Carta ao ex-presidente Lula


:


Dom Orvandil


Caro ex- presidente Lula

Li sobre sugestões de vários setores de que o senhor sente com Fernando Henrique Cardoso para conversar sobre a crise econômica e política que o País vive. Pessoas de boa vontade esperam isso dos dois ex-presidentes.

Conheço a realidade de seu papel na projeção de FHC em 1978. O ex-presidente foi candidato a senador por São Paulo. Parte da campanha dele se direcionou aos metalúrgicos através de panfletos de linguagem empolada e distante da realidade dos trabalhadores. Estes os recebiam e os jogavam no lixo, sem lê-los. A derrota seria estrondosa. 

FHC lhe pediu socorro para que intermediasse com o mundo operário. Atendo-o o senhor o levou aos portões das fábricas do ABCD e defendeu sua candidatura como de interesse da classe e do País.

Tenho para mim que se não fora o seu apoio Fernando Henrique Cardoso não ultrapassaria os limites da USP, onde lecionava e das páginas de alguns livros e artigos que escrevia sobre uma tese que ele mesmo negou, sendo expurgado pela SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) por isso. Não se elegeria senador, não seria constituinte, não seria ministro nem chegaria eleitoralmente à Presidência da República. FHC deve o seu reconhecimento ao senhor.

Na presidência FHC atuou politicamente para quebrar a espinha dorsal do Estado brasileiro, da soberania nacional e da resistência dos movimentos sociais. Sua política internacional foi de dependência ao norte e contra a independência interna.

A aliança que fez para se eleger e se manter como governante foi com o espectro da mais atrasada e perversa política de direita. Juntou-se a grandes proprietários rurais, a banqueiros, à mídia, cujos burras encheu de dinheiro público na busca da blindagem de sua imagem política autoritária e excludente social.

Assim como as alças de sua imagem se sustentavam nos interesses antissociais e antinacionais durante o governo dele, onde aportou a partir da arrancada dada pelo senhor que o levou aos trabalhadores, sem compromisso traiu a origem de sua projeção para, após sair do governo, continuar o percurso da direita sendo sustentação do ódio fascista que toma conta do analfabetismo político e do senso comum.

Fernando Henrique Cardoso não é protagonista do Brasil, dos interesses sociais e, muito menos, das mudanças. Mesmo que vozes respeitadas e queridas sugiram aproximação sua daquele ex-presidente isso não faz sentido.

FHC faz a política do quanto "pior melhor". Pior para o povo; pior para os empregos; pior para os adolescentes, alvos da redução penal; pior para os direitos dos trabalhadores, miras da terceirização neoliberal; pior para a democracia, visada pelo golpismo; pior para a justiça, agora campo de justiceiros, de apurações seletivas, juízos inquisitoriais e sem fundamento na realidade; pior para a segurança com a polícia como meio de prisão e perseguição de desafetos; pior para as empresas nacionais, no governo dele arrasadas pela máfia internacional; pior para o patrimônio público, que ele vendeu tudo quanto pode; pior para os movimentos sociais, que ele confundiu com problemas policiais; pior para a decência política, que ele usou para corromper a cidadania e as instituições públicas.

Fernando Henrique Cardoso degenerou-se ainda mais e isso é muito claro nas suas companhias. Sua frente "do quanto pior melhor" não tem nenhuma relação de amor com o Brasil como Nação e como povo. Suas rixas são pelo poder como aparelho de consolidação da minoria branca da casa grande.

FHC só pensa no seu partido e nos que formam a frente onde cabem os neoliberais privatistas, os antinacionais, os fundamentalistas, os homofóbicos, os fascistas e golpistas raivosos, sempre falando e agindo com muito ódio. 

Aproximar-se dele, portanto, é perder tempo e o rumo do caminho justo e dos verdadeiros protagonistas do bem.

O senhor, ex-presidente Lula, deve dialogar com os verdadeiros protagonistas, a maioria perseguida pela direita e abandonada pela esquerda. A Presidenta Dilma também deve urgentemente retomar o diálogo com os protagonistas verdadeiros.

O Frei Leonardo Boff dá uma pista de onde estão os sujeitos do diálogo quando diz que separa o PT da causa que o criou. A causa é a que libertou milhões de brasileiros e brasileiras da miséria e da pobreza.

O senhor e a Presidenta Dilma devem dialogar com as centrais sindicais, com os sindicatos, com as lideranças dos inúmeros setores do movimento social, que há décadas lutam por cidadania e por uma sociedade nova mediada pela justiça social. O empresariado nacional esmagado pela crise econômica é protagonista fundamental no diálogo, antes que injetem dinheiro no golpe aventureiro. No mesmo caminho de angústias e sonhos se encontram prefeitos, vereadores, governadores e deputados estaduais, que devem ser envolvidos no diálogo.

Há deputados/as e senadores/as que merecem respeito e que devem participar do diálogo, mas o Congresso Nacional não é mais cenário para o diálogo consequente e salvador do Brasil. Os projetos principais e os debates que fazem lá não merecem mais o respeito da sociedade.

O cenário do diálogo deve ser montado pelas ruas, pelos auditórios das instituições acima mencionadas, pelas universidades, pelas igrejas e demais religiões, pelos campos, pelas matas e todos os recantos do País, as escolas, faculdades e universidades, sem distinção.

Há milhares de homens e mulheres de bem que são protagonistas do diálogo. FHC não é de diálogo porque é bajulador dos poderosos.

Qual deve ser o conteúdo do diálogo?

Muito do que precisa ser feito nascerá da escuta aos protagonistas, até agora não considerados pelo segundo governo Dilma. Do que disserem resultarão pressões por mudanças de rumo do governo, que deve se predispor a trocar agendas.

Outro canal que verterá conteúdo essencial já é apontado por grupos importantes no País. Uns o chamam de frente ampla, outros de núcleo de esquerda e outros de irmandade brasileira. O fato é que todos e todas os/as brasileiros/as de boa vontade, não golpistas e rezadores da praga do "quanto pior melhor" ou da balela "eleições limpas" devem ser chamados a formar uma ampla e irrestrita frente de defesa do Brasil com soberania, com democracia mais profunda, com reformas, com empregos, com afirmação das empresas nacionais, com renda, com direitos, distribuição de riquezas e defesa da Petrobras contra a corrupção e sua entrega à máfia internacional e suas pontas de lanças nacionais.

Esses são os protagonistas, esses são os espaços e daí nascerá a proposta mais plena do que todos os brasileiros precisamos para salvar a governabilidade para a maioria, prezado presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O senhor tem toda a autoridade, honradez e carisma capazes de nos unir a todos em tornos desse diálogo.


Postado no Brasil 247 em 27/07/2015


Nenhum comentário:

Postar um comentário