Mogli Veiga
Nasci em uma família católica. Quando sai de dentro do útero de minha mãe, já fui informado que entrava na vida devendo, isto é, o meu lugar no paraíso dependia da remissão do pecado original, que eu nem sabia de que se tratava muito menos que havia cometido.
No início, comecei a achar que havia vidas passadas, pois já chegar carimbado por um pecado, só se eu o tivesse cometido antes de ser concebido. Passei muito tempo sem perdoar meu pai por isso.
Quando cresci, descobri que havia outros pecados, chamados pecados capitais. Eles são em número de sete. De todos eles, a soberba e a vaidade não me atingiam. Só um pouquinho. A avareza era impossível de praticá-lo. Minha família não tinha muitas posses. Quando virei estudante, fui morar em uma república, dava aulas particulares, arranjava namoradas com alguma posse para, de vez em quando, poder comer algo mais substancial. Mantinha a tradição de que todo estudante foi, é ou será um “duro” e, estudando engenharia, não há a mínima chance de acumular alguma riqueza.
À medida que o tempo passava, concluí que era impossível viver sem cair na tentação de cometer vários pecados, todos juntos e de forma contínua.
A preguiça já veio junto com o pecado original, porque tenho certeza que minha missão no mundo era ser viajante, só que ao desembarcar, extraviaram meu salvo-conduto e a senha do cartão de crédito. Estava condenado a trabalhar. Tentaram me convencer com o clichê que “o trabalho dignifica”. Até o Gonzaguinha me sacaneou ao compor uma música em que tem o verso: “trabalho é um honra i”.
Quando comecei a entender a história da humanidade, fui acometido de grande ira ao saber o que faziam e fazem com a África, com o Oriente Médio, com a América Latina e com a Ásia.
Nesta etapa eu já havia abandonado minha origem “cristã” e me entregado aos prazeres dos pecados, principalmente o da luxúria e da gula.
Como não pensar em luxúria convivendo com as coisas mais preciosas que existem? Loiras, morenas, ruivas, mulatas, negras, mulheres e mulheres. Como não cair em tentação ao ver uma foto da cantora punk russa presa por desafiar o Vladimir Putin. A Heidi Klum e todas aquelas que o Milton Ribeiro publica no seu blog: “Porque hoje é sábado”? Para mim é sábado, domingo, segunda…
E o pecado de gula? Está intimamente ligado à luxúria. Alguém de sã consciência consegue não associar uma luxúria antes e uma gula depois? Também pode ser na ordem inversa. A ordem dos fatores não altera o produto, ou o ar puro, ou o dito duro. Isso é muito melhor que “um uísque antes e um cigarro depois”.
A gula é o pecado de comer demais, além da conta. Mas convenhamos. Imagine você, leitor, ter diante de si um prato de gigot d´agneau a la sauce berbere avec riz au abricot et datte (pernil de cordeiro ao molho berbere com arroz de damasco e tâmaras) acompanhado por umsyrah ou um carignan. À sua frente uma “Gabriela”. Não há quem resista e, nessa situação só cabe uma pergunta: gula e luxúria ou o inverso?
Mas, tanto a gula quanto a luxúria, representam a barbárie. O instinto mais animal, o ser biológico, como dizia Desmond Morris. Esses são os verdadeiros pecados originais.
Não precisa de sofisticação nem nomes franceses, é só saber usar bem nossos caninos. Entretanto, neste caso, se recomenda atos de luxúria antes e a gula depois. Em seguida, repete-se tudo até o vivente aguentar. Não há contra-indicação, só cansaço.
Mogli Veiga é engenheiro, aventureiro e pecador.
Postado no blog Sul 21 em 12/09/2012
Imagens inseridas por mim
Nota:
A crônica acima trata do assunto de maneira bem humorada, mas nunca devemos esquecer que para tudo na vida o melhor é sempre o equilíbrio, pois se há abundância de um lado, do outro há a FOME, assim como o sexo pelo sexo traz vazio espiritual, uma vez que não acarreta em laços afetivos e o mundo está necessitando muito de AFETIVIDADE.
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