem tanta audiência? É o medo que alimenta o povo. Este sentimento afeta o cérebro primitivo e aumenta o poder da sugestão, afim de que aceitemos sem questionamentos as besteiras que nos dizem a respeito do mundo.
As pessoas compram para se sentirem felizes, mas na verdade estão tornando-se mais infelizes e dependentes do mundo material. Tenho visto muita gente deixando de caminhar, abandonando hábitos saudáveis, para comprometer seu orçamento por causa de um veículo automotor, que pouco oferece de vantagem em um trânsito caótico, engessado e paranóico como o de São Paulo. O carro converte-se em um instrumento de tortura, gerador de estresse e sedentarismo. O mal humor é tão grande que tem motorista que não respeita mais pedestre e até mesmo acelera para cima de ciclistas.
O mundo material está a serviço da humanidade e não o contrário. Tenho um grande amigo que passa noites sem dormir quando sai um novo modelo de TV: precisa desesperadamente comprar. Neste ano comprou 4 televisões de 47 polegadas, uma para cada cômodo de sua casa. As antigas, compradas no ano passado, estão encostadas (velhas, não servem ele diz). Como a maioria, ele também acredita que “tudo o que é novo é melhor”, um pensamento falacioso do tipo “argumentum ad novitatem”. O mais chocante é que este mesmo tipo de impulso neurótico e ilógico é causado pelo próprio objeto de aquisição. A coisa toda vira um ciclo vicioso, como no caso do sujeito obeso assistindo televisão dentro de seu objeto de consumo. Estamos como que herméticos dentro de nossa bolha de ignorância cíclica, em harmonia perfeita com a infelicidade.
É evidente que um carro é importante e confortável, mas somente nos casos onde nossas necessidades são satisfeitas sem privação de liberdade ou prejuízo de personalidade. A televisão e as propagandas mentem com a finalidade exclusiva de produzir rôbos não-pensantes, seres programados para serem meros repetidores de tendências. Não consigo enxergar como uma pessoa pode ser mais feliz, livre e independente, adquirindo um objeto material cujo valor corresponde, na mesma medida e proporção, a um certo tempo específico de sua vida dedicada ao exercicio de uma atividade. Quanto maior o valor do bem, maior o tempo destinado ao emprego e menor será o usufruto de uma vida livre e abundante.
A servidão moderna implantada pelos Illuminati (senhores do mundo) foi aceita porque esta se converteu em modismo. Por exemplo, se o objetivo de quem controla o mundo fosse atribuir significado de valor para a limpeza de fossas, este comportamento seria promovido socialmente pelas mídias e difundido como sinônimo de felicidade e prosperidade. Estaríamos a ver propagandas na televisão de gente sorrindo e feliz, mesmo estando a recolher merda. Um dos valores mais importantes do ser humano livre é a capacidade de pensar por si mesmo. Infelizmente, observamos que a maior parte das pessoas preferem que outras pensem em seu lugar.
A verdade da felicidade é muito mais simples do que você imagina. Segundo o filósofo grego Heráclito (540 – 470 a.C.), “Ás vezes por ser tão inacreditável, a verdade deixa de ser conhecida“. O inacreditável é que a felicidade está dentro de cada de um de nós e não precisa da posse de um meio material para aflorar. O véu de ilusão que recobre a sociedade pode ser muito bem descrito por uma citação interessante de Dalai Lama: “…. Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem o dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro esquecem do presente de forma que acabam por não viver nem no presente nem no futuro. E vivem como se nunca fossem morrer… e morrem como se nunca tivessem vivido”.
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Postado no Blog Repositório Filosófico em 02/03/2012