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Absurdos deste nosso país que se encontra a beira do abismo !
PM-SC dá choque em criança de colo e ameaça quem criticou
Eduardo Guimarães
Na tarde de 22 de janeiro último, em Pomerode, Santa Catarina, ocorreu um dos atos de violência policial mais espantosos que já vi que precisa ser denunciado em benefício da contenção de uma polícia tão violenta que é capaz de expor uma criança a risco.
Um rapaz cujo nome não foi divulgado foi levar o filho à casa da ex-mulher. Lá chegando, constata que ela não está em casa e que há policiais no local.
Assim que chega com a criança no colo, é abordado pelos policiais que afirmam que haviam recebido um chamado da mãe da criança, porém sem saber explicar por que razão.
Detalhe: o pai da criança não estava no local na hora do chamado e a casa da mãe da criança estava fechada e vazia.
Nesse momento, do nada, o rapaz recebe ordem de prisão por embriaguez – os policiais afirmam que sentiram “odor etílico” nele e exigem teste do bafômetro, apesar de o carro estar estacionado e de o motorista ser outra pessoa sem o tal “odor”.
O rapaz, ainda com o filho no colo, fica zangado ao ter o ignorado o argumento de que não estava dirigindo e se recusa a fazer o procedimento do bafômetro.
Os policiais começam a gritar, dão choque no rapaz estando ele com o filho no colo.
Assista ao vídeo, abaixo. Prossigo em seguida.
Os policiais ameaçaram a pessoa que gravou o vídeo e tomaram o celular de sua mão. Antes, porém, a pessoa ainda teve tempo de subir o vídeo no Facebook.
O resultado dessa ação é que o rapaz foi conduzido à delegacia e obrigado a se submeter ao teste de bafômetro, o qual não constou alteração, ou seja, o rapaz estava sóbrio e foi liberado. No entanto, apreenderam o carro dele sem nenhuma justificativa, pois os documentos estavam em ordem, o carro é relativamente novo e está em bom estado.
Porém, o mais impressionante é a “explicação” da PM para o caso. Abaixo, a nota da Corporação em Pomerode (SC):
“Circula um vídeo pelas redes sociais que mostra apenas PARTE de toda a ação. Ocorre que, segundo relato dos policiais que atenderam a ocorrência, na tarde de 22 de janeiro de 2017 a guarnição policial militar foi acionada pela Central Regional de Emergência para atender uma ocorrência de violência doméstica e dano, sendo que o ex-marido teria arrombado a porta da residência, com o objetivo de tirar o filho a força da casa da mãe.
No momento em que a guarnição policial chega no local e tenta contato com a solicitante (tocando a campainha onde ninguém atendeu), o ex-marido chega dirigindo o veículo dizendo que queria devolver a criança que tinha pego anteriormente.
O ex-marido se mostrou bastante irritado querendo saber o que a polícia fazia no local e quem que havia chamado, querendo sair com seu veículo a todo instante, oportunidade que logo se constatou o odor etílico sendo exalado pelo ex-marido, além de outros sinais de embriaguez.
Observa-se que os policiais foram PACIENTES, CLAROS e LEGÍTIMOS em suas DETERMINAÇÕES, inclusive quanto à ordem para soltar a criança.
Houve desobediência e resistência por parte do autor (em vários momentos da ocorrência), que infelizmente se utilizava de uma criança (seu próprio filho) como ESCUDO para não acatar as determinações dos policiais e para se livrar das responsabilidades dos atos que até então cometeu.
A preocupação pela segurança e integridade física da criança era constante e o pai continuava a utilizá-la como escudo para não se submeter às ordens legais. Em alguns momentos onde o policial tentava conter o autor e fazer cumprir a LEI, o autor fazia movimentos bruscos e continuava a resistir, apresentando clara conduta de confrontamento.
Em determinado momento em que a posição do autor favoreceu uma ação policial, os policiais agiram para fazer cumprir a LEI e resguardar a INTEGRIDADE FÍSICA de todos os envolvidos, antes que a situação evoluísse ainda mais. Observa-se que a integridade física da criança foi priorizada, vez que foi imediatamente acudida e colocada em local seguro. A força física notória do rapaz, que usava seu próprio filho como escudo, trouxe, ainda mais, complexidade para a ocorrência, exigindo concentração e proporcionalidade na ação dos policiais.
A Polícia Militar é uma instituição séria, confiável, técnica e legalista. Em que pese à princípio não se vislumbrar ilegalidade por parte dos policiais segundo os relatos e imagens, será solicitada a instauração de procedimento investigativo para apuração dos fatos e das responsabilidades, inclusive dos eventuais comentários ofensivos e indecorosos que foram proferidos nas redes sociais de forma injusta e sem conhecimento de causa.”
O texto mal escrito não é o único problema. O problema são as mentiras e o verdadeiro deboche de quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir o vídeo. O rapaz está calmo, com o filho no colo, apenas se recusa a largar a criança porque estava assustada.
Uma parente dele se manifestou nos comentários sob a nota da PM:
Basta ter olhos de ver. Em primeiro lugar, quando usam um taser em uma pessoa, se ela estiver abraçada com alguém a segunda pessoa também receberá um choque. Eletrocutaram a criança e ainda dizem que “resguardaram” sua integridade física?!!
A voz do rapaz mostra que não estava alterado. Não havia um motivo claro que justificasse tamanha violência. Deveriam ter esperado familiares do rapaz que já se dirigiam ao local – no vídeo é possível ouvir o rapaz pedindo para chamar seu pai.
Não é possível que uma violência desse calibre fique impune. O trauma que essa criança sofreu ao receber um choque e ter visto o pais estrebuchando irá /perdurar para o resto de sua vida.
Mas a cereja do bolo vem agora, para quem não notou. Releia o trecho final do último parágrafo da nota da PM:
“(…) Será solicitada a instauração de procedimento investigativo para apuração dos fatos e das responsabilidades, inclusive dos eventuais comentários ofensivos e indecorosos que foram proferidos nas redes sociais de forma injusta e sem conhecimento de causa”
Como é que é? Apurar “comentários ofensivos”? Apurar para que? Vão usar o taser em quem comentou, também? Agora a PM de SC criou crimes de opinião? Eletrocutar crianças não é suficiente?
Postado em Blog da Cidadania em 24/01/2017
Fui preso injustamente no dia da marcha contra a corrupção
Por Pedro Urizzi
Sou eu nessa foto sendo preso injustamente! Estava a caminho de um jantar (por isso a garrafa de vinho na mão), havia descido do ônibus, pois a Av. Paulista ainda estava interditada e comecei a caminhar em direção à Brigadeiro. Quando passo em frente ao Masp, vejo a manifestação contra a corrupção. Fiquei algum tempo observando a marcha de longe. Minutos depois, grande parte das pessoas foram dispersadas pela PM com o uso de força bruta, gás lacrimogêneo, bala de borracha etc.
Após o primeiro confronto, continuo em direção à Brigadeiro, levando meu vinho e escutando música, mas uma cena me marcou muito: vi um policial com um saco de bombas, que caminhava junto com sua equipe até um grupo de pessoas que estavam na calçada. Observei que havia crianças ali também. Então, corri até a ilha de cimento que fica na frente do Masp e comecei a berrar: “Tem criança ali, não joga não joga, tem criança.”
Depois de poucos minutos, o mesmo policial me abordou agressivamente, me segurou pelo colarinho e alegou que eu o xinguei. Ele me xingou algumas vezes e continuou a me segurar pelo colarinho e a me chacoalhar. Enquanto isso, outro policial veio e me agrediu com um cassetete no braço, me deram voz de prisão e bruscamente torceram meu braço esquerdo e me seguraram pela nuca. Em nenhum momento os policiais pediram meus documentos ou respeitaram meus direitos. Fui detido por livre decisão da PM, sem motivo algum, e de uma maneira humilhante.
Jogaram-me no chão com força e me algemaram com as mãos para trás, apertaram bem forte a algema da minha mão direita. Fui colocado no camburão. Em nenhum momento nenhum policial militar ou oficial superior interveio ou me deram alguma explicação. Fui detido como um criminoso perigoso, ou quem sabe um dia como um político corrupto. Meus direitos foram jogados a esmo pela Polícia Militar do Estado de São Paulo. Depois de entrar no camburão, fiquei muito nervoso e incerto do que iria acontecer. Só me tranquilizei quando me entregaram à Polícia Civil, no 8º DP.
Lá, pela primeira vez, meus direitos foram respeitados, o delegado mandou retirar as algemas, me deram água e fui depor. Fiz minhas ligações, dois amigos foram até o DP. Depois, fui ao IML para fazer corpo delito, pois fui agredido pela PM: tenho escoriações leves no ombro, joelho e meu pulso direito está bem machucado — mas a dor física não me incomoda, essa passa, mas e a dor da humilhação? A dor da alma, sabe? De não poder fazer nada, se sentir sem direito algum, de ser tratado como um criminoso. O dia 21 de abril de 2012 vai fica pra sempre na minha memória, mas não me arrependo de nada! Imagine as atrocidades que não acontecem na cidade de São Paulo, quantas pessoas sem vozes existem? Quantas injustiças? Vou processar a PM e o Estado de São Paulo, fui agredido e humilhado pelo Governo que eu e você sustentamos com os nossos impostos.
Mas o Brasil mudou. Há 40 anos, meu pai foi preso político, ficou seis anos no exílio. Na época, ele foi torturado e perdeu onze dentes. Evoluímos. Dessa vez não perdi os dentes e nem sumiram comigo, tive “apenas” escoriações, o punho machucado e a negação dos meus direitos. O que mudou? Que a PM é totalmente despreparada, não foi criada para proteger os cidadãos, não se pode de maneira alguma confiar nela. O Brasil precisa caminhar muito, mas muito mesmo para deixar para trás os fantasmas da ditadura militar que ainda irrigam nossa política de segurança pública. Sábado, fui preso injustamente, e os políticos corruptos que estão à solta. E aí?!
Postado no Blog Coletivo e Outras Palavras em 24/04/2012
Brigada Militar absolve policial acusada de racismo contra estudantes africanos
Samir Oliveira
A Brigada Militar absolveu uma policial acusada de ter cometido racismo contra dois estudantes africanos no dia 17 de janeiro deste ano. O Inquérito Policial-Militar (IPM) instaurado no dia 26 de janeiro foi concluído no último sábado (7) e considerou que a soldado adotou “uma abordagem dentro da técnica” da corporação.
Sagesse Ilunga Kalala, da República Democrática do Congo, e Tibulle Aymar Sedjro, do Benin, estavam em Porto Alegre desde março de 2011 estudando português na UFRGS – etapa obrigatória de um convênio entre o governo brasileiro e seus países, que os direcionou para a Universidade Federal de Rio Grande, onde atualmente estão cursando Biologia e Oceanologia, respectivamente.
Leia mais:
No dia 17 de janeiro, eles estavam dentro de um ônibus da linha Campus Ipiranga se dirigindo ao Centro da Capital, onde encontrariam uma amiga para irem até a sede da Polícia Federal renovar seus vistos de permanência no país. Na ocasião, perceberam que uma policial militar fardada não parava de olhar para eles, que conversavam entre si em francês.
Subitamente, a soldado mandou que o motorista parasse o ônibus, apontou a arma para os dois africanos e mandou que descessem do coletivo com as mãos na cabeça. Quando Tibulle se abaixou para pegar seu celular, que havia caído, a policial teria engatilhado a arma.
Na saída do ônibus, que havia parado próximo ao parque Farroupilha, na Avenida João Pessoa, havia três viaturas da BM para recepcionar os estudantes – já que a policial havia pedido reforços. Sagesse e Tibulle foram encostados no ônibus, revistados, algemados e levados para o posto da Brigada Militar na Redenção – de onde foram liberados após os policiais perceberem que se tratava de dois estudantes estrangeiros.
Dentro do posto, Sagesse assegura que um policial negro teria apontado para sua própria pele e dito: “Vocês não sabem que isso no Brasil sempre aconteceu e vai acontecer de novo?”.
Indignados, os dois expuseram o caso na mídia e registraram uma denúncia na 10º Delegacia de Polícia Civil, que ainda investiga o caso. Com a divulgação, a BM instaurou um inquérito no dia 26 e, na época, o comandante-geral em exercício, coronel Altair de Freitas Cunha, se reuniu com Sagesse e Tibulle e pediu desculpas pelo ocorrido.
“A abordagem foi técnica”, defende major
O comandante do 9º Batalhão da Brigada Militar, major Renato Maia, conduziu o Inquérito Policial-Militar que investigou a conduta dos envolvidos na detenção de Sagesse Ilunga Kalala e Tibulle Aymar Sedjro. Em conversa com o Sul21, ele informou que a conclusão do IPM foi de que a policial que apontou uma arma para os dois dentro de um ônibus agiu de forma “técnica”.
“Não foi constatado indicio de crime por parte da soldado. A abordagem foi dentro da técnica. Ela desconfiou da postura desses dois indivíduos, até porque ela na entendia o que eles estavam falando, solicitou apoio e fez uma abordagem dentro da técnica. Era uma policial fardada. Em desconfiando, faz a abordagem”, justificou o oficial.
Apesar de absolver a principal envolvida na denúncia, o IPM incrimina outros dois policiais – mas não por qualquer conduta incorreta ou violenta em relação aos detidos. O inquérito indicia dois brigadianos por falso testemunho, já que eles estavam na ação e teriam declarado que não haviam participado do fato. O IPM já está nas mãos da Justiça Militar e será apreciado por um promotor, que ainda pode acusar a soldado que motivou a ação, caso entenda que ela cometeu alguma ilegalidade no ato.
O corregedor-geral da Brigada Militar, coronel João Gilberto Fritz, não quis se manifestar sobre o caso, alegando que o inquérito foi feito pelo comando do 9º batalhão, não pela Corregedoria. “Tenho que ver o fato concreto e analisar os autos. Sem isso, não posso me manifestar”, explicou.
Apesar de a policial investigada pertencer ao 21º Batalhão – que faz o policiamento no extremo sul de Porto Alegre -, o IPM ocorreu no 9ª Batalhão, que abrange a área onde o fato aconteceu.
A reportagem do Sul21 tentou contato com a assessoria do comandante-geral da Brigada Militar, coronel Sérgio Abreu, que repassou a demanda para a Corregedoria. A Secretaria Estadual de Segurança Pública também foi procurada, mas a assessoria informou que o secretário Airton Michels (PT) “não comenta um procedimento administrativo interno da Brigada Militar”.
“Não podemos deixar que acabe assim”, reclama Sagesse
Atualmente, Sagesse Ilunga Kalala, da República Democrática do Congo, está estudando Biologia na Universidade Federal do Rio Grande (Furg). Em conversa por telefone com o Sul21ele ficou sabendo da decisão do inquérito da Brigada Militar e disse que não irá aceitar a impunidade da soldado que iniciou a abordagem dele e o seu amigo Tibulle Aymar Sedjro.
“Nos algemaram e nos levaram ao posto policial, deram uma gravata no meu amigo e vão falar que não foi nada demais? Isso não é normal”, indigna-se, ressaltando que considera a policial culpada. “Ela é culpada. Além de tudo, não nos deixou ir embora depois de nos tirar do ônibus”, lembra.
Durante todo o momento em que foram abordados, os estudantes tentavam entender a situação e explicar que eram estrangeiros, mas contam que a policial apenas mandava eles calarem a boca. “Foi a primeira vez que um policial apontou uma arma para a minha cabeça. Não podemos deixar que isso acabe assim”, comenta.
O presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, Jair Krischke, recebeu a denúncia de Sagesse e Tibulle e prestou auxílio aos jovens. Ao saber do resultado do inquérito da Brigada Militar, ele classificou a investigação como uma “palhaçada”. “A conclusão desse inquérito evidencia que o despreparo não é só nos soldados, mas também da oficialidade da BM. Chegar a uma conclusão dessas num evidente caso de racismo é certificar o despreparo”, critica.
“É uma decisão corporativa”, critica Marcos Rolim
O especialista em Direitos Humanos e Segurança Pública Marcos Rolim acredita que a decisão da Brigada Militar de absolver uma policial que teria adotado uma conduta racista ao abordar dois estudantes africanos em Porto Alegre foi “corporativa”. Ele aponta que o inquérito deveria ao menos explicar por que ela desconfiou dos detidos.
“A justificativa para a absolvição deveria exigir que essa policial explicasse por que suspeitou que essas pessoas estivessem praticando algum delito. Era uma suspeição fundada no fato de eles serem negros e estarem vestindo roupas aparentemente caras. É nitidamente uma postura preconceituosa”, avalia.
Rolim lamenta que não seja um caso isolado no Brasil e no Rio Grande do Sul. “Essa prática não é novidade. A diferença desse caso é que o exagero aconteceu num espaço público. Mas em qualquer vila de Porto Alegre é possível constatar que isso infelizmente é algo normal”, comenta.
Ele questiona o papel das corregedorias em organismos como Brigada Militar, Polícia Civil e Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) – que são formadas pelos servidores desses próprios setores. “Quem hoje é corregedor-geral da BM sabe que no futuro pode vir a ser subordinado de um sujeito que hoje ele investiga”, compara.
Rolim sugere que uma das formas de enfrentar o problema seria com a criação de uma corregedoria única para toda a segurança pública, com carreira própria e desvinculada da hierarquia militar. O especialista considera que, se isso não ocorrer, “o corporativismo continuará imperando”.
Ele também critica a postura da Secretaria Estadual de Segurança, que não quis se manifestar sobre o caso. “É uma decisão política da Secretaria. O Michels fez a opção tradicional dos secretários de Segurança: ele cuida das suas coisas e quem cuida da polícia são os policiais”, observa.
Postado no Blog Sul 21 em 10/04/2012
Truculência virtual de um capitão da Brigada Militar
O capitão da Brigada Militar Juliano André Amaral, que comanda seis cidades da Serra Gaúcha, mostrou uma visão peculiar no Twitter sobre o taser, equipamento que dá choque, tido como não-letal, mas que matou um brasileiro na Austrália recentemente. Para o capitão, o cidadão que não se “meter em confusão” e “respeitar a polícia”, não precisará fazer o “teste”, para saber se o taser mata ou não. Logo, quem não seguir o que ele diz está sujeito a ser assassinado pelas autoridades policiais — e com razão, deve pensar o capitão. “TASER: se não quer saber se ela pode matar ou não, fàcil, não se meta em confusão, respeite a polícia e não precisarà passar no teste!”
Postado no Blog Sul21 em 02/04/2012
A pena de morte já faz parte de nossas vidas
O maior argumento contra a implantação da pena de morte no Brasil é incontestável: ela já é praticada, e em larga escala. Somos o País cuja polícia mais assassina pessoas no mundo. Todo ano, praticamos um verdadeiro genocídio.
Números divulgados no final de março pela Anistia Internacional mostram que 20 países em todo o planeta executaram 676 pessoas em 2011. Nessa contabilidade fúnebre está excluída a China, que não divulga os detalhes de seu morticínio oficial.
Pois só as PMs do Rio e de São Paulo mataram, “em confronto”, mais do que essa soma de criminosos condenados à pena capital em todo o mundo. Somadas, as estatísticas revelam que 961 mortes foram cometidas por agentes dos dois Estados mais populosos do país. Em São Paulo, 437; no Rio, 524.
Nada indica que os demais Estados tenham policiais menos facínoras. O fechamento dessa conta deve ser macabro. Qualquer brasileiro esclarecido sabe disso. O detalhe é que muitos nativos acham que ainda é pouco. Por eles, poderia morrer muito mais gente.
Por gente, entenda-se jovens, pobres, negros, com baixíssima escolaridade e moradores de favela e periferia. São esses que tombam na guerra civil que tomou conta do nosso cotidiano. Esses “autos de resistência” nem sequer são averiguados. Tornaram-se banais.
Nos Estados Unidos, um país notoriamente violento, com policiais também envolvidos com corrupção e abusos de poder, em 2009, foram mortos em tiroteio, em todo aquele gigantesco território, 406 cidadãos.
Em Tóquio, no Japão, durante a década de 1990, a média era de 5 mortos por ano, nessas circunstâncias. E olha que lá eles têm a Yakuza, uma das máfias mais armadas e perversas do planeta.
Esses argumentos, no entanto, são inúteis. Nada é capaz de mudar o pensamento bélico, assassino e psicótico que tomou conta da sociedade brasileira. A sede de sangue é insaciável. Mas para que pena de morte se ela já faz parte de nossas vidas?
Postado no Blog O Provocador do Portal R7 em 03/04/2012
" Sinto vergonha de mim "
Morador do Pinheirinho espancado por PMs vai ter alta hospitalar e não tem para onde ir
por Conceição Lemes
No dia 4 de fevereiro, nós denunciamos aqui. Localizada mais uma vítima da violência policial na reintegração de posse do Pinheirinho. Era o aposentado Ivo Teles dos Santos, 70 anos, natural de Ilhéus (BA), RG 27106829-2.
Quem descobriu o seu paradeiro foi a ex-companheira, dona Osorina Ferreira de Souza, que, depois de peregrinar por diversos lugares, achou-o no dia 3 de fevereiro. Ele estava em coma, entubado, na UTI do Hospital Municipal de São José dos Campos, desde o dia 22 de janeiro.
“O senhor Ivo foi espancado por policiais militares no dia da reintegração de posse”, denunciou na época ao Viomundo Renato Simões, conselheiro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), onde representa o movimento nacional de direitos humanos. “Várias testemunhas viram-no ser espancado, depois ser levado para dentro do Pinheirinho.”
O hospital diz que o senhor Ivo teve acidente vascular hemorrágico (AVCH). Parlamentares e integrantes do Condepe questionam, pois o aposentado apanhou muito e foi visto, mal conseguindo andar, cheio de hematomas.
Anteontem, o Hospital Municipal de São José dos Campos comunicou dona Osorina de que vai dar alta ao aposentado.
“Acontece que o senhor Ivo não tem para onde ir”, afirma o vereador Tonhão Dutra (PT). “Na reintegração de posse, ele perdeu a casa e tudo o que tinha dentro. Para piorar, ele não tem mais condições de se cuidar sozinho, ele perdeu autonomia.”
Segundo a ex-companheira, Ivo não fala mais, só resmunga. Perdeu o movimento da mão e pé direitos. Só fica deitado, não toma banho sozinho. Alimentação é por sonda no nariz.
“Eles [Prefeitura e governo do Estado] precisam providenciar moradia e um cuidador para o senhor Ivo, pois ele mora sozinho, a ex-companheira também é doente e não tem como se ocupar disso”, afirma Dutra, que tem acompanhado o caso. “Afinal, o senhor Ivo está nessa situação por obra e graça de uma ação do prefeito Eduardo Cury e do governador Geraldo Alckmin.”
“SPDM SONEGA INFORMAÇÕES, NÓS É QUE SOMOS DENUNCIADOS”
No dia 4 de fevereiro, parlamentares e integrantes do Condepe estiveram no hospital Municipal de São José dos Campos para se inteirar mais do caso do senhor Ivo. Queriam ter acesso ao Boletim de Atendimento de Urgência (BAU), que é onde está relatado como ele chegou lá e as agressões sofridas.
A direção negou. A recusa do Hospital Municipal, administrado pela OSs SPDM, foi justificada como interferência direta de Danilo Stanzanni, Secretário da Saúde de São José dos Campos.
Depois de muita insistência e canseira, o hospital entregou apenas o relatório abaixo, que integrantes do Condepe e parlamentares questionam.
“Apesar de o presidente da SPDM, doutor Rubens Belfort Jr., ter nos prometido que enviaria o BAU, até hoje não cumpriu o acertado”, informa o deputado estadual Adriano Diogo (PT-SP). “Curiosamente, a SPDM ainda fez um boletim de ocorrência contra nós na polícia local. Uma inversão completa de valores. A SPDM nos sonega informação e nós é que somos denunciados.”
A propósito. Como até hoje as perguntas que fizemos na matéria anterior não foram respondidas pelas autoridades competentes, gostaria de reiterar algumas:
Por que o relatório do Hospital Municipal de São José dos Campos não fez qualquer menção a traumatismos, hematomas, já que descreve o quadro do aposentado ao dar entrada na emergência?
Supondo que, coincidentemente, o senhor Ivo tenha tido também um AVCH, por que “ignorar” os machucados no relatório, afinal compõem o quadro completo do doente?
Até que ponto a violência sofrida não contribuiu para elevar a pressão arterial do senhor Ivo, favorecendo o acidente vascular cerebral?
Se não há nada esconder, por que o secretário da Saúde de São José dos Campos interferiu para que o BAU não fosse fornecido à comissão de entidades e parlamentares que o estão requisitando?
A essas questões, acrescento esta: agora, quem vai cuidar ou, pelo menos, bancar quem cuide do senhor Ivo, que até a desintegração de posse do Pinheirinho era “um touro”, segundo dona Osorina?
Postado no Blog Viomundo em 14/03/2012
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Intolerância verificada na USP diz respeito a todos nós
por Jorge Luiz Souto Maior
No começo deste ano eu estava em Liverpool à procura de um sonho perdido, os Beatles, e me deparei, talvez não por acaso, pois o destino tem razões que a própria razão desconhece, com a dura realidade tratada no Museu Internacional da Escravidão, inaugurado em 2007.
Várias coisas me impressionaram naquele local, sobretudo a menção honrosa feita ao Brasil, como tendo sido o último país das Américas a eliminar a escravidão, embora, até hoje, como bem sabemos, não tenha eliminado o trabalho escravo. Além disso, impressionei-me com um poema refletido no chão, atribuído a um pastor, de nome Martin Niemöller, que foi escrito na Alemanha nos tempos do nazismo, com o seguinte teor:
Quando os nazistas levaram os comunistas,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era comunista.
Quando eles prenderam os sociais-democratas,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era social-democrata.
Quando eles levaram os sindicalistas,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era sindicalista.
Quando levaram os judeus,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era judeu.
quando eles me levaram,
não havia mais quem protestasse
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era comunista.
Quando eles prenderam os sociais-democratas,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era social-democrata.
Quando eles levaram os sindicalistas,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era sindicalista.
Quando levaram os judeus,
eu não protestei,
porque, afinal,
eu não era judeu.
quando eles me levaram,
não havia mais quem protestasse
Quando retornei ao Brasil, estudando um pouco mais o contexto daquele poema, deparei-me com outro, de Bertold Brecht:
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo
As pesquisas me conduziram a mais um poema, este produzido no Brasil, de autoria de Eduardo Alves da Costa, que foi elaborado na época da ditadura militar e de onde se extrai a passagem que se tornou célebre na luta democrática instaurada na época do golpe de 64:
Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
O que essas manifestações têm em comum? Elas se identificam pela poética demonstração de que as supressões da liberdade se “desenvolvem” progressivamente na medida em que encontram espaços para tanto, sendo que estes espaços são criados pela tática do medo.
Tendo por base esse aprendizado histórico, fácil compreender que assistimos na USP, presentemente, uma escalada anti-democrática repressora da liberdade, que avança a partir da estratégia do medo e da desinformação.
Mesmo sem nenhuma pretensão poética, é possível dizer:
Primeiro levaram um sindicalista
E não dissemos nada, pois não somos sindicalizados
Depois levaram, na calada da noite, os aposentados
Não nos importamos, afinal, estamos na ativa
Aí, oficializaram a política da repressão militarizada
E levaram estudantes
Sem entender bem o se passava, não protestamos
Na seqüência, já com armas em punho, levaram mais estudantes
Não reagimos porque não somos mais jovens sonhadores
Então, se conferiram o poder de chamar o golpe de 64 de
Revolução!
E não dissemos nada, pois não somos sindicalizados
Depois levaram, na calada da noite, os aposentados
Não nos importamos, afinal, estamos na ativa
Aí, oficializaram a política da repressão militarizada
E levaram estudantes
Sem entender bem o se passava, não protestamos
Na seqüência, já com armas em punho, levaram mais estudantes
Não reagimos porque não somos mais jovens sonhadores
Então, se conferiram o poder de chamar o golpe de 64 de
Revolução!
Após isso, se sentiram à vontade para assumirem, abertamente, o projeto de privatização do ensino, ameaçando fechar cursos que não se integram às exigências do mercado.
Adotaram, de modo cada vez mais explícito e abrangente, a terceirização, que, como bem sabem, precariza o trabalho e dificulta as resistências por parte dos trabalhadores.
Não se importaram com as reincidentes agressões desferidas por Policiais contra estudantes no seio da Universidade e assumiram postura de que não lhes diz respeito o atentado contra a sede do sindicato dos servidores – o Sintusp (a que ponto chegamos?)
Passaram a levar a ferro e fogo a intolerância contra os contestadores. Fiscalizam, invadem a privacidade, institucionalizam a espionagem.
Instauraram processos administrativos contra os demais diretores do sindicato.
Têm tratado os conflitos, frutos das revoltas de estudantes e servidores contra esse estado de coisas, como meros casos de polícia, pois não se vêem, minimante, constrangidos ao diálogo.
E, claro, não podia faltar, buscaram utilizar os meios de comunicação em massa para destruir moralmente todos que, não podendo ser presos ou descartados, ousam a se posicionar, abertamente, contra a situação posta.
Como se vê, é preciso, urgentemente, revelar que está em curso na Universidade de São Paulo um procedimento típico de regimes ditatoriais, que, inclusive busca justificativas para seus atos na lei, que é vista apenas parcialmente, sem se atentar para o contexto geral do ordenamento jurídico, o qual, vale lembrar, está construído, exatamente, de modo a evitar que em nome da lei se obstruam as liberdades individuais e a eficácia dos direitos sociais, tratados, ambos, na Constituição Federal, como direitos fundamentais.
É necessário ter a exata compreensão do que representa a racionalidade jurídica, fixada na Constituição, posta a partir dos postulados dos Direitos Humanos, integrados ao contexto do pacto de solidariedade, com a exata dimensão de sua representação histórica para o futuro da humanidade, pois sem essa base teórica bastante consolidada e sem as práticas que decorram de sua defesa, corre-se o risco do argumento da legalidade ser retoricamente utilizado a ponto de justificar todo o tipo de barbaridade praticada contra a condição humana, como, aliás, já se verificou em nosso país.
Urge recordar:
“O presidente da República Federativa do Brasil, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e:
Considerando que a Revolução Brasileira de 31 de março de 1964 teve, conforme decorre dos Atos com os quais se institucionalizou, fundamentos e propósitos que visavam a dar ao país um regime que, atendendo as exigências de um sistema jurídico e político, assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo, na luta contra a corrupção, buscando, deste modo, “os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direto e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa Pátria” (Preâmbulo do Ato Institucional no 1 de 9 de abril de 1964);
Considerando que o governo da República, responsável pela execução daqueles objetivos e pela ordem e segurança internas, só não pode permitir que pessoas ou grupos anti-revolucionários contra ela trabalhem, tramem ou ajam, sob pena de estar faltando a compromissos que assumiu com o povo brasileiro, bem como porque o Poder Revolucionário, ao editar o Ato Institucional n. 2, afirmou categoricamente, que “não se disse que a Revolução foi, mas que é e continuará” e, portanto, o processo revolucionário em desenvolvimento não pode ser detido;
Considerando que esse mesmo Poder Revolucionário, exercido pelo presidente da República, ao convocar o Congresso Nacional para discutir, votar e promulgar a nova Constituição, estabeleceu que esta, além de representar “a institucionalização dos ideais e princípios da Revolução“, deveria “assegurar a continuidade da obra revolucionária” (Ato Institucional no 4, de 7 de dezembro de 1966);
Considerando que, assim, se torna imperiosa a adoção de medidas que impeçam sejam frustrados os ideais superiores da Revolução, preservando a ordem, a segurança, a tranqüilidade, o desenvolvimento econômico e cultural e a harmonia política e social do País comprometidos por processos subversivos e de guerra revolucionária;
Considerando que todos esses fatos perturbadores da ordem são contrários aos ideais e à consolidação do Movimento de março de 1964, obrigando os que por ele se responsabilizaram e juraram defendê-lo a adotarem as providências necessárias, que evitem sua destruição.
Resolve editar o seguinte:
Ato Institucional
(….)
Art. 2º O presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, por Ato Complementar, em estado de sítio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo presidente da República.
(….)
Art. 3º O presidente da República, no interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos estados e municípios, sem as limitações previstas na Constituição.
Parágrafo único. Os interventores nos estados e municípios serão nomeados pelo presidente da República e exercerão todas as funções e atribuições que caibam, respectivamente, aos governadores ou prefeitos, e gozarão das prerrogativas, vencimentos e vantagens fixadas em lei.
Art. 4º No interesse de preservar a Revolução, o presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais.
Parágrafo único. Aos membros dos Legislativos federal, estaduais e municipais, que tiverem os seus mandatos cassados não serão dados substitutos, determinando-se o quorum parlamentar em função dos lugares efetivamente preenchidos.
Art. 5º A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa simultaneamente, em:
I. cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função;
II. suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais;
III. proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de segurança:
a) liberdade vigiada;
b) proibição de freqüentar determinados lugares;
c) domicílio determinado.
§ 1º O ato que decretar a suspensão dos direitos políticos poderá fixar restrições ou proibições relativamente ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados.
(….)
Art. 6º Ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo.
§ 1º O presidente da República poderá, mediante decreto, demitir, remover, aposentar ou por em disponibilidade quaisquer titulares das garantias referidas neste artigo, assim como empregados de autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista, e demitir, transferir para a reserva ou reformar militares ou membros das polícias militares, assegurados, quando for o caso, os vencimentos e vantagens proporcionais ao tempo de serviço.
(….)
Art. 10º Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.
Art. 11º Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato Institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.
Art. 12º O presente Ato Institucional entra em vigor nesta data, revogadas as disposições em contrário.
Brasília, 13 de dezembro de 1968.
O documento supra, que se trata do Ato Institucional n. 05, foi assinado por várias pessoas, dentre elas, Luís Antônio da Gama e Silva, um dos mentores do texto do Ato, o qual antes de ser nomeado Ministro da Justiça, em 1967, ocupava o cargo de Reitor da Universidade de São Paulo, advindo da Faculdade de Direito, onde atuava como Professor Catedrático de Direito Internacional Privado, em vaga hoje pertencente ao Sr. João Grandino Rodas.
Por ocasião do afastamento temporário de Gama e Silva, a Reitoria, depois de curto tempo nas mãos de Mário Guimarães Ferri, afastado por questões médicas, acabou sendo assumida pelo professor Hélio Lourenço de Oliveira, o qual, por não apoiar o regime militar, foi aposentado compulsoriamente. O Reitor nomeado, em sua substituição, foi o professor da Faculdade de Direito, Alfredo Buzaid, que, posteriormente, por nomeação de General Emílio Garrastazu Médici, galgou o posto de Ministro da Justiça, tendo sido nomeado, para Reitor, o professor Miguel Reale, também oriundo da Faculdade de Direito.
Não se pode esquecer que no período em questão, com fundamento no Ato Institucional n. 05, vários professores da Universidade de São Paulo de orientação social, denominados, por isso, de “subversivos”, foram aposentados compulsoriamente, dentre eles: Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, Elza Salvatori, Bento Prado Almeida Ferraz Jr., Emília Viotti da Costa, Luiz Hildebrando Pereira da Silva, Isaías Raw, José Arthur Giannotti, Mário Schenberg, Paulo Alpheu Monteiro Duarte e Paul Singer, destacando-se o caso de Caio Prado Jr., que foi incluído na lista de aposentadorias compulsórias mesmo sem ainda ser professor da Universidade, tendo apenas o título de livre-docente, adquirido junto à Faculdade de Direito.
Não se pode conceber como mero descuido, portanto, ter a atual Direção da USP nominado de “Revolução” o golpe de 64, ainda mais se considerarmos que o Reitor, em sua atuação na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, de 1995 a 2002, acompanhado de outros dois membros, dentre eles o General Oswaldo Pereira Gomes, “votou contra a culpabilidade do Estado pela morte e desaparecimento de vários presos políticos”, sendo que a declaração de culpa nestes casos (onze, no total) foi adotada pela maioria dos demais integrantes da Comissão (quatro), conforme denúncia feita por Carlos Lungarzo, membro da Anistia Internacional.
Concretamente, sem uma reação consciente e esclarecida ao que se apresenta na atualidade da Universidade de São Paulo, exigindo-se a reversão do quadro, com a imediata retirada dos processos administrativos contra servidores e alunos, a readmissão do sindicalista Brandão, o cancelamento do convênio feito entre a Administração da Universidade e a Polícia Militar (que instaurou a lógica da repressão militarizada no Campus), a realocação imediata dos desalojados do CRUSP e a convocação de uma estatuinte para a institucionalização de procedimentos verdadeiramente democráticos na Universidade, iniciando-se pela eleição democrática para Reitor e atingindo a construção de um projeto de uma Universidade verdadeiramente pública, com o fim do Vestibular, a eliminação das Fundações de direito privado e demais cursos pagos, o fim da segregação entre servidores e professores, a derrubada de todos os muros que separam a Universidade da sociedade etc., corre-se o risco de ao acordamos pela manhã nos depararmos com um novo Ato Institucional publicado no Diário Oficial.
Importante ressaltar que muitos dos processos administrativos instaurados contra servidores e alunos têm por base um Decreto de 1972, que prevê, dentre outros atos puníveis, a prática de atitudes que atentem contra a moral.
No mínimo, há de se conceber a urgência, na linha das propostas feitas pelo Prof. Fábio Konder Comparato, da formação de um Comissão da Verdade para apurar responsabilidades quanto aos atos praticados durante o regime militar que envolveram a supressão de direitos de servidores, professores e estudantes da Universidade de São Paulo, criando-se, concomitantemente, uma sub-comissão para avaliação do conteúdo persecutório dos recentes processos administrativos instaurados contra estudantes, professores e servidores.
Cumpre registrar, por oportuno, que foi a instauração do medo com relação às reformas de base anunciadas pelo Presidente João Goulart, reforçada pela retórica da “restauração da ordem”, que impulsionou o golpe de 1964, e que assistimos, presentemente, uma escalada de medo semelhante no que se refere à mobilização cada vez mais organizada dos movimentos sociais, que buscam a efetivação de direitos constitucionalmente consagrados.
É por isso, ademais, que a intolerância verificada presentemente na USP a todos diz respeito. Não cabe o argumento de que não se tem nada com isso, por que, afinal, não se está a ela integrado, pois, como traduzem os poemas supra, primeiro fazem aqui, depois, por aí. O caso do Pinheirinho, no qual se utilizou a mesma logística para a retirada dos estudantes que no final do ano passado ocupavam o prédio da Reitoria, reflete exatamente isso, sendo oportuno destacar que se avizinha situação semelhante na comunidade San Remo, situada ao lado da própria Universidade de São Paulo. Aliás, recentemente foi aprovada no Conselho Universitário uma leva de contratação de professores temporários, deixando-se clara a política de diminuição do poder da classe dos professores que vem por aí.
É por tudo isso que a presente reação, com o lançamento do Manifesto pela Democratização da USP, que tem o propósito de impedir que uma tal realidade, cujo processo já se iniciou no seio da Universidade, não volte a atingir a toda a sociedade, representa a mais singela homenagem que se pode prestar aos parentes e amigos dos cidadãos brasileiros que sofreram danos irreparáveis por todos aqueles (e não, genérica e impessoalmente, regime ditatorial) que legitimaram a ditadura e com ela pactuaram, além de constituir a fórmula mínima de respeito à luta que esses cidadãos implementaram por todos nós.
É certo que muitas pessoas não querem perceber a gravidade do momento, seja por se beneficiarem dele, seja por puro comodismo. A questão é: até quando poderão se calar? E mais ainda: se já não será tarde demais quando quiserem se manifestar?
Para esses últimos, que precisam sair do mundo dos sonhos, vale, ainda, o recado há muito deixado por Rosa Luxemburgo:
“Quem não se move não sente as correntes que o prende.”
De todo modo, diante da apresentação deste Manifesto, que traz insitamente uma demonstração de solidariedade para com os oprimidos do sistema, provando-lhes que lutar pela defesa da democracia, pela efetivação de direitos e pela conquista de melhores condições de vida não é crime, e que representa, igualmente, uma homenagem à produção do saber, que é a razão de ser de uma Universidade, e à necessária defesa da condição humana, que é a razão de ser de todos nós, pode-se acreditar que ao menos a comunidade uspiana não vai se calar e vai continuar se movendo…
Muito obrigado!
Jorge Luiz Souto Maior é professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP.
PS do Viomundo: O artigo acima é o texto-base da manifestação do professor Souto Maior durante o lançamento do Manifesto pela Democratização da USP, ocorrido na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP), em 1º de março de 2012.
Postado no Blog Viomundo em 09/03/2012
Texto grifado por mim.
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