Do mal do " inocente útil "



Eduardo Ramos

O inocente útil, na grande maioria das vezes, é só isso mesmo... inocente, e útil a uma causa, que na verdade não sabe qual é (a verdadeira, a que está oculta, ele desconhece...), mas como lhe é apresentada com toda uma roupagem costurada com os valores e princípios que lhes são mais caros, ele a incorpora, integralmente, como uma esponja viva, não só na mente, acreditando nos símbolos e signos daquela ideologia, mas emocionalmente, passando então a "se sentir parte" daquele grupo, ou rebanho, as pessoas que juntamente com ela, passam a sentir intensamente como verdade, como "O BEM", todos os mantras que lhe são passados pelos verdadeiros donos do poder, os que movimentam os cordéis da manipulação social, e guiam essas dóceis pessoas, para cada movimento social que lhes interessa, no grande jogo de xadrez que é o jogo pelo poder.

Não são "pessoas más", ou desprovidas de inteligência, ou caráter, ou mesmo vontade...

O inocente útil, como todos nós, anseia por verdades, alvos de vida, coisas para acreditar e seguir, e se um determinado grupo ou ideologia lhe é apresentado, sistematicamente, como uma espécie de "satanás", um signo do mal absoluto, algo ou alguém capaz de destruir sua vida, seus valores, sua liberdade, temos a junção perfeita para uma catarse pessoal e social, a formação de um rebanho: o medo e as crenças das pessoas nos seus valores ameaçados.

É quase impossível, aos que não estão habituados a um estudo crítico da realidade, profundo, racional, baseado na História, resistir a essa pressão, quando entre os donos dos cordéis manipulatórios, estão toda a grande mídia de um país, e representantes políticos que pertencem ao grupo social que, no inconsciente coletivo, parece ser o grupo do bem.

Aécio, Serra, Fernando Henrique Cardoso, Alckimin, pertencem a esse grupo. No inconsciente coletivo da sociedade brasileira, homens brancos, bem sucedidos, com "famílias bonitas", discursos moralistas, negação de qualquer envolvimento em corrupção, e a defesa "dos valores morais da família e da liberdade", soam aos ouvidos da conservadora sociedade brasileira, como um "canto de sereia", tão fortemente, tanto quanto soa esquisito, nojento mesmo, o discurso, a aparência, o passado, a origem, de um ex-operário nordestino, que fala errado, e uma "ex-guerrilheira, ladra de bancos".

Temos aí, somados aos medos ("comunistas, vão tomar nossas casas"), a repulsa que sentem "dessa gente ordinária, sem tradição", os ruídos brutais emitidos pela grande mídia, que taxa os petistas de ladrões, incompetentes, pessoas malignas, sujas, dia e noite, dia e noite, dia e noite, e, sim, temos tudo criado, minuciosamente, para a construção de um ambiente pesado, de HISTERIA COLETIVA, e essa "verdade" ("esses canalhas são o MAL") passa a ser uma "verdade pessoal-social absoluta" para a parcela da sociedade que assume na alma, essas "verdades".

O perigo disso? Manadas são incontroláveis! No meio desses rebanhos sociais, repletos de gente do bem, pessoas boas, todos os conhecemos entre nossos amigos e parentes, existem os que se permitem facilmente, muitas vezes sem perceber, atingir a paroxismos de sentimentos, super intensos, quando então explodem exacerbados, o ódio, a agressividade, o nojo, o medo.

Alguém conhece mistura mais explosiva do que essa?

Por isso sinto e penso desespero, nos últimos anos, há todo um movimento social perverso, doentio, cruel, sujo, no Brasil, de manipulação dos inocentes úteis, tudo travestido de dignidade, travestido de justiça, travestido de "amor à liberdade...", um fundamentalismo à la talibãs, um fascismo que o inocente útil nem percebe, perdido que está, "em seus bons sentimentos", perdido que está, na crença absoluta de estar ao lado do bem".

Quando uma parcela considerável da sociedade atinge esse estado deplorável, pouco há que se fazer, até porque os antídotos existentes, só agem no longo prazo, décadas, às vezes, EDUCAÇÃO, e a construção do hábito do pensamento crítico e independente.

Sem falar na renovação dos valores, de uma sociedade onde a classe alta e média, está repleta de gente amesquinhada, no sentido de, literalmente, não se sentirem bem com a subida de nível social de milhões de pobres, porque isso implica, necessariamente, em ver nos seus shoppings, aeroportos, excluídos, que "não eram para estar aqui comigo..." - como o preconceito que têm, o nojo, de "gente como Lula e Dilma", a coisa do "quem eles pensam que são, para estarem no poder...?"

Portanto, isso não vai mudar, na verdade, esperem pioras, em tudo, literalmente. Haverá aumento no tamanho do rebanho, haverá exacerbamentos, mais agressividade, mais ódio ao PT, mais tentativas de golpe, mais intolerância.

Tenhamos em conta, que o inocente útil não é o inimigo, no máximo, adversários no sentido político, de pensarem diferente, portanto, a serem confrontados, civilizadamente, e apenas no campo das ideias.

O verdadeiro inimigo, é o de sempre: os detentores do grande capital, os fascistas, os que não admitem representantes do povo no poder, os que vivem da corrupção, da especulação financeira, e estão se lixando para o povo, para emprego, saúde, educação, para essa gente, os pobres nem são algo bom ou ruim, não são nada, absolutamente nada, são invisíveis.

Os donos do poder só querem continuar enriquecendo, e mantendo o poder, e apenas isso.

O mal do inocente útil, é só esse mesmo, engordar um rebanho inconsciente de si mesmo, e ser massa de manobra de quem deve até rir muito, da facilidade com que o manipula.

Penso que Aécio, cinicamente, deve se perguntar, quando se olha no espelho: "Que graça! Será que esse povo todo que me adora, que me aplaude, acredita mesmo em meu discurso tão cínico?" - e deve rir muito, perplexo, ao descobrir que sim, acreditam!

Que cada brasileiro consciente, seja de direita ou esquerda, que todo aquele que ama e busca valores concretos, como democracia, justiça, verdade, lute pelo que pode libertar a sociedade dessa tristeza, desse mal, dessa pobreza que representa a existência de tantos inocente úteis: EDUCAÇÃO, INFORMAÇÃO PLURAL, PENSAMENTO INDEPENDENTE E CRÍTICO!

Quando formos fortes nisso, o inocente útil será apenas uma coisa folclórica, em extinção.

Hoje, infelizmente, esses queridos, são uma ameaça (inconsciente, o que é mais triste) à própria democracia, que paradoxalmente, ao seu modo, eles acreditam e amam.


Postado no site Luis Nassif Online em 15/03/2015



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