Eduardo Cunha, Presidente da Câmara e Renan Calheiros, Presidente do Senado
Com tais lideranças políticas claramente identificadas com as forças do atraso só podemos lamentar que a sociedade brasileira se encontre refém de suas escaramuças, de suas ambições mesquinhas e inconfessáveis
Daniel Quoist
Era de se esperar. Depois de tantos anos de claros avanços sociais seria apenas questão de tempo que as forças das trevas conseguissem se reaninhar e se posicionassem com a habitual virulência contra o progresso em todas as áreas da atuação humana, dos direitos civis aos direitos sociais, do liberdade de culto ao comportamento sexual.
E dentre os mais vistosos sinais de progresso temos a mais monumental distribuição de renda jamais ocorrida no país desde que este foi descoberto nos idos de abril de 1500. Acesso a universidade deixou de ser apenas para ricos, classe média alta, filhinhos-de-papai e assemelhados e agora inclui ampla diversidade social, racial e étnica. A taxa de desemprego nacional é 1/3 da verificada na Itália e quase metade daquela constatada nos Estados Unidos.
Pela primeira vez – e por vários anos consecutivos - temos estado entre as 5ª e 6ª posições dentre as economias mais desenvolvidas e pujantes do mundo.
No aspecto comunicação digital, o Brasil ocupa a 3ª posição de país mais conectado, atrás apenas dos Estados Unidos e da Suécia.
Infelizmente dentre os sinais de retrocesso mais vistosos e obscurantistas podemos discernir o seguinte:
Mídia conservadora dando lustre a seu espírito golpista: Merece repercussão tudo o que possa macular a legitimidade das eleições presidenciais de 2014. E isso significa dar amparo às mais disparatadas e insanas teses golpistas: espaço nobre e ilimitado a quem levante quaisquer suspeitas sobre a integridade da presidente Dilma Rousseff.
Nessa toada todo muchocho do político exemplo de mau perdedor Aécio Neves é levado à escalada do Jornal Nacional; atuações teatrais, histriônicas e mequetrefes de políticos tucanos como Carlos Sampaio e Antonio Imbassahy roubam sempre a cena quando defendem - repetidas vezes - para a necessidade de impeachment para a presidente da República; políticos notórios como Ronaldo Caiado e José Agripino Maia, abrigados no Democratas, aquele partido de direita nascido de costela da velha Arena, depois PDS, depois PFL, sempre são convocados pela emissora dos Irmãos Marinho para comentar a cena política e, como só se poderia esperar, aproveitam para defender a invalidação dos 54 milhões de votos que em 2014 deram consagradora vitória à presidente da República.
As revistas Veja e Época se vêm à vontade para praticar o tipo de jornalismo mais asqueroso e vil – transformaram-se em reles panfletos dos políticos mais reacionários e medíocres e a cada semana se alternam em capas e matérias pseudojornalísticas que não resistem a mais de 48 horas à luz do sol.
O alvo é o mesmo de 1989, 1994, 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014: Luiz Inácio Lula da Silva e quem estiver em seu entorno, seja o partido que fundou em fins dos anos 1970, seja a presidente da República eleita e reeleita democraticamente Dilma Rousseff.
A seletividade com que o consórcio Judiciário/Polícia Federal se debruça em investigações de corrupção há muito se transformou em motivo de risíveis chacotas: no dia em que políticos do PSDB, esse partido que amarga quatro significativas derrotas em consecutivos pleitos presidenciais, deixem de escapar da prescrição de crimes nos quais são investigados, venham a ser julgados e condenados será sinal que, finalmente, o inferno congelou.
Eduardo Cunha e Renan Calheiros, presidentes da Câmara e do Senado, ambos formalmente investigados pelas maracutaias descobertas na Operação Lava Jato que trata das relações criminosas a envolver a Petrobras e a totalidade das mais importantes empresas de construção civil do Brasil.
Tanto um quanto outro revelam-se mestres da desfaçatez: posam de paladinos da ética, vestais do mais puro apreço ao republicanismo e exigem desde a diminuição do número de ministérios no Poder Executivo até a aprovação de pautas-bombas que buscam colocar o Brasil de volta ao atoleiro da inflação alta e do desemprego em níveis asiáticos e africanos.
E tudo isso a troco de quê? Ganhar a simpatia e o beneplácito de nossa imprensa venal – Globo, Abril, Folha, Estadão e, ao mesmo tempo, emplacar apaniguados nos altos escalões do Poder Executivo.
Eduardo Cunha tem sido maquiavélico com o governo Dilma: autoriza CPIs a toque de caixa, aparelha a Câmara que preside com aliados obscurantistas em questões de comportamento, defende que se rasgue a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o principal escudo e legado do presidente Getúlio Vargas para proteger a massa de trabalhadores anônimos responsável pelo formidável país que temos hoje ao se colocar em lanças pelo êxito do vil projeto de terceirização entronizado sob o nº 4330.
Renan Calheiros, esquecido que há bem pouco tempo era açulado nas ruas brasileiras com o brado de "Fora, Renan!", tripudia em cima da presidente da República, chama-a grosseiramente de ridícula, idiota e mais um leve empurrãozinho não hesitará em destratá-á-la como rematada imbecil.
Eduardo Cunha faz de tudo para desacreditar autoridade honrada, lúcida e intimorata como é o procurador-geral da República Rodrigo Janot e seu objetivo claro é tão-somente livrar-se da condição de investigado no tapetão, sem que sejam feitas quaisquer diligências para comprovar que achacou a Petrobras.
Renan Calheiros, ingrato como sempre, esquece que deve mais uma vez sua eleição para presidir o Senado ao partido que está no poder – o Partido dos Trabalhadores e esquece-se dos meandros que culminaram com sua renúncia recente à presidência do Senado, as notas frias apresentadas para a compra de bois fictícios e outras indeléveis malandragens e claros sinais de maracutaias.
Eduardo Cunha busca intimidar Rodrigo Janot através de mudanças na lei que trata da condução ao cargo de procurador-geral da República e tenta desqualificá-lo sempre que pode em desastradas declarações amplamente divulgadas pela tradicional mídia golpista que temos no Brasil. Neste caso o que sobra em moral e ética no indicado que será sabatinado no Senado parece faltar vergonhosamente da parte de seus sabatinadores.
Renan Calheiros parece dançar em corda bamba: ao tempo em que trama para barrar a indicação do brilhante jurista Luiz Edson Fachin para integrar o STF, faz vista grossa para o fato que o paranaense foi "apadrinhado" por ninguém menos que o presidente do Supremo Ricardo Lewandowski, o mesmo juiz que será relator de seu processo naquela alta Corte de Justiça.
A situação política nacional nos faz pensar em uma espécie de freio de arrumação ideológico, onde cada ator se revela em sua inteireza, esquerda e direita, progressista e conservador, ético e meliante.
Não há meio termo. Com tais lideranças políticas claramente identificadas com as forças do atraso só podemos lamentar que a sociedade brasileira se encontre refém de suas escaramuças, de suas ambições mesquinhas e inconfessáveis. E os próximos meses prometem novas cenas de obscurantismo explícito.
Postado no Contraponto em 06/05/2015
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